Presidencialismo só é estável quando eleitor não tem informação
Matias Spektor - FSP
Reza a lenda que o presidencialismo de coalizão é exemplo de
estabilidade. Capaz de atravessar o fim da hiperinflação, dois
impeachments e troca de governos, o modelo teria condições de resistir a
grandes tempestades. Nessa visão, a crise atual combina recessão
econômica, Lava Jato, incompetência de Dilma e denúncias contra Temer,
mas passará.
A realidade, porém, é outra.
Nosso modelo de presidencialismo somente é sólido quando há em vigor uma
condição muito peculiar: falta de informação pública a respeito de como
Brasília realmente funciona.
A diferença, agora, é que a Lava Jato
expôs como o Executivo forma sua maioria parlamentar. A operação
revelou que o sistema é tão difícil de operar que não basta à
Presidência da República contar com todas as prerrogativas excepcionais
da Constituição de 1988.
Mesmo gozando do mais possante arsenal de medidas provisórias, cargos
públicos, ameaças de veto e balcão de emendas, um presidente brasileiro
só consegue governar distribuindo oportunidades de negócios aos partidos
que o apoiam e cultivando uma elite empresarial que vive de trocar
privilégios por financiamento de campanha e pagamento de propinas à base
aliada. Para governar, nossos presidentes são obrigados a transformar o
Planalto no QG da falcatrua, recebendo empresários sedentos por
facilidades e distribuindo "boquinhas" aos partidos.
Nesse esquema sujo, os presidentes também precisam assegurar a anuência
das instituições de controle. Fazem isso nomeando aliados para o STF, o
TSE, o TCU, as unidades de fiscalização de ministérios como Agricultura e
Saúde e tantas outras agências regulatórias. Responsáveis por limitar o
poder do Executivo, tais instituições controlam pouco e controlam mal,
caindo também na lama. A dinâmica repete-se em nível estadual, como se
vê em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
A instabilidade não é inerente ao presidencialismo de coalizão, mas é a
tônica quando a opinião pública e o eleitorado possuem amplo acesso à
informação. Trata-se de um modelo que, para funcionar bem, demanda um
véu de ignorância.
O problema é ainda mais grave quando o governo de plantão não conta com
um boom de commodities para anestesiar os cidadãos. Por isso, nas
circunstâncias atuais, não há frente de concertação nacional capaz de
garantir governança estável. Bastou retirar o tapume que protegia o
presidencialismo de coalizão do escrutínio público para sua fragilidade
ficar exposta, sem importar quem ocupa a cadeira —Temer, Alckmin,
Bolsonaro, Ciro, Doria, Marina ou Lula. O resultado é instabilidade e
incerteza.
Trocar esse sistema por outro será difícil porque não há alternativa óbvia, mas chegou a hora de começarmos a explorar.
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