Rodrigo Constantino - VEJA
Uma reportagem
do Valor mostrou que o Brasil já “perdeu” mais de R$ 106 bilhões com
sonegação de impostos este ano (quem perdeu, na verdade, foi o governo, o
que não é a mesma coisa). Claro que calcular aquilo que não é oficial
não é tarefa simples, e o número pode ser bastante impreciso. Mas mesmo
assim chama a atenção a magnitude. Diz o jornal:
Em quase 100
dias o Brasil já perdeu mais de R$ 106 bilhões com a sonegação de
impostos, segundo dados da campanha “Quanto custa o Brasil pra você?”,
realizada pelo Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional
(Sinprofaz). Em 2013, o chamado Sonegômetro, um placar que
calcula a sonegação de tributos no país, fechou o ano marcando uma perda
de R$ 415 bilhões para os cofres públicos.
Amanhã, o
Sonegômetro será instalado na Esplanada dos Ministérios, em Brasília,
para mostrar quanto o Brasil deixou de arrecadar desde o dia 1º de
janeiro. Segundo o presidente do Sinprofaz, Heráclio Camargo, as pessoas
precisam entender que todo mundo perde com a sonegação fiscal.
“Estamos
sempre falando sobre a alta carga tributária, mas também precisamos
discutir o efetivo combate à sonegação e um sistema de cobrança mais
justo para com os que ganham menos”, afirmou.
O que Heráclito Camargo talvez não tenha
se dado conta ainda é que justamente a elevada carga tributária estimula
a sonegação. Claro, a impunidade e a certeza de que os impostos acabam
desviados, em grande parte, para corrupção ou fins eleitoreiros e
demagógicos também contribui, e muito.
Mas quanto maior for a mordida do Leão,
maior será a tentação de sonegar, pois ninguém é abnegado a ponto de
labutar metade do ano só para colaborar com o “bem comum” (ainda que
fosse o caso). Elementar, meu caro Watson.
Não obstante, o presidente da Sinprofaz
ignora isso e parece acreditar que quanto mais recursos o governo
arrecadar, melhor para o país. Segundo ele, o problema do governo deve
ser falta de verba, e não o péssimo uso dela:
De acordo
com estimativas do Sinprofaz, a carga tributária no país encerrou 2013
representando 36,85% do PIB. Em 2012, esse valor correspondia a 35,85%
do PIB.
“O
Sonegômetro foi a forma que encontramos para mobilizar e esclarecer a
sociedade sobre os impactos da sonegação fiscal no Brasil. O dinheiro
que poderia ser investido na saúde ou na educação está indo pelo “ralo”
porque a administração pública faz vista grossa para os grandes
devedores e, com isso, sacrifica cada vez mais os pobres e a classe
média”, ressaltou Camargo.
Ou seja, nosso estado já é um Leviatã
faminto que abocanha 37% do PIB em impostos, e mesmo assim oferece
péssimos serviços. Mas Heráclito acha que esse dinheiro, que hoje vai
para o “ralo” (mentira, é usado pela iniciativa privada), seria
investido na saúde ou na educação.
Pergunta: por que os atuais 37% do PIB,
uma das maiores cargas tributárias do mundo, não bastam para uma boa
saúde ou educação? O que acontece? Falta verba quando nosso governo cede
mais de um bilhão em subsídios para Cuba fazer um porto? Ou quando
torra bilhões em arenas esportivas? Ou quando gasta bilhões com
ministérios inúteis? Ou joga fora outros bilhões com ONGs engajadas?
A reportagem passa a impressão de que a
sonegação é coisa de gente muito rica, mas isso não é verdade. Vários
profissionais liberais, como médicos, deixam de emitir recibo para não
recolher tanto imposto. Nada disso é louvável pela ótica liberal,
defensora do império das leis. Mas se não levarmos em conta as raízes do
problema, atacaremos apenas sintomas, ou agravaremos o quadro.
Somente o governo federal arrecadou em
2013 mais de R$ 1 trilhão! É pouco? Não basta? Tem sido bem utilizado?
Seria melhor para o país arrecadar ainda mais? O fato é que o custo da
legalidade em nosso país é muitas vezes proibitivo, como todos aqueles
que contratam mão de obra informal sabem (e são muitos). Se todas as
leis absurdas fossem aplicadas amanhã no país, o Brasil quebrava! Vamos
enfrentar a origem do problema?
Vejam só: se esses R$ 415 bilhões
supostamente sonegados fossem inteiramente arrecadados, estaríamos
falando de uma carga tributária não mais de 37% do PIB, mas de 46% do
PIB! Isso tudo, nunca é demais lembrar, a fundo praticamente perdido,
pois a classe média precisa pagar segurança privada nos condomínios,
escola particular para os filhos, plano de saúde da empresa, etc.
Será que a grande solução para o Brasil é
mesmo asfixiar ainda mais o cidadão e lhe tomar metade de tudo que ele
ganha, para manter um estado inchado, corrupto e incompetente? Não
podemos fugir do debate. É evidente que ninguém deveria celebrar tanta
sonegação, apesar de reconhecer que há uma diferença moral entre
preservar das garras do estado guloso aquilo que é seu de forma
legítima, e desviar os recursos do próprio estado, arrecadado de
terceiros, para si próprio.
Mas tampouco podemos ser levianos,
oportunistas e insensíveis a ponto de pregar que o problema está na
sonegação em si, e não na elevada carga tributária já arrecadada e na
terrível contrapartida de tantos impostos. Nesse contexto, dá quase para
compreender aqueles que defendem a desobediência civil por meio da
sonegação de impostos. Só que eu ainda prefiro usar isso para expor o
absurdo de nosso modelo tributário e lutar, dentro das leis, por
mudanças e reformas liberais. Chega de tanto imposto!
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