sábado, 31 de maio de 2014

O IMPÉRIO E OS NOVOS BÁRBAROS? III

Agência de fronteira europeia relata aumento da migração ilegal
Alan Cowell e Dan Bilefsky - NYT
Enquanto seus líderes lidam com as exigência populistas para coibir a migração, a Europa enfrenta um aumento de pessoas pedindo asilo, colocando suas vidas em risco para escapar da guerra e pobreza na Síria, Afeganistão e outros lugares, segundo novos levantamentos nesta sexta-feira (30).
A previsão provavelmente acirrará as disputas entre os políticos estabelecidos e figuras da extrema direita, que realizaram campanhas para as eleições deste mês com plataformas anti-imigrantes, obtendo avanços notáveis e sacudindo as elites políticas na França e Reino Unido, em particular.
Os ganhos dos populistas foram obtidos em parte com promessas de restringir a imigração por todas as fronteiras internas dos 28 países da União Europeia, muitas da quais, segundo as regras do bloco, podem ser cruzadas à vontade pelos cidadãos dos países membros.
Mas nos números divulgados na sexta-feira, a Frontex, a agência de fronteiras da união, também disse que o número conhecido de migrantes de fora da Europa que entraram na UE ilegalmente neste ano já está próximo do total de todo o ano de 2013, e provavelmente aumentará, à medida que o clima de verão traz mares mais calmos, o que beneficia os migrantes que cruzam o Mediterrâneo, vindos do norte da África.
Para a maioria dos migrantes, que lotam barcos frágeis, a jornada é uma aposta.
"Eles sabem que podem se afogar", disse Carlotta Sami, porta-voz da agência de refugiados da ONU em Genebra. "Eles sabem que podem morrer." Apenas na semana passada, as autoridades italianas disseram ter resgatado quase 1.000 desses migrantes em águas internacionais além da costa da Sicília e da ilha de Lampedusa.
Mas mesmo assim os números continuam crescendo.
Em seu relatório anual divulgado neste mês, a Frontex disse que em todo o ano de 2013, 40 mil requerentes de asilo chegaram, principalmente à Itália, provenientes do Norte da África. Mas Ewa Moncure, uma porta-voz da agência, disse em uma entrevista por telefone que 37 mil migrantes já tinham sido detectados até o momento fazendo a travessia neste ano, segundo números não oficiais, enquanto relatos na imprensa italiana sugerem que o número no mesmo período foi mais próximo de 40 mil.
"Olhando à frente, tudo aponta para a probabilidade elevada de um grande número de travessias ilegais de fronteira para a UE", disse o relatório da Frontex.
Em outubro do ano passado, os líderes da UE concordaram em rever os procedimentos do bloco para lidar com o afluxo de refugiados. Mas desde o colapso da autoridade na Líbia, com a Primavera Árabe em 2011, grande parte do ônus de lidar com os refugiados recaiu sobre a Itália.
Após dois grandes desastres marítimos terem tirado centenas de vidas no ano passado, a Itália aumentou o patrulhamento naval e aéreo enquanto luta para lidar com o afluxo. As autoridades italianas também disseram que estão tentando combater as redes ilegais que contrabandeiam migrantes desesperados para a Europa.
A Grécia tentou levantar uma cerca ao longo de sua fronteira com a Turquia, um ponto importante de travessia para migrantes provenientes da Ásia e África. Mas proteger as vastas fronteiras por terra e mar da Europa –uma tarefa bem maior do que a enfrentada pelos Estados Unidos ao longo de sua fronteira com o México– provou ser praticamente impossível para a União Europeia, que se orgulha da movimentação relativamente livre de pessoas dentro de suas fronteiras.
Em 2013, 107 mil pessoas foram detectadas tentando entrar ilegalmente na União Europeia, um aumento em comparação a 75 mil em 2012, disse o relatório. Sírios, afegãos e eritreus foram as nacionalidades mais detectadas. Não está claro quantos imigrantes escaparam de detecção.
Além da rota central mediterrânea, também ocorreu um aumento acentuado na migração ilegal pela fronteira da Hungria, país membro da União Europeia, e Sérvia, que não é.
Os números coincidem com uma série de episódios que ilustram tanto a determinação dos requerentes de asilo para chegar à Europa quanto a relutância de alguns na Europa em aceitá-los.
Nesta semana, tropas de choque da polícia francesa dispersaram centenas de supostos migrantes em um acampamento improvisado em Calais, no mesmo dia em que mais de 1.000 pessoas tentaram forçar passagem por sobre as barreiras de arame farpado para chegar a Melilla, um enclave espanhol no Norte da África.
O debate da imigração teve um grande papel nas eleições para o Parlamento Europeu nesta semana, que registram ganhos dos partidos políticos de extrema direita em vários países, incluindo Reino Unido, Dinamarca, França e Hungria.
Na França, a Frente Nacional de extrema direita, liderada por Marine Le Pen, prometeu reduzir o número anual de imigrantes de 200 mil para 10 mil, dizendo que a imigração descontrolada era "fonte de tensões em uma república que não pode mais assimilar novos cidadãos".
A apreensão pública com a imigração ilegal na França também está centrada no status de cerca de 20 mil não cidadãos ciganos da Romênia e Bulgária.
No Reino Unido, Nigel Farage, líder do Partido da Independência do Reino Unido de direita, conjurou imagens de gangues do crime organizado romeno se infiltrando em seu país. "Eu não tenho problemas com romenos", ele disse à "CNBC" depois da eleição. "Eu tenho um enorme problema com a Romênia."
O crescimento do sentimento anti-imigrante é amplamente visto como datando de 2004, quando os países da UE decidiram abrir suas portas para novos membros da Europa Central e Oriental. Alguns países, como o Reino Unido, subestimaram significativamente o afluxo que se seguiria.
Na época, o governo previu que 5 mil a 13 mil migrantes chegariam anualmente até 2010. O censo de 2011 mostrou 521 mil pessoas nascidas na Polônia listadas como moradoras do Reino Unido, apesar desse número ter caído de lá para cá. Mas os recém-chegados criaram uma percepção, alimentada pela mídia eurocética e pela extrema direita, de que a migração está saindo de controle.
Os temores de um grande afluxo de imigrantes no Reino Unido foram novamente alimentados em janeiro, depois que as restrições de trabalho para búlgaros e romenos em nove países da UE, incluindo Reino Unido, França e Alemanha, foram suspensas, provocando preocupações de que os migrantes dos países mais pobres do bloco invadiriam. O afluxo não ocorreu.
John Springford, um especialista em imigração do Centro para Reforma Europeia, com sede em Londres, disse que apesar da imigração ter sido inicialmente bem acolhida pelos autores de políticas europeus como forma de compensar o envelhecimento da população europeia, a recessão no Reino Unido e em outros lugares após a crise financeira de 2008 espalhou consternação de que os imigrantes estavam tomando empregos escassos.
"No Reino Unido, a recessão deu um toque picante adicional à reação anti-imigração", ele disse. "Há o temor de que os romenos e búlgaros tomarão empregos, apesar de haver pouca evidência disso."
Tradutor: George El Khouri Andolfato

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