Martin Fletcher - Prospect
Fabrizio Bensch/Reuters
Desde
que Kikwete assumiu o cargo em 2005, a população de elefantes do país,
antes a segunda maior da África, despencou de mais de 140 mil para menos
de 50 milJakayla Kikwete está chegando ao fim de seus dois mandatos e de dez anos como presidente da Tanzânia. Antes das eleições deste outono, seus assessores estão brandindo estatísticas que mostram o sucesso que ele foi —-2,7 milhões de empregos criados, 5 mil escolas, lares com energia elétrica aumentaram de 10% para 36%, os casos de malária caíram 60%. O único número que eles dificilmente mencionam, contudo, é o número chocante e vergonhoso de elefantes assassinados durante seu governo —-quase 100 mil.
Selous, um Patrimônio Mundial da UNESCO e uma das maiores reservas de caça do mundo, vangloriava-se de ter 70 mil elefantes dentro de seu ecossistema em 2006. Hoje, restam apenas 13 mil. Depois de saquear Selous, os caçadores atacaram a segunda maior concentração de elefantes da Tanzânia, no Parque Nacional Ruaha e Reserva de Caça Rungwa. Os números lá despencaram de 31,6 mil em 2009 para cerca de 8,2 mil.
Kikwete não tem desculpas. A Tanzânia não foi prejudicada pela guerra. Não está inundada de armas. Não faltam recursos — é um dos países preferidos pelos doadores ocidentais e recebeu quase US$ 2,6 bilhões em 2012. É um país estável, que tem sido governado pelo mesmo partido durante metade do século passado e possui serviços de segurança e inteligência fortes. O problema da Tanzânia é uma corrupção profunda, universal e endêmica que não a torna uma vítima da ganância da China pelo marfim, mas sim uma cúmplice anuente e ativa.
Em todos os níveis —-ministros, políticos, juízes, funcionários públicos, soldados, policiais, funcionários da alfândega, autoridades portuárias, guarda-parques-— existem aqueles que alimentam o fluxo incessante de presas arrancadas das reservas da Tanzânia para os portos de Dar es Salaam e Zanzibar, onde são contrabandeadas para fora do país em contêineres de madeira ou soja. "O conluio entre funcionários corruptos e empresas criminosas explica a escala sem precedentes da caça e do contrabando de marfim no país. (…) A corrupção é o fator-chave que permite todas as etapas da cadeia de tráfico de marfim", informou a Agência de Investigação Ambiental da Inglaterra no ano passado.
Ou como Khamis Kagasheki, ex-ministro de recursos naturais e turismo, disse ao Parlamento da Tanzânia: "Este negócio envolve pessoas ricas e políticos que formaram uma rede muito sofisticada". Kagasheki foi demitido logo depois.
Diante da crescente preocupação internacional, o governo de Kikwete parece ter respondido com uma estratégia dupla.
Em primeiro lugar, o seu governo vem tentando minimizar a escala do massacre. Durante seis meses, ele impediu a divulgação de uma pesquisa financiada por Paul Allen, fundador da Microsoft, que mostrou que a população de elefantes de Ruaha tinha caído 60% em apenas um ano, em seguida, contestou os resultados quando eles vazaram. O governo proibiu um respeitado jornal do Leste Africano, publicado no vizinho Quênia, depois que ele divulgou um resumo dessa pesquisa —-e uma charge mostrando ninfas chamadas "Corrupção", "Incompetência" e "Nepotismo" alimentando um Kikwete ocioso. Ele agora está tomando duas medidas draconianas de censura —-a Lei de Crimes Cibernéticos que torna ilegal o compartilhamento de informações "falsas, enganosas, tendenciosas ou imprecisas" na internet; e uma Lei de Estatística que torna ilegal divulgar estatísticas não autorizadas pelo governo. "Eles estão tentando encontrar cada vez mais formas de silenciar as pessoas", disse uma fonte.
Em segundo lugar, o governo de Kikwete respondeu com palavras em vez de ações — também para manter o fluxo de dólares dos doadores. Em uma reunião de cúpula em Londres, com os príncipes Charles e William no ano passado, Kikwete fez a promessa atraente de colocar o enorme estoque de marfim da Tanzânia, de 137 toneladas, "fora de uso econômico" —-uma reversão dramática em relação às iniciativas anteriores de seu governo para tentar vender aquelas 40 mil presas.
Mas 16 meses mais tarde, um inventário financiado pelo Ocidente sobre o estoque mal havia começado e havia poucos sinais do plano nacional para os elefantes que deveria vir em seguida. O presidente também nomeou Lazaro Nyalandu para suceder Kagasheki. Agora, dificilmente passa uma semana sem que o novo ministro —-jovem, tranquilo e educado nos Estados Unidos-— anuncie mais prisões, mais confiscos, mais guardas florestais, mais dinheiro, mais treinamento e equipamento.
Para ser justo, algumas dessas afirmações são verdadeiras. Uma nova força-tarefa de múltiplas agências, financiada por dinheiro estrangeiro, já prendeu centenas de membros das quadrilhas de caçadores. Mas ela não tem conseguido prender os que realmente importam —-os chefões bem conectados que moram em Dar es Salaam ou Arusha e estão por trás do comércio sujo.
Kikwete sabe quem eles são. Em 2012, os serviços de inteligência deram-lhe uma lista de várias dezenas de políticos, funcionários e empresários importantes com ligações com seu partido Chama Cha Mapinduzi. O secretário-geral e quatro membros do CCM foram citados no Parlamento. Outros foram identificados na mídia. Mas pouco ou nada aconteceu. Os processos morreram. As investigações não levaram a lugar nenhum. A EIA constatou que, em 13 casos principais envolvendo 26,5 toneladas de marfim (o equivalente a 3.963 elefantes mortos) desde 2009, apenas um indivíduo —-um cidadão chinês-— foi condenado.
Kikwete ainda tem tempo para agir, para evitar ser lembrado como o presidente que reduziu as manadas de elefantes, antes magníficas, da Tanzânia a tantas carcaças podres. Como ele logo deixará o cargo, provavelmente já não precisa do apoio político ou financeiro dos chefões da caça ilegal. Mas os conservacionistas têm pouca esperança. Como alguém disse: "A estratégia é ir atrás dos peixes pequenos porque os que estão no topo das quadrilhas são intocáveis".
Elefantes têm presas aparadas em ação contra contrabando de marfim
Homem
lava elefante durante cerimônia de aparação de presas do animal em
campo de elefantes na província de Kanchanaburi, na Tailândia. Os
empregados do lugar cortam as presas para que os animais possam alcançar
seu alimento mais facilmente, e também para alertar ao público sobre a
caça ilegal e os riscos do corte de presas sem o devido cuidado, o que é
perigoso para o animal. Apesar da ação, ambientalistas do WWF (World
Wildlife Fund) afirmam que a solução para conter o contrabando de marfim
é que o governo proiba a venda em toda a Tailândia. Estima-se que 30
mil elefantes africanos sejam mortos por ano por causa do contrabando de
marfim. - Kerek Wongsa/Reuters
Nenhum comentário:
Postar um comentário