segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Morte de líder rebelde adia saída de jihadistas de campo de refugiados
Helena Tecedeiro - DN
Zahran Alloush, fundador do grupo Jaysh al Islam, foi morto na sexta-feira em ataque aéreo  |  REUTERS/Bassam Khabieh
Desde 2012, 18 mil pessoas vivem cercadas em Yarmouk, sem acesso regular a alimentos ou a água potável
Para as Nações Unidas, as negociações para pôr fim a cinco anos de guerra na Síria devem começar em Genebra, a 25 de janeiro. E com a presença não só do governo de Damasco mas também do "maior espectro possível de grupos da oposição e outros", afirmou ontem em comunicado. Uma decisão que a violência no terreno põe em perigo. Isto no dia em que a retirada de mais de dois mil combatentes do Estado Islâmico no campo de refugiados de Yarmouk, em Damasco, foi adiada devido à morte, na sexta-feira, de Zahran Alloush, um líder rebelde.
Os 18 autocarros que deviam transportar os jihadistas e as suas famílias tinham recebido autorização para passar pelo território controlado pelo Jaysh al Islam na viagem que os devia levar de Yarmouk, construído em 1948 para receber refugiados palestinianos, a Raqqa, capital de facto do Estado Islâmico.
Segundo a Manar TV, a televisão do Hezbollah, o grupo xiita libanês que está na Síria a combater ao lado das forças do regime de Bashar al-Assad, os autocarros chegaram ao campo de refugiados na sexta-feira, mas acabaram por receber ordens para voltar para trás. Apesar do acordo entre o governo e os jihadistas, a morte de Alloush levou as autoridades a suspender a transferência por falta de condições de segurança. O fundador do Jaysh al Islam, de 44 anos, e vários outros membros do grupo rebelde apoiado pela Arábia Saudita foram mortos durante um ataque aéreo com rockets. Foi substituído no comando por Issam al-Buwaydani - também conhecido como Abu Humam -, oriundo de Douma, a leste de Damasco.
Cercados em Yarmouk
Desde 2012 que cerca de 18 mil pessoas vivem cercadas no campo de refugiados de Yarmouk, rodeadas por combates entre rebeldes e forças do governo. Já neste ano, o Estado Islâmico tomou o controlo de parte do campo, mas encontraram resistência das milícias palestinianas e dos rebeldes sírios. Desde então, Yarmouk está dividido em várias áreas controladas pelo EI, pela Frente Al-Nusra (afiliada da Al-Qaeda), bem como por militantes palestinianos pró e antigoverno. As forças de Assad mantêm checkpoints nas fronteiras externas do campo, impedindo os residentes de sair.
Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, ONG sediada no Reino Unido, a retirada dos jihadistas de Yarmouk é apenas uma "pausa logística" até se conseguir condições de segurança na estrada para Raqqa. O plano passa por transferir os jihadistas e tornar seguro o campo, de forma a que a ONU possa levar ajuda às populações que ali vivem. Fundado há quase sete décadas e destinado a refugiados palestinianos, quando a guerra começou na Síria, em 2011, viviam lá 150 mil pessoas. Nos últimos dois anos, os que ali ficaram encurralados, entre eles pelo menos 3500 crianças, não têm acesso regular a alimentos, a água potável e a cuidados de saúde.
Processo de paz
A 18 de dezembro, o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução para apoiar um plano internacional para um processo de paz na Síria - numa rara demonstração de união entre grandes potências mundiais. Esta resolução dá a bênção da ONU a um plano negociado antes em Viena que propõe um cessar-fogo, negociações entre o governo e a oposição, bem como um calendário que em menos de dois anos prevê a criação de um governo provisório e a realização de eleições.
Damasco já anunciou estar disposta a juntar-se às negociações de paz em Genebra, agora marcadas para 25 de janeiro, com o ministro dos Negócios Estrangeiros sírio, Walid al-Moualem, a garantir na quinta-feira, numa visita a Pequim, esperar que o diálogo leve a um governo de união nacional. Iniciada em março de 2011 na sequência da chamada Primavera Árabe, a revolta popular contra o regime de Assad acabou por se transformar ao longo dos anos numa guerra de todos contra todos, com forças fiéis ao regime a lutarem contra vários grupos rebeldes, entre ele a Frente al-Nusra, com apoio da Al-Qaeda, e uma larga parte do território sírio sob controlo do Estado Islâmico. O conflito já terá feito mais de 250 mil mortos e quatro milhões de refugiados. Estes constituem um enorme desafio para os países vizinhos, mas também para a Europa, onde têm chegado nos últimos meses em números maciços.
"O povo sírio já sofreu demais"
"O povo sírio já sofreu de mais", diz o comunicado da ONU a anunciar a data de início das negociações de paz. Mas a violência no terreno, a dificuldade para determinar quem vai representar a oposição em Genebra bem como as divergências sobre o futuro de Assad prometem tornar a paz uma tarefa difícil.

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