Apontado em delação como destinatário de propina, advogado revela que recebeu 'pacote' das mãos de doleiro a pedido do ministro-chefe da Casa Civil
Thiago Bronzatto - VEJA
Demitido após denúncia de corrupção, o advogado José Yunes, amigo de Temer, diz que foi usado (Lailson Santos/VEJA)
“Padilha me ligou falando: ‘Yunes,
olha, eu poderia pedir para que uma pessoa deixasse um documento em seu
escritório? Depois, outra pessoa vai pegar’. Eu disse que podia, porque
tenho uma relação de partido e convivência política com ele.” (Sergio
Dutti/VEJA)
Após se demitir do cargo de assessor especial da Presidência em dezembro, na véspera da homologação da delação da Odebrecht, Yunes conversou com VEJA na quarta-feira 22, durante uma hora e vinte minutos. “Fui mula involuntário”, declarou, apresentando-se como um inocente útil nas mãos de Eliseu Padilha. De acordo com Yunes, Padilha entrou em contato para solicitar-lhe um favor em setembro de 2014, mês em que, segundo o delator da Odebrecht, parte da fatura dos 10 milhões de reais foi quitada. “Padilha me ligou falando: ‘Yunes, olha, eu poderia pedir para que uma pessoa deixasse um documento em seu escritório? Depois, outra pessoa vai pegar’. Eu disse que podia, porque tenho uma relação de partido e convivência política com ele.”
“Ele (Funaro) me disse: ‘Estamos
trabalhando com os deputados. Estamos financiando 140 deputados’. Fiquei
até assustado. ‘Porque vamos fazer o Eduardo presidente da Casa’.”
(Heuler Andrey/AFP)
“Eu não conhecia a pessoa que veio ao
escritório. A pessoa se identificou como Lúcio Funaro. Era um sujeito
falante e tal. Eu não o conhecia. Ele disse que estava trabalhando com
vários deputados para o Eduardo ser presidente da Casa. E eu perguntei:
‘Que Eduardo?’. Aí, ele falou: ‘Eduardo Cunha’.” (Alexandre
Schneider/VEJA)
Yunes disse que não se recorda do nome da segunda pessoa que foi retirar o pacote destinado a Padilha em seu escritório. Ele conta que, como Padilha o avisara de que a encomenda era para ele, não quis saber o que era aquele misterioso “pacote”. De acordo com a delação de Claudio Melo, um dos pagamentos destinados a Padilha “ocorreu entre 10 de agosto e o fim de setembro de 2014 na Rua Capitão Francisco Padilha, 90, Jardim Europa”. O endereço é a sede do escritório de advocacia José Yunes e Associados. A sala de Yunes fica localizada no 2º andar, que pode ser acessado por meio de escada ou elevador.
“A delação do Claudio Melo fala que
recebi 4 milhões. Cá entre nós, 4 milhões não caberiam num pacote, né? O
que o Lúcio deixou aqui foi um pacotinho. Não era um pacote grande. Foi
tudo tão rápido. Parecia um documento com um pouco mais de espessura.”
CAIXA DOIS: o ex-executivo da Odebrecht contou como a empresa repassou 10 milhões de reais ao PMDB a pedido de Temer
— O ministro Eliseu Padilha diz que a história narrada pelo delator da Odebrecht jamais existiu. O que o senhor tem a dizer?
— Cada um com os seus valores (…) Tenho um apreço até pelo Padilha, porque ele ajuda muito o presidente. Mas não teria problema nenhum ele reconhecer que ligou para mim para entregar um documento, o que é verdade. Vamos ver o que ele vai falar. Estou louco para saber o que ele vai falar. Ele é uma boa figura. Mas, nesse caso, fiquei meio frustrado. Não sei. É tão simplório. É estranho, não é?
— Mas o senhor não suspeitou que dentro do pacote poderia ter dinheiro?
— Ah, não dava para saber. Não era um pacote grande, não. Mas não me lembro. Foi tudo tão rápido. Parecia um documento com um pouco mais de espessura. Mas não dava para saber. A delação do Claudio Melo fala que recebi 4 milhões de reais. Cá entre nós, 4 milhões não caberiam num pacote, né? O que o Lúcio deixou aqui foi um pacotinho.
Procurado por VEJA, o ministro Padilha deu sua versão:
— Qual a relação do senhor com Lúcio Funaro?
— Não o conheço!
— O senhor já pediu alguma vez que Lúcio Funaro entregasse algo no escritório de José Yunes?
— Por não conhecê-lo, logo não pedi nada a ele.
Em sua delação, Claudio Melo Filho não especifica quanto dos 4 milhões de reais foi levado ao escritório de Yunes. Declara apenas que houve entrega de parte do dinheiro no local. Ele também narra ter ouvido de Padilha que Cunha ficou com 1 milhão de reais da propina. Os investigadores da Lava-Jato vão apurar se o “pacote” deixado por Funaro no escritório de Yunes tem ligação com o dinheiro destinado a Padilha ou com o 1 milhão de reais endereçado a Cunha.
Uma pista dessa resposta foi dada pelo próprio Eduardo Cunha. Em novembro, o ex-presidente da Câmara listou 41 perguntas direcionadas ao presidente Michel Temer, arrolado como sua testemunha de defesa. Entre as questões, duas chamam atenção: “Qual a relação de Vossa Excelência com o senhor José Yunes? O senhor José Yunes recebeu alguma contribuição de campanha para alguma eleição de Vossa Excelência ou do PMDB?”. No fim do ano passado, VEJA enviou essas mesmas perguntas ao presidente, que não as respondeu. Na semana passada, Yunes enfrentou essas mesmas questões.
“Ele (Eduardo Cunha) fez 41 perguntas.
Dentre elas, está uma questão sobre o meu relacionamento com o
presidente Temer. O que é isso? Uma ameaça velada. O presidente não está
nada preocupado com a delação do Eduardo Cunha.” (Adriano
Machado/Reuters)
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