sábado, 25 de fevereiro de 2017

A pinguela está balançando
Às vésperas do carnaval, o governo se vê diante de mais um terremoto ministerial. As denúncias do advogado José Yunes, ex-assessor especial de Michel Temer e seu amigo há mais de 50 anos, de que serviu de “mula” (receptor) ao chefe da Casa Civil, Elizeu Padilha, em pagamento de propina da Odebrecht, afastam de vez do governo o principal ministro e conselheiro do presidente.
Pinguela (Foto: Arquivo Google) E não apenas: respingam no próprio Temer, íntimo de ambos, que os teve e manteve no assim chamado núcleo duro palaciano. Fica, no mínimo, a suspeita de que não ignorava os fatos, que, por sinal, também o incluem nas delações de Marcelo Odebrecht.
O presidente é acusado de ter pedido e recebido R$ 10 milhões para a campanha de seu partido, o PMDB, que então presidia. O dinheiro teria sido pago em caixa dois, e parte dele teria sido destinado a Padilha, nos termos da narrativa de Yunes.
Temer nega o caixa dois e garante estar tudo registrado na Justiça Eleitoral. As denúncias, óbvio, carecem de comprovação, embora Marcelo Odebrecht as sustente com convicção, não ocultando a origem ilícita do dinheiro. Podem não gerar – e não vão – providências imediatas, de ordem jurídica, mas politicamente configuram mais um abalo para o presidente e seu governo.
Se fosse apenas isso, já seria muito. Mas há mais, muito mais. A essas denúncias, somam-se as de outras empreiteiras, igualmente implicadas na Lava Jato – Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez, OAS, Delta, UTC -, prenunciando uma quaresma mais barulhenta e predadora que o próprio carnaval. A pinguela está balançando.
Aguarda-se, na sequência imediata do feriado, a divulgação, pelo Ministério Público, dos demais nomes mencionados pelos 77 executivos da Odebrecht, já homologados pelo STF.
Não se sabe quantos são; sabe-se apenas que são muitos, quase duas centenas, a maioria gente do governo anterior e do atual, indo em cheio ao coração do Congresso.
Não por acaso, um dos temas mais ruidosos na Câmara e no Senado, no curso da semana, foi, mais uma vez, o foro privilegiado. O país quer o fim do foro; os políticos, não. O líder do governo no Senado, Romero Jucá, tentou estender o princípio de intocabilidade do presidente da República, que não responde por atos praticados fora de seu mandato, aos presidentes da Câmara e do Senado.
Perdeu. E acabou por se referir ao foro como “uma suruba”, em que ou todos dela participam ou então ninguém, deixando claro que quer a generalização, nada de “suruba selecionada”. Um momento de rara elevação verbal no Parlamento.
Em meio a tamanha algaravia, Temer viu a nomeação do novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-RS), gerar atritos em sua própria base parlamentar. O deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), coordenador da bancada mineira, que queria no cargo alguém de seu estado, anunciou ter rompido com o governo.
Ramalho não é nenhuma sumidade – é, antes, um ente do baixo clero -, mas ocupa a 1ª vice-presidência da Câmara; é o sucessor imediato de Rodrigo Maia que, citado na delação da Odebrecht e agora também por Fernando Cavendish, da Delta, como beneficiário de propina, corre risco potencial de deixar o cargo.
Nessa hipótese, ainda vaga (mas nada é tão vago na atual conjuntura quanto o próprio governo), Temer teria um inimigo à frente da Câmara; Ramalho seria o seu Eduardo Cunha, embora sem o mesmo talento predatório deste. Mas, quando se cruza uma pinguela, o peso de uma piaba pode fazer toda a diferença.
De quebra, o governo perdeu, subitamente, um de seus quadros mais expressivos, o ministro das Relações Exteriores, José Serra, que, alegando questões de saúde, demitiu-se. Serra havia imprimido à política externa grandes transformações, a começar pelo rompimento com o bolivarismo e a abertura de novos mercados. Seu sucessor deverá ser também um tucano.
Em resumo, ao fim dos tambores de Momo, voltam a rufar os da Lava Jato, dando continuidade ao calvário da classe política.

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