domingo, 23 de julho de 2017

Maia tenta se livrar da pecha de traidor para 'ficar no jogo'
Marina Dias - FSP
Nos últimos dias, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez aquele que pode ter sido o mais importante cálculo político de sua vida pública. Para se manter como opção a Michel Temer, deixou que o pragmatismo prevalecesse sobre a ambição de se tornar o homem mais poderoso do país.
Sucessor imediato ao Palácio do Planalto caso Temer seja afastado do cargo, o deputado viu seu ânimo com a possibilidade de assumir a Presidência da República aumentar no mesmo ritmo em que a pecha de "traidor" era vinculada à sua imagem.
Irritado, admitiu a pessoas próximas ter entendido que, caso passasse a ideia de que traiu e ajudou a derrubar o presidente, seu dia seguinte como inquilino do Planalto seria "um inferno".
Maia decidiu comandar uma sutil mudança de estratégia no seu comportamento e no de seus principais interlocutores: os deputados Heráclito Fortes (PSB-PI), Benito Gama (PTB-BA) e Fernando Monteiro (PP-PE).
Diminuiu os encontros em sua residência oficial para tratar de um eventual cenário pós-Temer, afastou-se de parlamentares da oposição, disse que nunca pediu votos contra o presidente e jantou duas vezes com ele na semana que passou.
Maia tinha se incomodado especialmente com dois episódios nos últimos 15 dias: o assédio de Temer aos dissidentes do PSB, que negociavam migrar para o DEM, partido do presidente da Câmara, e os recados de que, caso assuma o Planalto, a PGR (Procuradoria-Geral da República) poderia centrar nele todo o seu poder de fogo.
E foi o próprio presidente o portador dessa análise. Na manhã de domingo (9), quando recebeu Maia no Palácio do Jaburu num clima de poucos amigos, Temer fez a avaliação de que os procuradores não deixariam o possível sucessor em paz.
O raciocínio, repetido na casa de Maia no dia seguinte pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), é de que as investigações querem jogar na vala comum toda a classe política.
O presidente da Câmara é alvo de dois inquéritos no STF (Supremo Tribunal Federal) resultantes de colaborações premiadas de ex-executivos da Odebrecht. Segundo delatores, ele recebeu repasses para sua campanha em 2008, para a de seu pai, em 2010, além de R$ 100 mil em 2013 para ajudar na aprovação de uma medida provisória que beneficiaria a empreiteira, o que o deputado nega.
Aliados contam que Maia disse apenas que era necessário cuidar do problema do presidente, que precisa barrar, no plenário da Câmara, a denúncia por corrupção passiva apresentada contra ele pela PGR.
A oposição precisa dos votos de 342 dos 513 deputados para aprovar a denúncia. Se isso acontecer, Temer é afastado por 180 dias, durante seu julgamento pelo STF, e Maia assume interinamente.
Baseado no termômetro dos deputados, o presidente da Câmara colocou seu cálculo em prática e fez com que o clima esfriasse um pouco.
A cautela dos parlamentares, que acreditam que Temer pode se salvar na primeira denúncia, mas que terá mais dificuldade em passar por outras duas que a PGR ainda pode oferecer contra ele, se dá à espera dos efeitos das possíveis delações de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e de seu operador, Lúcio Funaro.
Ambos prometem citar o presidente e o núcleo do governo, exigindo o apoio da base aliada em um ambiente ainda mais desgastado.
Com o cenário incerto e a natural expectativa de poder a seu redor, Maia só não faz questão de esconder a ponte que estabeleceu com o ministro Henrique Meirelles (Fazenda), fiador da política econômica.
Em dez dias os dois se encontraram duas vezes, e o ministro antecipou ao chefe da Câmara o aumento do imposto sobre os combustíveis, anunciado na quinta (20).

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