Crise ressuscita a peseta em cidade do interior da Espanha
Medida movimentou a economia de Salvaterra do Minho e atraiu moradores de cidades vizinhas
Sandro Fernandes - Opera Mundi
Um café? 166 pesetas. A vistoria do carro? 14.000 pesetas. O povoado de Salvaterra do Minho, na região da Galícia, Espanha, resolveu ressuscitar a antiga moeda espanhola como uma maneira de enfrentar a crise e incentivar o comércio local. Ironicamente, o euro completa 10 anos de existência neste mês de janeiro.
A crise na Espanha apresentou novas e alarmantes cifras esta semana – 22,85% de desempregados (48,56% se contabilizados apenas os menores de 25 anos) e 500.000 empresas fechadas nos últimos quatro anos. Esta situação pouco promissora levou a que a pequena cidade galega, de menos de 10.000 habitantes, tivesse a iniciativa de passar a aceitar a “rubia”, como era conhecida a peseta devido ao dourado da moeda, aproveitando que o Banco da Espanha não tem um ano limite para as trocas. “Muitas pessoas não têm tempo para ir até Corunha ou Madri para trocar o dinheiro e acabam ficando com moeda antiga guardada como lembrança”, explicou por telefone ao Opera Mundi Luiz Fernando Alonso, portavoz da Unes (União de Empresário de Salvaterra do Minho).
O sucesso da iniciativa foi tanto que atraiu clientes de várias regiões vizinhas e inclusive do lado português da fronteira. A medida foi adotada em outubro e terminará no fim de janeiro, depois de ter sido prorrogada três vezes.
A peseta foi introduzida em 1869 e saiu de circulação em 2002, substituída pelo euro. O Banco de Espanha estima que 45% das pesetas que estavam em circulação antes da adoção do euro nunca serão entregues e permanecerão guardadas nas gavetas e carteiras dos espanhóis, o que equivaleria a mais de 1,7 bilhão de euros.
As complicadas contas de conversão voltaram a fazer parte do dia-a-dia dos moradores de Salvaterra do Minho, mas ninguém parece estar reclamando do tempo perdido com a calculadora. “O único problema é que o café antes custava 90 pesetas (55 centavos de euro) agora custa 166 pesetas. Com o euro, arredondaram os valores pra facilitar a conta”, ironiza Javier Borges. “Bem, mas pelo menos agora podemos comprar alguma coisa. Melhor do que deixar o dinheiro mofando entre os livros”, conclui. A peseta passou a ser aceita combinada com o euro. Os moradores podem, inclusive, pagar na antiga moeda e receber o troco em euros. “Comprei dois perfumes com o dinheiro que eu tinha em casa, 10.000 pesetas (60 euros ou 140 reais)”, revela Susana Hernández.
A arrecadação dos comerciantes em três meses ultrapassou um milhão de pesetas, o que equivale a pouco mais de seis mil euros (aproximadamente, 14 mil reais) e a nostalgia tomou conta de Salvaterra. “É estranho tocar estas pesetas. Vemos os rostos de Rosália de Castro, Bécquer, Manuel de Falla (escritores espanhóis) e é impossível não sentir saudade”. Circulam também moedas com o rosto do General Francisco Franco, ditador na Espanha de 1939 até 1975.
Quando perguntado por jornalistas se a medida não poderia facilitar o branqueamento de dinheiro, um dos comerciantes responde sorrindo: “Quem quiser branquear dinheiro aqui, que seja bem-vindo”.
A ideia da utilização da peseta não é novidade na Espanha. Em 2009, o povoado de Narón, também na Galícia, colocou em prática a mesma medida e arrecadou valores similares ao de Salvaterra. E em março de 2011, o povoado galego de Murgados copiou a iniciativa.
Uma pesquisa do Real Instituto Elcano divulgada em dezembro revela que para 70% dos espanhóis o euro não melhorou em nada ou em quase nada as suas vidas. No entanto, apenas 7% defendem o retorno da antiga moeda.
O jornal Expresso, de Portugal, noticiou em dezembro o êxito de uma loja no centro de Lisboa que aceita euros e escudos. “Meus clientes evitam as filas e as burocracias do Banco de Portugal e recebem o troco em euros”, explicou ao diário português Luís Cardoso, proprietário da loja. Em Portugal, os bilhetes na antiga moeda podem ser trocados até 2022.
Peseta continua presente no dia-a-dia do espanhol
Apesar de já estar fora de circulação há 10 anos, a peseta sobrevive no imaginário dos espanhóis. Qualquer pessoa com mais de 25 anos ainda utiliza a moeda para indicar grandes cifras, como preços de casas e automóveis. 42 milhões de “rubias” por um apartamento de dois quartos em Madri é um valor muito mais compreensível do que os correspondentes 250 mil euros (algo como 575 mil reais).
As expressões populares também mantêm as referências à antiga moeda. Na Espanha, se você não tem dinheiro, basta dizer que não tem “pelas”. E se você é um pão-duro, será chamado de “pesetero”.
A Prefeitura da cidade valenciana de Alzira, na Espanha, cunhou no dia 1º de janeiro uma moeda própria, utilizada para pagar as subvenções aos moradores da cidade. A moeda só poderá ser utilizada no comércio local e é uma medida para que “o dinheiro fique em Alzira”, explicou em coletiva à imprensa o Secretário de Promoção Econômica de Alzira, José Luis Palacios. A moeda não existirá da maneira tradicional, impressa em papel. Será apenas um cartão de crédito, a ser utilizado apenas nas lojas da cidade. Posteriormente, os donos dos estabelecimentos poderão trocar os vales ou cartões por euros na Prefeitura. “Dessa forma, qualquer bolsa ou auxílio que um alzirense receba, deverá ser gasto na própria cidade”, explica Palacios.
Em 1937, durante a Guerra Civil Espanhola, Alzira teve uma moeda própria durante quase nove meses, também com o objetivo de estimular o comércio local.
Franco também volta ao debate
Marine Le Pen, candidata presidencial na França pelo partido de extrema-direita Frente Nacional, afirmou que caso seja eleita, a prioridade do seu governo será nacionalizar os bancos franceses, aumentar o protecionismo, controlar a imigração e restabelecer o franco francês. Segundo a pesquisa do centro TNS-Sofres 31% dos franceses concordam com as ideias de Le Pen, o nível mais alto de 1984, quando o partido foi criado. Os franceses vão às urnas no dia 22 de abril.
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