terça-feira, 31 de janeiro de 2012

OS INTOCÁVEIS - A SAGA CONTINUA

Autonomia ou soberania
FSP - Editorial
O desaparecimento de equipamentos doados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a tribunais estaduais, no valor de R$ 6,4 milhões, é mais um episódio a agravar a crise que se instalou no Judiciário.
O motivo das divergências é a definição das atribuições do próprio CNJ, órgão criado para fiscalizar o desempenho administrativo e financeiro da Justiça e os procedimentos funcionais da magistratura.
Em breve o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá sobre um aspecto crucial para a atuação do Conselho -se lhe é facultado instaurar investigações independentes ou se precisará aguardar o resultado das apurações conduzidas pelas corregedorias dos tribunais estaduais.
Parte dos juízes, entre os quais figura o ministro Cezar Peluso, presidente do STF, considera que o órgão fiscalizador não deve se antecipar ou sobrepor às investigações das instâncias regionais. Essa perspectiva -que, vitoriosa, restringiria o escopo da fiscalização pelo CNJ- é compartilhada por entidades de classe que defendem os interesses corporativos da magistratura.
No outro lado, com apoio de membros do STF, a corregedora nacional, Eliana Calmon, aparece como a mais ativa adversária da limitação dos poderes do Conselho.
No sábado, em entrevista a esta Folha, o ministro Gilmar Mendes, ex-presidente do STF, foi feliz ao apontar um equívoco conceitual na reação dos juízes contra as investigações -a confusão entre autonomia e soberania do Judiciário. Não há dúvida de que o Poder precisa ser autônomo, diante do Executivo e do Legislativo, mas é um erro pretender que seja soberano.
Um dos mais ativos presidentes do Supremo, Mendes forneceu, em sua gestão, apoio e recursos para que o CNJ cumprisse seu papel constitucional e se tornasse uma instância de controle atuante.
O fato de que tenha se destacado como defensor ferrenho dos direitos individuais apenas reforça sua opinião, manifestada na mesma entrevista, de que alguns juízes estariam sendo pouco respeitosos em relação aos fatos. Referia-se à acusação -ao que tudo indica sem fundamento- de que o CNJ teria quebrado o sigilo de servidores da Justiça ao investigar pagamentos e movimentações financeiras.
Os indícios de operações duvidosas e irregularidades no âmbito do Judiciário não deixam dúvida sobre a importância institucional de um conselho fiscalizador independente. Será uma perda para a democracia brasileira se o Supremo decidir por limitar as atribuições do CNJ. O Estado brasileiro precisa de mais -e não de menos- transparência.

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