A real situação dos aeroportos
O Estado de S.Paulo
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) anunciou que
haverá punições severas para empresas aéreas que descumprirem horários
durante a Copa do Mundo - e tais regras continuarão válidas depois da
competição. Trata-se de uma iniciativa necessária, pois os atrasos
tornaram-se parte do cotidiano da aviação nacional, e no Mundial, com o
previsível aumento do movimento de passageiros, a situação tende a
piorar, exigindo pulso firme para reduzir a possibilidade de um caos
aéreo. No entanto, é também sabido que parte considerável dos problemas
do setor tem origem no acanhamento dos aeroportos, cuja capacidade para
absorver o crescente fluxo de voos e viajantes está sempre no limite e
cuja ampliação, com vista à Copa, está atrasada. Logo, não há garantia
de que o castigo que a Anac ameaça impor será suficiente para minorar o
problema, que vai muito além da irresponsabilidade de uma ou outra
empresa.
A partir de 5 de junho, as companhias aéreas que desrespeitarem os
slots (horários de pousos e decolagens) - ou seja, se houver atraso
superior a 15 minutos - pagarão uma multa entre R$ 24 mil e R$ 60 mil.
Se a empresa solicitar o slot e não utilizá-lo, será multada em até R$
30 mil. Se houver pouso ou decolagem sem nenhuma autorização, a multa
será de até R$ 90 mil, a mais alta do pacote.
Haverá punições também para a aviação geral, que inclui jatinhos,
táxis aéreos e aviões executivos. Até agora dispensados dos slots, esses
voos terão de cumprir horários previamente acertados durante a Copa. As
multas vão variar de R$ 7 mil a R$ 63 mil. Além disso, os pilotos
brasileiros de jatinhos que desrespeitarem as regras poderão ter sua
licença de voo suspensa por até 180 dias. Já os pilotos estrangeiros
poderão ser impedidos de pousar em território brasileiro.
Não haverá penalidade se o atraso for motivado por problemas alheios à
vontade da companhia aérea, como mau tempo ou necessidade imprevista de
manutenção da aeronave. Mesmo nesses casos, porém, a Anac vai apertar a
fiscalização para que as empresas tenham planos de contingência.
Tal postura rígida faria sentido num país em que os aeroportos
funcionassem muito bem, fazendo das companhias aéreas as únicas
responsáveis por eventuais atrasos. Mas os passageiros de avião no
Brasil sabem que a realidade é outra - nos aeroportos, principalmente
quando há grande movimento, impera o improviso.
Em resposta à pressão da Anac, a Associação Brasileira das Empresas
Aéreas (Abear) afirma que o planejamento para a Copa começou a ser feito
em 2013 e "está alinhado com todas as autoridades do setor" - uma
maneira nada sutil de dizer que o governo há tempos está ciente do plano
e a ele deu seu aval. No entanto, como a associação deixou claro,
nenhum planejamento será suficiente se as condições dos aeroportos não
forem as ideais. "Esperamos que na Copa a capacidade dos aeroportos seja
plena para garantir o bom andamento do evento", disse o presidente da
Abear, Eduardo Sanovicz.
O diretor-presidente da Anac, Marcelo Guaranys, afirmou estar seguro
de que a estrutura dos aeroportos estará totalmente adequada às
necessidades da Copa. Diante dos atrasos das obras para suportar o
grande fluxo de turistas, porém, é difícil acompanhar o otimismo de
Guaranys.
Dos 16 aeroportos que serão usados na Copa, 11 ainda estão passando
por reformas, a menos de um mês do início da competição, e é improvável
que tudo fique pronto a tempo. Em pelo menos um caso, o de Fortaleza, o
governo já sabe que a ampliação não respeitará o prazo, tornando
necessário improvisar um terminal coberto por lona. O Galeão, no Rio,
que será uma das principais portas de entrada de estrangeiros, ainda
sofre com apagões, e o governo admite que há risco de interrupção de
energia durante a Copa.
Diante de tal quadro, a atitude da Anac de impor pesadas multas e
anunciar forte fiscalização, como se fosse possível culpar apenas as
companhias pelos eventuais atropelos, é uma forma de negar os problemas
estruturais e a responsabilidade do governo por eles.
Nenhum comentário:
Postar um comentário