quinta-feira, 31 de julho de 2014

Israel usa "água suja" como arma contra tumultos e punição de palestinos
Florence Beaugé - Le Monde
Nas últimas três semanas, os palestinos de Jerusalém Oriental vêm sofrendo uma punição coletiva: a "dirty water", como é chamada aqui. Toda vez que ocorre uma manifestação – e elas acontecem toda noite na parte oriental da Cidade Santa, desde o início da ofensiva em Gaza – um caminhão branco passa em seguida no local lançando um misterioso líquido fétido.
Tudo fica impregnado: as fachadas das casas e dos prédios, as janelas, as calçadas, o asfalto, os arbustos, as flores... O que esse produto contém? Ninguém sabe, e a polícia israelense se mantém muito discreta a esse respeito. O odor exalado pela "dirty water" agride as narinas. Ele gruda nas roupas e na pele, e é impossível se livrar dele durante dois ou três dias.
Em Souwaneh, um dos bairros "problemáticos" de Jerusalém Oriental, os moradores andam cobrindo o rosto ou tapando o nariz. Ninguém se demora nas ruas. Seria esse o objetivo da punição coletiva? Certamente. Ao obrigar as pessoas a se fecharem em suas casas, as forças de ordem esperam impedir qualquer nova manifestação.
O problema é que a "dirty water" não se contenta em macular as fachadas. Ela penetra nas casas, se incrusta nas cortinas, nos tapetes, nas almofadas, e torna a vida dos palestinos ainda mais insuportável. E mais humilhante, também. "Quem somos nós para que nos tratem como ratos ou mosquitos, usando inseticidas?", se pergunta um encolerizado Mounir, preocupado com seus filhos.

Desespero e cansaço

Nahla, sua vizinha de frente, não esconde seu desespero e cansaço. "Tentei de tudo para tirar esse cheiro da minha casa, com sabão líquido, vinagre, cloro, nada adiantou…", ela lamenta, ressaltando a crueldade da situação: em pleno Ramadã, ela, que jejuava e não bebia uma única gota, teve de jogar montes de água em seu cachorro, nos degraus da escala, nos azulejos…
A poucos quilômetros de lá, o bairro de Issaouia também vem sofrendo regularmente essa punição coletiva. Faouzi, verdureiro e padeiro, teve de jogar fora seus estoques várias vezes. "Até três semanas atrás, eu brigava com os jovens que jogavam pedras, derrubavam as lixeiras e ateavam fogo nelas todas as noites. Eu dizia para eles: 'Vocês estão provocado os soldados e atraindo problemas para nós. Vão para outro lugar!". Agora, não digo mais nada. Pelo contrário. Estou tão cheio de Israel, que digo a meus vizinhos: "Deixe eles...".

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