terça-feira, 30 de junho de 2015

Restaurantes americanos cometem discriminação ao contratação funcionários?
Stephen J. Dubner e Steven D. Levitt - Freakonomics
Spencer Platt/Getty Images/AFP
Funcionários e manifestantes protestam em frente a lojas das redes de fast food Wendy's e Burger King para exigir melhores pagamentos e o direito de formarem um sindicato, em 2013 Funcionários e manifestantes protestam em frente a lojas das redes de fast food Wendy's e Burger King para exigir melhores pagamentos e o direito de formarem um sindicato, em 2013
Se você já saiu para jantar em Nova York ou em qualquer outra grande cidade com uma população diversa, você provavelmente já notou isto: a maioria dos funcionários nos restaurantes mexicanos tende a ser latina, assim como a maioria dos funcionários nos restaurantes de sushi tende a ser japonesa, ou no mínimo asiática, e a maioria dos funcionários nos restaurantes indianos tende a ser indiana.
Por que isso? À primeira vista, parece óbvio: italianos trabalham no restaurante italiano do seu bairro porque este serve comida italiana. Simples. Mas as forças econômicas e culturais que combinam certos funcionários com certos restaurantes são muito mais complicadas do que a maioria de nós imagina.
E há uma questão maior: isso é legal? No que concerne ao governo americano, é OK restaurantes favorecerem certas etnias quando tomam decisões de contratação?
Bem, isso também é complicado. Veja o exemplo do Elizabeth's Neighborhood Table e do Gabriela's Restaurant & Tequila Bar –-dois restaurantes lado a lado de propriedade e dirigidos por Nat e Liz Milner. O Gabriela é um restaurante de comida mexicana –-as coisas boas e autênticas: moles, ceviches e chimichangas. E quem você acha que trabalha ali? Segundo Nat Milner, em qualquer noite de sexta-feira, cerca de 40% das pessoas que trabalham na frente da casa (recepcionistas, garçons) são mexicanas, e quase todas as demais, incluindo o pessoal na cozinha, são latinas --colombianos, equatorianos e dominicanos.
Nat e Liz atribuem tudo isso a uma mistura de autosseleção e expectativa do cliente. Um restaurante como o Gabriela's, que pode inicialmente atrair funcionários latinos simplesmente por causa dos pratos que serve, acaba criando um ambiente de trabalho que é bem mais atraente para pessoas que falam espanhol. "Se você vier trabalhar aqui e não falar espanhol, não se adaptar à cultura de refeição familiar, de comer e rir com as pessoas, você meio que acaba se sentindo um tanto deslocado", Nat disse a Stephen Dubner quando este visitou o restaurante recentemente.
E há o fato de que, de modo consciente ou não, as pessoas com frequência querem que os funcionários do restaurante reflitam sua culinária. Nat, por exemplo, reconheceu que seus clientes provavelmente não esperam vê-lo –-um branco de cabelo ruivo encaracolado-– quando chegam: "As pessoas querem chegar a um restaurante mexicano e se verem cercadas por pessoas de língua espanhola com cabelo escuro, não é?"
Mas e quanto ao Elizabeth's Neighborhood Table –-um restaurante que serve pratos americanos clássicos como hambúrgueres e panquecas, e parece uma casa de praia da Nova Inglaterra? Como você pode imaginar, na frente da casa há poucos latinos. Mas as pessoas escondidas na cozinha são, como no Gabriela's (e em muitos outros restaurantes de Nova York), principalmente latinas.
Tudo isso parece inofensivo. Mas imagine se você decidisse abrir um restaurante sueco em Nova York e quisesse que seus funcionários fosse apenas suecos, ou no mínimo escandinavos. E se você desse a loiros de olhos azuis uma vantagem no processo de contratação? Parece injusto, não é? E talvez até mesmo ilegal.
Bem, na verdade essas práticas de contratação são, de fato, ilegais –-mais ou menos. O professor da Escola de Direito de Stanford, John J. Donohue 3º, disse a Dubner que, com algumas ressalvas cruciais (como o número de funcionários na empresa), a Lei de Direitos Civis americana de 1964 proíbe práticas de contratação etnicamente discriminatórias nos restaurantes e em qualquer lugar. "O estatuto é bem claro. E se você levar etnia em consideração, você está tecnicamente sujeito a um processo de discriminação no emprego."
De fato, a Comissão de Oportunidades Iguais no Emprego do governo tem processado restaurantes por violar a lei de 1964. Segundo Justine Lisser, uma porta-voz da comissão, esta impetrou um processo contra um restaurante mexicano em Houston por demitir garçons não latinos que não falavam espanhol, apesar de muitos dos clientes do restaurante também não falarem a língua. "Para qualquer restaurante ou empregador fazer uma exigência de língua, ela tem que ser, e essa é a frase legal, 'relacionada ao trabalho e consistente com a necessidade da atividade'", disse Lisser ao "Freakonomics". "E na maioria dos casos, não tem relação com o trabalho e nem é consistente com a necessidade da atividade."
É claro, a grande maioria dos restaurantes, incluindo o Gabriela's e o Elizabeth's, não estão negando emprego a pessoas qualificadas; estão simplesmente tentando criar um ambiente de trabalho no qual seus funcionários possam funcionar e prosperar. E se um certo nível de hegemonia étnica faz parte desse ambiente, e ninguém está se queixando, então que assim seja, não é?
A chave, como aponta o nosso Steven Levitt, é encontrar a divisa entre uma cultura de trabalho robusta, saudável, e uma claramente discriminatória. "Eu acredito muito no poder da cultura da empresa e na visão de que coisas intangíveis podem afetar dramaticamente a produtividade nas empresas. Mas é preciso ser supercuidadoso ao seguir por esse caminho para que o resultado final não seja um grande apoio à discriminação", ele disse a Dubner. Levitt prosseguiu: "A questão da discriminação é uma das mais complexas quando levada aos tribunais e quando se trata de mercados e como pensar a respeito. Porque até mesmo a definição certa do que significa ser discriminatório é sutil e depende de contexto".
Tradutor: George El Khouri Andolfato 

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