sábado, 1 de abril de 2017

Contra o voto em lista
Merval Pereira - O Globo 
Quanto mais fica clara a improbidade dos partidos políticos brasileiros, mais difícil será passar no Congresso o sistema de lista fechada. A força tarefa de Curitiba abriu um processo contra o PP, e outros se seguirão contra o PT e o PMDB, pedindo o ressarcimento do dinheiro roubado dos cofres públicos.
Como a lista fechada dá às direções partidárias um poder que será de vida ou morte em relação aos candidatos, a fragilização moral e política dos partidos leva a que esse sistema seja rejeitado pelos eleitores e encontre dificuldades de aprovação no Congresso.
Agora mesmo a Comissão de Reforma Política da OAB-SP, presidida pelo jurista Ives Gandra Martins, decidiu se manifestar publicamente contra o voto em lista fechada. É um voto de sistema parlamentar de governo, onde há partidos políticos definidos, comenta o jurista, que é direto em sua crítica: “No fundo o que eles estão querendo é perpetuar os donos dos partidos, principalmente os partidos recentemente criados sem base nenhuma. São pessoas sem nenhuma expressão, que não venceriam o teste de uma eleição, que vão ficar no topo da lista”.
Além dessa particularidade de nosso precário sistema partidário, que é a facilidade com que se criam partidos que, em grande parte, viverão das verbas do Fundo Partidário e das negociações de tempo de televisão nas campanhas eleitorais, como ficou claro pelas delações dos executivos da Odebrecht, Ives Gandra ressalta que “os partidos mais antigos querem o voto em lista para esconder dos eleitores os políticos atingidos pela Lava Jato”.
Há voto em lista nos países em que existe o sistema parlamentar de governo, onde os partidos são ideológicos, reafirma. Não pode haver esse estelionato eleitoral como no Brasil, em que o deputado é eleito por uma legenda e em seguida muda para outra. “O cidadão tem que fazer carreira dentro do partido. Em Portugal, ninguém muda de partido enquanto é deputado”, ressalta Ives Gandra.
 Mesmo na Itália, que tem igual número de partidos, cerca de  35, que o Brasil, só 8 têm assento no Congresso. No Brasil, sem cláusula de barreira, são nada menos que 28 partidos atuando no Congresso. A Comissão de Reforma Política da OAB de São Paulo tem como membros, entre outros,Nelson Jobim, Dalmo Dallari, Almino Affonso, Cláudio Lembo, e Alexandre de Moraes até ser nomeado ministro da Justiça.
O cientista político Luiz Felipe d’Avila, Diretor-Presidente do Centro de Liderança Pública, fez uma apresentação para a Comissão no dia em que ficou decidido que haveria uma manifestação pública contra o voto em lista fechada. Ele lembrou que no nosso sistema proporcional 70% dos eleitores não recordam no candidato que votaram para o Parlamento, por isso são cada vez mais frequentes os protestos de “Eles não me representam”.
Para o cientista politico, o desinteresse do eleitor e a pressão do corporativismo colaboram para distanciar o Congresso da sociedade e transformá-lo em defensor de privilégios de corporações e grupos organizados. A alta fragmentação partidária no Parlamento leva a que o eleitor não acompanhe quem elegeu, ou às vezes nem saiba para onde foi seu voto.
Ao mesmo tempo, o Brasil tem a campanha parlamentar mais cara do mundo, frisou Felipe D’Avila. A eleição de 2014 teve 6178 candidatos (513 eleitos) a um custo total de R$ 5,1 bilhões. A eleição municipal de 2016, com restrição ao financiamento privado, baixou o custo para R$ 2,2 bilhões.
A Comissão também está a favor do voto distrital misto, como na Alemanha, o que, na opinião de Felipe D’Avila, faria aumentar a responsabilização dos nossos representantes, permitindo o eleitor a fiscalizar e cobrar o seu parlamentar. Contribuiria, juntamente com o fim das coligações, também para reduzir o número de partidos no Congresso, além de reduzir o custo da campanha.
A cláusula de barreira, com a exigência de 2% de votos, levaria a que apenas 13 partidos pudessem ter atuação no Congresso. A adoção do voto distrital já para a eleição de 2018 é considerada difícil pelo debate que acarretará a definição dos distritos, com critérios geográficos e demográficos a serem estebelecidos pelo TSE e IBGE.
Distritos precisam formar unidades geográficas contínuas, lembrou Felipe D’Avila, e sua divisão terá que ser feita idealmente de acordo com números próximos aos quocientes para eleição de deputado federal ou estadual ou vereador. De qualquer maneira, o voto em lista terá mais dificuldade ainda de ser aprovado caso não introduza a obrigatoriedade do voto distrital a partir da próxima eleição.

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