Fiat paralisa produção por falta de peças, e JBS suspende atividades
Bloqueio de caminhoneiros afeta as exportações pelos portos de Santos, em São Paulo, e Paranaguá, no Paraná
João Sorima Neto / Flávio Ilha / Juraci Perboni e Anselmo Carvalho Pinto - O Globo
SÃO PAULO, FLORIANÓPOLIS, PORTO ALEGRE e CUIABÁ - A
manifestação dos caminhoneiros insatisfeitos com a alta dos combustíveis
começou a afetar as exportações pelos portos de Santos, em São Paulo, e
Paranaguá, no Paraná, bem como a atividade de algumas empresas. Nesta
terça-feira, os motoristas bloquearam o acesso e a saída do Porto de
Santos - o mais movimentado da América Latina, com uma circulação de
cerca de nove mil caminhões por dia. Os acessos foram liberados apenas
no fim da noite. A chegada ao Porto de Paranaguá, por onde é exportada
parte da safra de soja do país, também foi obstruída. E em plena época
de colheita. Se ao menos 900 caminhões passam por lá diariamente, nesta
terça havia somente 45 veículos no pátio, transportando apenas 10% da
soja e do farelo previstos para ser embarcados.Unidade da JBS em Lins, São Paulo: empresa paralisou produção por causa de greve - DARIO LOPEZ-MILLS / AP
Os prejuízos ainda não foram estimados, mas se estendem para
bem além das docas. Em Minas Gerais, a fábrica da Fiat de Betim - onde
são montados três mil veículos por dia - dispensou os seis mil
funcionários do primeiro e segundo turnos por falta de componentes e
peças para a montagem dos veículos. O bloqueio da Rodovia Fernão Dias
(BR-381), principal ligação entre São Paulo e Minas Gerais, comprometeu a
entrega. Na segunda-feira, a montadora já havia dispensado
trabalhadores pelo mesmo motivo.
No Sul do país, a JBS foi forçada a suspender as operações
em oito unidades, além das do Mato Grosso do Sul - o que representa 75%
da capacidade de produção de aves e suínos da empresa. E tudo por causa
da falta de matéria-prima e embalagens, que não chegaram ao destino.
Segundo o Sindicato das Indústrias de Laticínios do Rio Grande do Sul (Sindilat), veículos que transportam leite in natura
estão sendo impedidos de levar suas cargas para abastecer as indústrias
de processamento. A entidade ingressou na Justiça Federal com um pedido
de liminar para desbloquear as rodovias no estado.
- Entendemos o pleito dos caminhoneiros, mas acredito que a
cadeia leiteira e outras atividades econômicas não podem ser
prejudicadas. No caso do leite, há cargas destinadas ao abastecimento da
cesta básica, de creches e hospitais. O protesto está causando prejuízo
econômico à indústria e produtores e poderá provocar dano ambiental,
devido à eventual necessidade de descarte de leite caso o protesto
perdure - advertiu o presidente do órgão, Alexandre Guerra.
O Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística
do Estado (Setcergs) também alerta para o risco de desabastecimento de
combustível caso o movimento persista por mais um ou dois dias. O
presidente Afrânio Kieling disse já ter identificado a possibilidade de
uma interrupção total da BR-101, principal ligação do Rio Grande do Sul
com o centro do país.
- Reconhecemos que o prejuízo dos profissionais é grande, mas não compactuamos com greves - resumiu Kieling.
A Associação Gaúcha de Supermercados (Agas) estimou que, se o
protesto se mantiver por mais dois dias, haverá problemas no
abastecimento de carnes e hortigranjeiros. No norte do estado, alguns
postos de combustíveis já registraram falta de gasolina nas bombas.
Em Santa Catarina, o efeito do protesto é mais severo. O
produtor de leite Heindert Sand, de Campo Erê, por exemplo, jogou fora
três mil litros quando foi surpreendido na noite de segunda-feira pela
notícia de que a indústria não faria a coleta no dia seguinte.
A Cooperativa Aurora, maior processadora de alimentos do
país, informou que poderá interromper totalmente a produção. Em
comunicado, a empresa alertou que os estoques de ração têm condições de
atender à demanda das granjas associadas somente até amanhã. E o
Sindicato das Indústrias de Laticínios e Produtos Derivados (Sindileite)
suspendeu desde a segunda-feira a coleta nos pontos de produção do
Oeste catarinense devido às dificuldades de transporte.
A situação começou a se complicar também em Mato Grosso,
onde a região norte do estado já registra falta de combustível em vários
pontos. Hoje à tarde, enormes filas de carros já se formavam nos postos
de Sinop, a maior cidade da região, localizada a 500 quilômetros de
Cuiabá. Por volta das 14h, cinco postos visitados pelo GLOBO não tinham
mais óleo diesel, e o volume de álcool era suficiente apenas para
terminar a o dia.
— A situação é gravíssima. Quando a manifestação terminar,
ainda deverá demorar vários dias para o problema de abastecimento ser
resolvido - constatou Jonas de Paula, proprietário de um posto e de uma
distribuidora de combustível em Sinop, onde não chega nenhum nenhum
caminhão desde sábado passado.
No campo, o combustível também se fez sentir. Por falta de
óleo diesel, colheitadeiras de soja estão paradas em muitas fazendas.
Até o último domingo, o total colhido representava 35% da área plantada
de soja - 12 pontos percentuais a menos que o verificado no mesmo
período da safra passada. Também há risco de aves e suínos morrerem de
fome por falta de ração.
— O problema é muito grave. Se o bloqueio acabar agora,
ainda deve demorar ainda uns seis dias para chegarem novos carregamentos
de combustível. Até lá muita soja estará com avaria - lamentou o
presidente do Sindicato Rural de Sinop, Antônio Galvan.
No Pará, cerca de 50% dos caminhoneiros aderiram à
paralisação. Mas, segundo o presidente do Sindicato dos Transportadores
Rodoviários Autônomos de Bens no Estado do Pará (Sindicam-PA), Eurico
Tadeu Ribeiro, a ordem é não tumultuar em um estado onde 75% dos
produtos hortifruti são importados:
— Nossa orientação sindical é não fazer bloqueio de vias
para não prejudicar mais. Basta parar em algum posto com mínima
estrutura e conforto e não trabalhar, deixando o governo federal
resolver.
Nenhum comentário:
Postar um comentário