sábado, 24 de novembro de 2012

Ninguém deve esperar democracia na Rússia, diz economista russo
Benjamin Bidder - -Der Spiegel
A Rússia de Putin é tão estável hoje que é até mesmo capaz de resistir às forças das crises econômicas, sustenta o economista russo Vladislav Inozemtsev, em entrevista à Spiegel Online. Ele argumenta que o Ocidente deve abrir mão de suas esperanças por democracia e modernização no país e em vez disso se concentrar nas relações comerciais.
Spiegel Online - Um debate enfurecido está se travando atualmente na Alemanha sobre como Berlim deve lidar com Moscou. Alguns exigem duras críticas contra Putin, enquanto outros alertam que isso pode pesar sobre as relações comerciais. Qual é a abordagem correta?
Inozemtsev - A crítica de fora não terá nenhum efeito. Você pode esquecer a Rússia como uma democracia durante os próximos cinco a dez anos. Não se pode esperar um grande avanço na modernização do país. A Alemanha deve se concentrar em seus interesses econômicos.
Spiegel Online - Então que esqueçam as esperanças de democratização e em vez disso que se concentrem nos negócios como sempre?
Inozemtsev - Sim. O atual sistema político e econômico da Rússia é estável. Entre agora e 2018 é improvável que haja uma reviravolta. A economia continuará crescendo até o fim do mandato de Putin em cerca de 2% a 3% ao ano. E a maioria da população continuará contente porque nunca viveu com tanta normalidade quanto agora. O sistema não está mostrando sinais de desintegração.
Spiegel Online - Em que você baseia essas conclusões?
Inozemtsev - A Rússia até que fez um bom trabalho em superar a crise financeira global. Aqueles que esperam que Putin em breve caia através de algum tipo de crise econômica estão enganando a si mesmos. O sistema econômico é robusto e flexível.
Spiegel Online - O Kremlin aprovou recentemente novas leis sobre traição e o direito de manifestação, e vários líderes da oposição estão ameaçados com longas penas de prisão. Será que isso não fomentará a raiva contra Vladimir Putin?
Inozemtsev - Na essência, a Rússia é um país livre. Para as pessoas normais, as limitações à liberdade são mínimas – elas podem viajar e se informar como quiserem. Mas é outro fator que será decisivo: pouquíssimos russos têm a ideia de se organizar coletivamente a fim de resolver os problemas sociais. Em vez de fundar uma organização contra a repressão da polícia, a maioria simplesmente prefere oferecer propina à polícia de trânsito. Esta solução simples e individual existe para todos os problemas. A corrupção funciona apenas como uma válvula. E se o Kremlin agora está endurecendo com a oposição, o significado é exatamente este: cidadãos, não tentem resolver seus problemas coletivamente. Caso contrário, vocês terão problemas.
Spiegel Online - Então você descarta a possibilidade do tipo de protestos em massa que aconteceram no final da União Soviética?
Inozemtsev - Muitos odiavam a União Soviética – ela restringia e prejudicava as pessoas. Aqueles que se rebelavam eram ameaçados com a expulsão para a Sibéria. Os que se cansam das coisas hoje simplesmente compram uma passagem para Londres, e ninguém os impede.
Spiegel Online - Você foi o organizador do Fórum de Políticas Globais Yaroslavl, iniciado por Dmitry Medvedev. O ex-presidente russo queria modernizar a Rússia. Ele foi bem sucedido de alguma forma?
Inozemtsev - Não. O progresso e a modernização surgem de esforços para se tornar mais eficiente. Isso contradiz toda a lógica da economia russa. A fim de gerar um dólar de produção econômica, a Rússia consome muitas vezes mais energia do que a Alemanha para fazer o mesmo. Bens produzidos na Rússia estão cada vez mais caros, mas não estão melhorando. Tomemos o exemplo da metralhadora Kalashnikov (AK-47): o produto é o mesmo que há 20 anos atrás, mas custa 10 vezes mais hoje. Ou a construção de estradas russa: os gastos estão sempre subindo, mas não o número de estradas que foram construídas.
Spiegel Online - O que está causando isso?
Inozemtsev - Ninguém tem interesse em eficiência. Basta observar a Gazprom: a empresa nunca tentará aumentar sua eficiência – ela simplesmente continuará aumentando os preços. Um esforço sério de modernização exigiria que a elite russa desse uma virada de 180 graus.
Spiegel Online - Ainda assim, a Rússia anunciou que vai desenvolver seu próprio sistema operacional para computador, e o chefe da empresa proprietária da Lada tem dito em entrevistas que a companhia já está "competindo diretamente com a Mercedes."
Inozemtsev - Em alguns setores, é preciso criar a ilusão de sucesso a fim de ter acesso a subsídios estatais. É um grande blefe de relações públicas. Funciona porque as pessoas nunca farão o esforço de verificar o que vem dos anúncios e promessas. Essa é a calamidade da Rússia.
Spiegel Online - O presidente Vladimir Putin disse que quer criar 25 milhões de empregos "modernos" durante os próximos 13 anos.
Inozemtsev - Putin tem um problema. Ele só vê o mundo pela lente do dinheiro. Ele acredita que a quantidade de dinheiro que distribui para os produtos industriais ou a educação deveria representar totalmente os resultados que são alcançados. Mas o dinheiro escorre pelas mãos. O Estado serve aos interesses de sua elite corrupta. Veja São Petersburgo. Se Putin quisesse seriamente modernizar a cidade, o novo estádio para o clube de futebol Zenit teria sido construído há muito tempo. Originalmente, 200 milhões de euros haviam sido planejados para isso, mas os custos inflaram para 1,1 bilhão de euros e o estádio está longe de ser concluído.
Spiegel Online - Mas por que Putin não seria capaz de alcançar o tipo de modernização vista na China ou Coréia do Sul?
Inozemtsev - O sucesso da modernização sempre surge de uma falta de outras alternativas. Esse foi o caso da Coréia do Sul depois da guerra com o norte, e da China após a Revolução Cultural devastadora, mas também do Brasil sob a ditadura militar. É também algo que está a um passo de um passado terrivelmente delicado. Aqueles que querem modernizar não podem dizer que as coisas estavam melhores antes. Mas na Rússia de hoje, há mais uma vez muita conversa sobre como as coisas eram boas durante a União Soviética.
Tradutor: Eloise De Vylder

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