Bolha eleitoral
Se
está cada vez mais difícil produzir, vender e obter lucro, na economia
brasileira, de onde viria essa animação toda dos pregões?
JOSÉ PAULO KUPFER - O Globo
O
mercado de ações brasileiro ficou perigoso para amadores. Movimentos
especulativos, a partir do resultado de pesquisas eleitorais,
tornaram-se corriqueiros e ampliaram a volatilidade dos pregões. Há
evidências de que pelo menos uma parte da “puxada” nas cotações não se
sustenta em bases técnicas.
De março para cá, o Ibovespa,
principal índice da bolsa brasileira, descolou-se de seus congêneres de
mercados emergentes. Nestes, no período, a alta, em dólar, foi de 15%,
metade da elevação observada no Brasil. Outro indicador da evolução dos
pregões, o índice MSCI (do banco de investimento global Morgan Stanley),
aponta na mesma direção. Partindo de uma base idêntica em janeiro deste
ano, o índice de emergentes subiu, até julho, pouco mais de 5%, ao
passo que o MSCI Brasil avançou quase 15%.
Com a economia real
despachando uma sucessão de números ruins, corroborando projeções de
crescimento abaixo de 1% em 2014, inflação no teto da meta e corda
esticada no setor externo, convenhamos que não é muito simples explicar
desempenho tão positivo. Se está cada vez mais difícil produzir, vender e
obter lucro, na economia brasileira, de onde viria essa animação toda
dos pregões?
O UBS, outro banco de investimento global, encontrou
a resposta na reação do mercado aos vaivéns das pesquisas eleitorais.
Comparando as altas recentes com as tendências históricas e a evolução
de mercados similares, o banco chegou à conclusão de que os ganhos do
Ibovespa estão quase metade acima daquele que poderia ser considerado
seu desempenho “normal”. Segundo o UBS, as razões para isso podem ser
localizadas na influência política derivada da marcha das pesquisas
eleitorais e do que delas é possível projetar sobre as chances de
vitória da oposição — que analistas financeiros avaliam variar, no
momento, entre 40% e 70%.
Estabeleceu-se, a partir da rejeição
pelo mercado da política econômica de Dilma e do modo como a presidente,
em busca da reeleição, conduz a economia, uma relação inversa entre
seus índices eleitorais e os dos ativos. Quando Dilma sobe, as ações
caem e o real desvaloriza. Quando cai, dá-se o inverso.
O
fenômeno também explicaria parte das altas dos papéis da Petrobras,
estatal presumivelmente mais exposta aos ruídos políticos, que chegaram a
superar 50%, em dólar, desde março, mesmo com todos os atuais problemas
enfrentados pela empresa. Nos cálculos do UBS, a parcela dessa alta
devida à expectativa de uma oposição eleitoralmente mais competitiva
responderia, dependendo do índice com o qual a comparação é feita, por
algo entre 20% a 40% do excedente sobre o desempenho “normal" da ação.
Não
é novidade que expectativas políticas influenciam mercados financeiros.
Os ativos sempre balançam sob o impacto de tensões e conflitos,
principalmente em regiões com abundância de recursos naturais
estratégicos. Também no Brasil pós-redemocratização, eleições têm
impactado os pregões. A lembrança recente mais forte remete ao segundo
semestre de 2002, quando a presunção de que Lula, se eleito naquele ano,
promoveria reformas antiliberais estressou o mercado e fez explodir a
cotação do dólar.
Esse tipo de situação, não tão incomum, reflete
uma anomalia, propícia à formação de bolhas e ao aumento das
instabilidades já naturais dos mercados financeiros. No fim da história,
ficou tão impossível prever o resultado das urnas, em outubro, quanto
saber, neste momento, o que acontecerá quando a bolha eleitoral
estourar.
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