terça-feira, 29 de julho de 2014

Destroços do MH17 também são os destroços da diplomacia
Der Spiegel
Getty Images/Arquivo
Putin insiste, continuamente, que não está por trás dos separatistas na Ucrânia Putin insiste, continuamente, que não está por trás dos separatistas na Ucrânia
O local da queda do voo 17 da Malaysia Airlines é um pesadelo, com pedaços de corpos ainda espalhados entre os girassóis. 298 foram assassinadas aqui enquanto todo o mundo testemunhou bandidos uniformizados pilhando os mortos e lhes roubando a dignidade no processo.
Aqui, na estepe do leste da Ucrânia, Vladimir Putin mostrou sua verdadeira face. Antes visto como um estadista, o presidente russo expôs a si mesmo como pária da comunidade internacional. Os mortos do MH17 também são dele; ele é parcialmente responsável pelo abate do voo. E, agora, chegou a hora de forçá-lo a recuar - com sanções econômicas severas.
Ninguém no Ocidente ainda nutre sérias dúvidas de que o avião foi abatido com um sistema de mísseis terra-ar Buk - um sistema quase certamente fornecido pela Rússia aos separatistas russos no leste da Ucrânia. Um líder separatista até mesmo reconheceu que eles possuíam esse sistema - e a evidência é substancial.
Pode ser que o abate do MH17 possa ter sido um erro trágico. O combatente que lançou o míssil provavelmente não tinha intenção de abater um voo comercial. Mesmo assim, o incidente é a consequência direta das semanas recentes que a Rússia passou armando os separatistas. É um símbolo da depravação de Putin - e do fracasso da política do Ocidente até o momento. Os destroços do MH17 são também os destroços da diplomacia.
Apesar de o Ocidente ter imposto, inicialmente, sanções brandas e exigido uma política para redução da escalada, Putin repetidamente promoveu a escalada do conflito, ao mesmo tempo proclamando de forma veemente sua irrepreensibilidade. Ele insistiu continuamente que não estava por trás dos separatistas. Essa teia de mentiras, propaganda e logro agora foi exposta.
Dissuasão
Os laços entre Putin e os separatistas não são difíceis de ver. Apesar de poder não ser possível controlar totalmente os homens no leste da Ucrânia - um problema enfrentado por todos aqueles que promovem guerras por procuração -, Putin os armou e ele pode coibir suas atividades. Todas as exigências para que ele o faça foram, até agora, ignoradas. Mesmo após o assassinato de 298 civis inocentes, não há uma palavra de contrição ou dissociação de Putin.
A Europa não pode continuar como antes. O acordo entre os 28 países membros da União Europeia para impor sanções severas contra a Rússia foi a medida acertada. Entre as medidas propostas está um boicote aos bancos russos, assim como uma proibição à exportação de armas e tecnologia de energia. Agora é crucial que os países membros da UE (União Europeia) de fato aprovem, nesta semana, todas as medidas para botar a economia russa em dificuldades e, caso seja necessário, ampliá-las.
Exigir medidas duras para forçar a Rússia a recuar não equivale a fomentar a guerra. O único que fomentou a guerra na Ucrânia sem restrição e que, desde a anexação da península da Crimeia, insiste em jogar com a paz na Europa é o presidente da Rússia. É imperativo que os europeus esgotem todos os meios não militares de pressionar Moscou. A meta é dissuasão, não escalada, e para que isso funcione, as medidas precisam ser críveis.
Para obter dissuasão, é imperativo que a Europa aja unida e renuncie ao egoísmo nacional. Enquanto a França continuar insistindo em fornecer navios de guerra aos russos e os britânicos continuarem cobiçando os lucros obtidos com os oligarcas russos, a UE será incapaz de impressionar Putin. O governo e os líderes empresariais da Alemanha merecem elogios por sua disposição de apoiar penas severas –apesar de certamente prejudicarem as exportações alemãs.
A Europa pode absorver as consequências dessas sanções. A Rússia não pode. Ela é economicamente vulnerável e precisa do investimento e tecnologia do Ocidente, particularmente no setor de energia.
Ainda assim, não há garantia de que as sanções terão rapidamente o efeito desejado. A reação inicial de Putin pode muito bem ser de agressão, a imposição de contramedidas. Mas as chances são de que ele ceda no final. Seu domínio tem dependido, até o momento, da manutenção da elite quieta, assegurando que ela possa continuar enriquecendo. Ele provavelmente não resistiria caso os empresários, oligarcas e liberais russos exercessem pressão significativa. Além disso, uma desvalorização adicional do rublo prejudicaria a população em geral, que tem apoiado Putin até agora.
A Europa - e os alemães - certamente pagará um preço pelas sanções. Mas o preço será incomparavelmente maior caso seja permitido que Putin continue violando a lei internacional. A paz e a segurança na Europa estariam então em sério risco.

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