terça-feira, 31 de março de 2015

Liga Árabe acusa Irã de apoiar milicia xiita houthi no Iêmen
Hélène Sallon - Le Monde
Reuters
Ministros sauditas são informados sobre as operações militares no Iêmen Ministros sauditas são informados sobre as operações militares no Iêmen
O projeto de uma força militar conjunta, tantas vezes engavetado devido a divergências entre países árabes, poderá finalmente vir à luz. À beira do Mar Vermelho, em Sharm el-Sheikh, os 21 dirigentes da Liga Árabe -- com ausência da Síria, que foi suspensa -- entraram em um acordo, no domingo (29), sobre sua criação. O secretário-geral da Liga, Nabil al-Arabi, recebeu bem esse "desenvolvimento histórico" e diz esperar que "os procedimentos andem rápido para concretizar esse projeto". Os chefes do Estado se deram um mês para estabelecer a composição, os termos de funcionamento e os objetivos dessa força regional, que será encarregada de conduzir "intervenções militares rápidas".
Há vários meses o presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sissi, vem insistindo na necessidade de uma força regional para "enfrentar as ameaças sem precedentes para a identidade árabe" que são os "grupos terroristas". No entanto, não foi tanto a expansão da organização Estado Islâmico no Iraque e na Síria, ou até na Líbia, na Tunísia e no Iêmen, que criou a união em torno desse projeto, mas mais o temor de ver o rival iraniano xiita estendendo sua influência por toda a região e sobretudo no Iêmen. As potências árabes sunitas, apoiadas pelos governos da França e dos Estados Unidos, acusam o governo iraniano de apoiar a milicia xiita houthi, que expulsou o presidente Abd Rabo Mansur Hadi da capital do Iêmen em janeiro, e depois de Aden, no sul do país, no final de março.

Operação "Tempestade Decisiva"

A operação "Tempestade Decisiva", lançada na quinta-feira (26) no Iêmen por uma coalizão de nove países árabes e do Paquistão, todos alinhados atrás da bandeira da Arábia Saudita, valerá como um "teste" para essa força conjunta. O Egito, que se apressou para enviar sua força aérea e marinha em apoio ao padrinho saudita e para propor o envio de tropas em solo, entendeu bem isso. A operação também permitirá selar publicamente a reconciliação, até então lenta, com o Qatar, padrinho da Irmandade Muçulmana desprezada pelo governo egípcio, simbolizada pelos abraços calorosos entre o presidente Sissi e o xeque Tamim Ben Hamad al-Thani, em Sharm el-Sheikh.
Para além das rivalidades interárabes que possam ainda adiar sua criação, essa força regional pode indispor certos países da Liga Árabe, mais próximos do Irã. O ministro das Relações Exteriores iraquiano, Ibrahim al-Jaafari, exprimiu as "reservas" de seu país, apontando para a falta de estudos preliminares para esse projeto. Teerã é um parceiro privilegiado das autoridades xiitas de Bagdá.
O presidente iemenita, que sem querer foi o orquestrador dessa nova união, esteve ao lado do rei Salman da Arábia Saudita, no sábado (28). Antes de tomar o avião de volta para Riad, onde ele deverá permanecer até que a situação lhe permita voltar para o Iêmen, Hadi fez um apelo, aclamado por seus pares, pela continuidade da campanha até a "rendição" dos houthis, chamados de "fantoches do Irã".

"Vocês são preguiçosos, perdedores"

Os líderes houthis zombaram dessa união em torno do presidente Hadi. "Nós sabíamos desde o primeiro dia que estávamos enfrentando regimes aliados, agentes ou joguetes de potências estrangeiras", comentou Ali al-Emad, porta-voz do braço político do movimento houthi, Ansar Allah, que nega ter qualquer aliança com o Irã. "O Iêmen vai provar para o mundo que o fraco triunfará no final".
O Irã e seus aliados também criticaram as "mentiras" sobre a ameaça de uma vontade hegemônica do Teerã, para justificar a intervenção. Na sexta-feira (27), o líder do Hezbollah libanês, Hassan Nasrallah, zombou da política externa saudita, explicando que a influência iraniana havia aumentado na região: "Vocês são preguiçosos, perdedores e não assumem suas responsabilidades". O confronto entre as potências sunitas e seus adversários xiitas em território iemenita ameaça desestabilizar ainda mais o Oriente Médio. Os apelos do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, feitos no sábado, por uma solução "pacífica" da crise no Iêmen, não tiveram respaldo, assim como o apelo do ex-ditador Ali Abdallah Saleh, aliado dos houthis, por novas eleições, às quais nem ele nem parentes seus se candidatariam, como ele prometeu. Longe de estar convencido, o presidente Hadi demitiu seu filho, Ahmed, do posto de embaixador que ele ocupava nos Emirados Árabes Unidos.

"Atos terroristas"

Oficiais diplomáticos das monarquias do Golfo afirmaram que a campanha militar poderia durar até seis meses, sem considerar o envio de tropas em solo até esse momento. Ela "está concentrada em alvos militares", afirmou um deles, explicando que 21 dos 300 mísseis Scud nas mãos de unidades militares que permaneceram leais ao ex-presidente Saleh foram destruídos. Foram detectadas movimentações de mísseis em janeiro, na direção do norte e da fronteira saudita. A operação também visa "garantir que nenhum apoio iraquiano se estenderá ao Iêmen", ele disse, afirmando que "5.000 iranianos [membros] do Hezbollah e milicianos iraquianos [pró-Teerã] estavam em campo".
Os diplomatas dos países do Golfo disseram que estavam esperando por represálias. "Os iranianos responderão através de atos terroristas no Golfo", afirmou um oficial citando entre outros o Bahrein, cuja população é majoritariamente xiita, a província oriental da Arábia Saudita onde se concentra a minoria xiita do reino e talvez "capitais" do Golfo. Um porta-voz da coalizão afirmou que houthis estavam avançando na direção da fronteira saudita, onde o exército reforçou suas posições.

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