sábado, 28 de março de 2015

Medo de corte salarial faz piloto não se afastar
RICARDO GALLO DE SÃO PAULO - FSP 
O fator econômico dificulta que um piloto doente se assuma como tal diante da empresa aérea. Isso porque a maior parte do salário dos pilotos vem da quantidade de horas voadas --afastado, ele receberá menos por mês.
A regra vale para as companhias brasileiras e americanas e, ao menos, para a maioria das empresas de baixo custo europeias, entre elas a Germanwings.
Ou seja: um profissional dizer que está doente e que precisa se tratar tem impacto direto nas finanças dele. Não está claro se foi isso o que aconteceu com Andreas Lubitz, 27, copiloto do Airbus A320 da empresa alemã.
No Brasil, o corte quando há afastamento por doença beira 75%. Um comandante de voos domésticos aqui, por exemplo, vê o salário cair de R$ 15 mil para R$ 4.000.
Como plano B, há pilotos que pagam seguro privado para compor a renda enquanto não voltam a trabalhar.
"Os pilotos não vão admitir que estão com depressão. Tem piloto estressado? Tem piloto com depressão? Tem", diz um comandante brasileiro com mais de 30 anos de experiência, hoje na Gol.
Existe ainda outro fator que atrapalha a detecção de pilotos com comportamento anormal: nenhum piloto delata deliberadamente um colega à chefia, por medo de ser malvisto entre os pares se o outro for afastado de voo, diz um ex-diretor de empresa aérea, acostumado a gerenciar equipes de pilotos.
AJUDA
As empresas aéreas poderiam ajudar a detectar tripulantes com problemas emocionais. Mas os exames psicológicos são obrigatórios em apenas dois momentos: ao tirar a carteira de piloto e ao entrar na companhia. É assim na maior parte do mundo.
Embora haja exames médicos periódicos, um piloto com muitos anos de casa, por exemplo, só é avaliado por um psicólogo se o comportamento chamar muito a atenção da empresa.
"Alguma avaliação psicológica sempre é feita numa entrevista médica. Alterações sutis ou iniciais podem passar despercebidas", diz Paulo Alves, médico aeroespacial e hoje diretor de uma empresa americana que dá suporte de saúde a empresas aéreas.
"Eu tenho certeza de que, depois do que aconteceu, as políticas do mundo serão aperfeiçoadas", afirma Marco Cantero, integrante da câmara técnica de medicina aeroespacial do CFM (Conselho Federal de Medicina).
"Hoje, parte do serviço médico nas empresas aéreas é reativo, e, sendo assim, depende de o sujeito vir falar. Certamente, haverá regulamentações para que o monitoramento seja preventivo e sistemático", diz Cantero.
A Oaci (Organização Internacional de Aviação Civil) ainda não se manifestou sobre possíveis alterações. Isso só deve ocorrer com a conclusão das investigações. 

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