sexta-feira, 29 de maio de 2015

Israel e as quatro verdades de Obama
Alain Frachon - Le Monde
Sebastian Scheiner/AP
Benjamin Netanyahu, premiê de Israel 
Benjamin Netanyahu, premiê de Israel
Seria por causa da aproximação do final de seu mandato ou, mais prosaicamente, da perspectiva de um acordo sobre a questão nuclear iraniana a ser submetida ao Congresso? Barack Obama, na semana passada, contou suas quatro verdades sobre Israel: seu profundo comprometimento com o Estado judaico e a indefectível relação estratégica entre EUA e Israel, a necessidade de um Estado palestino e a de criticar publicamente a política de Benjamin Netanyahu. Político e sofisticado, Obama puro.
Cristão batizado e praticante, Barack Hussein Obama, membro de uma igreja batista, filho de mãe protestante e pai muçulmano queniano que se tornou ateu, assombrou a direita republicana e parte da opinião pública israelense. "Muçulmano enrustido", "Anticristo", "norte-americano de mentira", o primeiro presidente negro dos Estados Unidos sofreu os julgamentos mais excêntricos. Sua política para o Oriente Médio, desde o conflito entre Israel e Palestina até a negociação com o Irã, foi alvo de repetidos ataques do lobby pró-Israel norte-americano, o Aipac.

Reação à altura

Durante sua administração, as relações políticas com Israel se deterioraram consideravelmente, e entre ele e o primeiro-ministro Netanyahu ficou um mau humor. O líder da direita israelense não hesitou em colocar o Congresso contra a Casa Branca, um fato sem precedentes. "Bibi" hoje se apoia em um Partido Republicano alinhado com as posições mais duras dos "falcões" israelenses. Intermediário entre os dois campos, o bilionário Sheldon Adelson, rei dos cassinos de Las Vegas e de Macau, tem financiado Netanyahu e a direita republicana. E ataca Obama: "Tudo que ele está fazendo pode levar à destruição do Estado de Israel." Só isso.
Obama retruca que entre ele, um negro norte-americano, e a história de Israel, a relação é específica, íntima, quase pessoal, baseada em uma comunidade de "valores". "Existe uma ligação direta entre o apoio concedido ao direito do povo judaico de dispor de uma pátria, que garanta sua segurança e o fim de suas perseguições, e o direito à igualdade civil que os afroamericanos conquistaram. Na minha cabeça, essas duas lutas estão ligadas", ele disse em uma entrevista concedida à publicação mensal "The Atlantic". Conduzida nos anos 1950-1960, a luta dos negros pela igualdade civil recebeu, do começo ao fim, o apoio ativo e infalível da comunidade judaica norte-americana.
Obama condena um certo discurso militante cujo antissionismo mal disfarça um antissemitismo puro e simples. Mas ele se recusa a se deixar intimidar pelo "Partido Republicano quando este define qualquer crítica ao governo de Netanyahu como sendo anti-Israel ou antissemita". Ele observa que as diferenças que ele tem com "Bibi" não o impediram de conquistar "70%" dos votos judaicos tanto em 2008 quanto em 2012. Os judeus norte-americanos representam menos de 2% do corpo eleitoral e, de forma geral, continuam sendo majoritariamente fiéis ao Partido Democrata.
O 44º presidente segue os passos de seus antecessores imediatos: "Entre Israel e os Estados Unidos, a relação de segurança é sagrada, imutável", ele jura. Mesmo seus adversários reconhecem que a cooperação militar e de inteligência entre os dois países nunca foi tão forte como agora, na era Obama. Ele só se sente mais livre para exprimir publicamente suas diferenças políticas com Netanyahu.
Quando o primeiro-ministro fala dos eleitores árabes israelenses como "hordas" que ameaçam o país, rejeita a possibilidade de um Estado palestino ou prossegue com sua política de colonização, "isso tem consequências" para a política externa norte-americana, na opinião de Obama. "É exatamente por sermos tão próximos de Israel que não podemos ficar sem dizer nada, pois isso tiraria toda a credibilidade do discurso emitido a partir deste gabinete, do Salão Oval."
Assim como o ex-premiê Yitzhak Rabin e boa parte da elite militar do país, Obama considera que a continuidade dos assentamentos na Cisjordânia ameaça o futuro de Israel. No entanto, as frouxas tentativas de sua administração de iniciar um diálogo entre Israel e Palestina fracassaram diante da recusa de Netanyahu de limitar a colonização, sem que Washington reagisse à altura. Ele desconfia de qualquer visão "ingênua, idealista ou utópica" e sabe como são estreitos os laços em questão. Ele reconhece que "os palestinos nem sempre são os parceiros mais fáceis" e entende que o atual ambiente do Oriente Médio, violento e caótico, não é nada propício e "tem amedrontado muitas famílias judaicas".

Um "bom acordo" com o Irã

Ele diz ainda que a isso se deve somar o que está acontecendo na Europa, "a emergência de um antissemitismo escancarado, (...) de uma retórica antissemita e anti-Israel (...), agora que a geração do Holocausto quase desapareceu". Mas permanece firme em sua posição: com todas as garantias de segurança dos Estados Unidos, é preciso ir na direção de um Estado palestino lado a lado com Israel.
Da mesma forma, acredita que o "antissemitismo" amplamente presente nas esferas do governo iraniano, sobretudo no líder Ali Khamenei, não impede que este tome "decisões racionais" quando se trata do futuro do regime --e, portanto, de assinar um acordo sobre o controle de seu programa nuclear. Também nesse caso o presidente norte-americano acredita serem "legítimos o ceticismo e a desconfiança" dos israelenses (e dos árabes). Ele só assinará um "bom acordo".
Afinal, ele explica, estão em jogo sua reputação, seu legado presidencial pessoal, o que ele deixará para a História. "Daqui a 20 anos, se Deus quiser, ainda estarei nesta terra. Se o Irã tiver então uma arma nuclear, em cima dela estará meu nome."

Nenhum comentário: