quinta-feira, 1 de novembro de 2012

O verdadeiro oponente de Angela Merkel
Katinka Barysch - Prospect 
Era 12 de setembro de 2012, 10 horas da manhã na Alemanha. Corretores de títulos em Londres e Frankfurt estão olhando para suas telas. Novamente, o destino da zona do euro parece estar por um fio. 
Na tranquila cidade de Karlsruhe, no oeste da Alemanha, oito juízes de toga vermelha sentam-se diante da mesa de madeira. Um deles lê cuidadosamente o texto preparado: “Em nome do povo...” ele começa, antes de explicar algo sobre o artigo 8, parágrafo 5, cláusula 1. 
As emissoras e jornais alemães estão prontos para traduzir o significado do mais recente veredicto. O Tribunal Constitucional Federal decidiu que o Mecanismo Europeu de Estabilidade, o fundo permanente de resgate da zona do euro, e o pacto fiscal que impõe disciplina não são, à primeira vista, incompatíveis com a Constituição alemã. Aqueles que pediam pelo bloqueio da ratificação desses elementos centrais do esforço de resgate do euro perderam o caso. A Europa dá um suspiro de alívio. O rendimento dos títulos cai. Os juízes se retiram para trabalhar no próximo veredicto complexo. 

Os alemães agora estão começando a se perguntar se esse reverenciado tribunal é um obstáculo aos esforços liderados pela chanceler Angela Merkel para montar o resgate ao euro. Mas desafiar o papel do tribunal também iria contra princípios profundamente arraigados. 
Os britânicos, que estão acostumados a primeiros-ministros tomando decisões rápidas e a um Parlamento que defende sua primazia, se perguntam por que um bando de juízes que não presta contas a ninguém detém tamanho poder. Mas os alemães veem seu Tribunal Constitucional mais como um corpo político do que legal. Ele é um dos cinco pilares sobre os quais se apoia a Constituição do pós-guerra, ao lado das duas câmaras do Parlamento, o governo e o (em grande parte sem poder) presidente federal. Os alemães dizem respeitar o tribunal mais do que qualquer outro corpo político e fazem bom uso disso. Eles pedem regularmente a Karlsruhe que decida sobre assuntos altamente sensíveis, que vão desde os níveis dos benefícios sociais até se soldados alemães podem ser enviados para zonas de guerra. 
Foi pedido ao Tribunal Constitucional que julgasse cada tratado da União Europeia desde os anos 70, assim como várias leis e diretrizes. Virtualmente cada passo dos esforços de resgate do euro desde 2010 passaram por Karlsruhe. 

07 de setembro de 2011: o tribunal aprova o primeiro resgate à Grécia e o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF), o antecessor do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MES). Mas alerta que nenhum governo alemão ou Parlamento pode criar obrigações em aberto, que podem incluir “eurobonds” (título de dívida conjuntos dos governos da zona do euro) ou uma união fiscal (algum poder compartilhado de impostos e gastos por todo o bloco monetário). Isso minaria a soberania fiscal e a democracia do país. 
28 de fevereiro de 2012: O tribunal declara inconstitucional o novo órgão de nove membros do Parlamento, visando acelerar o uso do FEEF.

19 de junho de 2012: O tribunal critica o governo por não informar os membros do Parlamento sobre suas negociações a respeito do MES. O Parlamento deve ter a oportunidade de influenciar as negociações. Diante da inclinação dos parlamentares de fazer uso político das crises, isso poderia complicar os esforços para salvar o euro. 
12 de setembro de 2012: O tribunal diz que o MES e o pacto fiscal podem seguir em frente, desde que a Alemanha consiga garantias legais inequívocas de que suas obrigações no MES não ultrapassem 190 bilhões de euros sem consentimento prévio e que os executivos do MES não possam ocultar informação. O teto de obrigações não deve ser um problema desde que o Banco Central Europeu possa intervir juntamente com o MES no resgate aos grandes devedores, como a Itália e a Espanha. Mas o tribunal já indicou que pode questionar se o BCE for autorizado a comprar títulos de países do euro em dificuldades. 
Alguns alemães –acertadamente, eu acho– estão ficando cheios das restrições que o tribunal continua impondo às políticas de Merkel. Eles acusam os juízes de usurparem a autoridade de líderes democraticamente eleitos ao mesmo tempo em que mantêm princípios antiquados, estatistas e eurocéticos. Políticos de todo o espectro pedem que uma nova Constituição pró-UE seja adotada por referendo. 
Mas esse não seria um caminho rápido para os eurobonds ou uma união fiscal. Elaborar uma nova Constituição levaria no mínimo um ano. O referendo subsequente poderia não ter o resultado desejado. Mesmo se uma nova Constituição permitisse os eurobonds, a maioria dos alemães e de seus líderes ainda os veria com ceticismo. E mesmo que a Alemanha decida que os eurobonds são uma boa ideia, holandeses, finlandeses ou austríacos poderiam discordar. 
Todavia, o debate alertou Karlsruhe a não interpretar a Constituição de modo tão rígido e a dar algum espaço de manobra para Merkel e seu governo. O veredicto de 12 de setembro sugere que o tribunal entendeu a mensagem.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
      

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