sábado, 28 de junho de 2014

EUA e Irã podem cooperar para salvar o Iraque de extremistas sunitas 
Apesar de décadas de hostilidade, Teerã e Washington devem fazer um esforço de cooperação
Mohammad Ali Shabani - TINYT
Para salvar o Iraque de extremistas sunitas, o Irã está mobilizando seus aliados no Iraque e promovendo a colaboração entre o governo do Iraque e da Síria. Washington, por sua vez, enviou assessores militares para Bagdá. Esses esforços são corajosos. Mas, sem coordenação, não serão frutíferos.
O Iraque, até recentemente, era um campo de batalha entre o Irã e os Estados Unidos. Uma série de comandantes militares norte-americanos competiu por influência com o general Qassim Suleimani, chefe de operações exteriores da Guarda Revolucionária Islâmica do Irã. No auge da ocupação americana, meia dúzia de iranianos no Iraque exerciam mais poder do que os 150 mil soldados norte-americanos no país.
Apesar de seu passado de desavenças, os dois países agora podem salvar o Iraque, se agirem em conjunto. A história tem mostrado que o Irã e os Estados Unidos são capazes de afastar o Iraque do abismo. A guerra civil que assolou o país de 2006 a 2008 oferece lições de como deter o atual derramamento de sangue.
Naquela época, o Irã era o único país que podia pressionar a Síria para bloquear o oleoduto jihadista sunita, enquanto segurava os esquadrões da morte xiitas empenhados em livrar a capital iraquiana de sunitas. E os Estados Unidos, como potência ocupante, foi capaz de se aproximar e cooptar tribos sunitas rebeldes. Sem coordenação, estes esforços teriam falhado.
O chefe do Conselho Islâmico Supremo do Iraque na época, Abdul Aziz al-Hakim, e o presidente Jalal Talabani esforçaram-se para conseguir que Washington e Teerã a trabalhassem juntos. Apesar do colapso das negociações nucleares que então ocorriam entre o Irã e a União Europeia, os Estados Unidos e o Irã conseguiram cooperar.
O primeiro passo crucial para acabar com a violência foi o apoio tácito americano-iraniano a Nuri Kamal al-Maliki. Depois de se tornar primeiro-ministro, Maliki devolveu o favor. Dentro de um ano de sua inauguração, no verão de 2007, diplomatas iranianos e americanos reuniram-se em seu escritório –a primeira reunião de alto nível entre os dois adversários em quase 30 anos.
Hakim e Talabani não estão mais no cenário político. Mas Maliki sim. Apesar de suas tendências autoritárias e de sua incapacidade de integrar os sunitas no processo político, ele continua a ser o político iraquiano menos impopular hoje. Seu sucesso na eleição 30 de abril é prova disso.
Além disso, tanto o Irã quanto os Estados Unidos ainda concordam em manter Maliki no poder – em grande parte por falta de opção melhor. Apesar dos rumores no Congresso, o secretário de Defesa Chuck Hagel afirmou que "a possibilidade de renúncia de Maliki é um assunto interno iraquiano". E o presidente Obama não hesitou em enviar seus militares de volta para o Iraque.
O resultado da ofensiva sunita é previsível. O EIIL (sigla em inglês para Estado Islâmico do Iraque e do Levante) será incapaz de manter e governar o território capturado porque os iraquianos sunitas não estão de acordo com as visões de Estado e sociedade defendidas pelo EIIL. Prova disso é o sucesso anterior dos EUA em levar alguns sunitas iraquianos a se voltarem contra os militantes extremistas, e Maliki sabe disso. Embora a integração política sunita seja crucial, a violência não deve ser recompensada com concessões. O EIIL e seus aliados devem ser repelidos dos grandes centros urbanos e dos postos de fronteira antes de qualquer negociação com militantes pragmáticos.
Os sunitas do Iraque devem aceitar a realidade da nova ordem política do país, que é dominado por xiitas e curdos, ou condenarem-se à instabilidade e à violência perene causada por extremistas internos e estrangeiros que se uniram aos militantes locais.
Os curdos também enfrentam escolhas difíceis. Durante anos eles viveram na zona cinzenta entre a independência e o federalismo. Os Estados Unidos e o Irã devem convencer os líderes curdos que qualquer uso da atual turbulência para obter concessões de Bagdá em questões como exportações independentes de petróleo e o futuro da cidade disputada de Kirkuk vai sair pela culatra. Washington está relutando em tomar partido entre Erbil e Bagdá. Se isso acontecer, contudo, é improvável que vá antagonizar Maliki. Nem tampouco Teerã.
O Irã e os EUA também devem administrar os fatores externos. A Arábia Saudita há muito parecia ter pouca disposição de aceitar a nova realidade do Iraque. Mas o reino pode se flexibilizar quando a intransigência parecer autodestrutiva. Washington deve transmitir aos sauditas que o fogo do extremismo, inevitavelmente, entrará no coração da Península Arábica, a menos que sejam tomadas medidas que detenham o apoio à militância. De fato, os EUA hoje podem realmente compartilhar o interesse do Irã em ver outro grande inimigo do EIIL, o regime sírio de Bashar al-Assad, perseguir os extremistas sunitas. Os aviões de guerra de Assad agora estão bombardeando os militantes na fronteira com o Iraque, o que não estavam fazendo na semana passada.
O Irã e os Estados Unidos também devem procurar rachar o EIIL. Se o grupo for confrontado apenas no Iraque, vai retirar-se para a Síria para voltar noutro dia. Os Estados Unidos não podem e não devem agir como força aérea do Iraque. Mas os militares americanos e suas capacidades tecnológicas –na forma de vendas de drones, helicópteros e aviões de combate – devem ser combinados com a inteligência iraniana e síria para impedir a circulação de extremistas.
Finalmente, o Irã e os Estados Unidos devem aumentar a força do Exército iraquiano e impedir o surgimento de milícias. Maliki afirma que os milhares de voluntários que se inscreveram para combater o EIIL serão o núcleo do próximo exército iraquiano, mas ele precisa de bastante ajuda política, militar e de inteligência dos Estados Unidos e do Irã para que não tenha que depender de forças heterogêneas. Se essas forças se afastarem do exército em direção às milícias, os resultados serão imprevisíveis e profundos.
Apesar de suas diferenças, tanto Teerã quanto Washington precisam de um Iraque estável. Se não for pelo bem dos iraquianos, eles devem cooperar para o bem de seus próprios interesses.

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