terça-feira, 29 de julho de 2014

Kerry enfrenta dificuldades até para obter trégua em Gaza
Michael R. Gordon - NYT
Charles Dharapa/Reuters/Arquivo
Kerry (à direita) - na foto com o vice-chefe da missão da embaixada norte-americana em Israel, Bill Grant - não tem conseguido a atenção dos israelenses Kerry (à direita) - na foto com o vice-chefe da missão da embaixada norte-americana em Israel, Bill Grant - não tem conseguido a atenção dos israelenses
Depois do fracasso em fechar um acordo para acabar com a guerra em Gaza na semana passada, o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, está tentando salvar o plano B: uma sucessão de tréguas temporárias que abram as portas para negociações entre israelenses e palestinos em busca de uma solução de longo prazo. No domingo (27/7), no entanto, Kerry estava tendo dificuldades para obter até isso, apesar de um telefonema em que o presidente Barack Obama, em um sinal de impaciência crescente, instou o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, a adotar um "cessar-fogo humanitário imediato e incondicional", enquanto os dois lados buscam um acordo mais duradouro.
Parte da razão pela qual o esforço diplomático tem enfrentado tanta dificuldade são as mudanças profundas dos dois lados desde o último cessar-fogo de Gaza, em 2012. Tanto Israel quanto o Hamas parecem estar mais entrincheirados desta vez, e as autoridades israelenses estão fazendo pouco do esforço de Kerry para promover um cessar-fogo de uma semana, algo incomum no tratamento israelense ao secretário de Estado dos Estados Unidos.
29.jul.2014 - Bombardeio ilumina o céu sobre a faixa de Gaza Khalil Hamra/AP
O Hamas espera que as negociações abram as principais passagens de fronteira e flexibilizem o embargo, depois do fracasso em obter os benefícios que antecipara após o cessar-fogo de dois anos atrás. Israel, que encontrou uma rede de túneis do Hamas maior do que esperava e foi atingido por mísseis de maior alcance do que antes, está determinado a não parar até neutralizar grande parte da ameaça.
O desafio de conciliar o - aparentemente - irreconciliável é ainda mais difícil porque nenhuma parte está em posição de mediar diretamente as conversas entre o Hamas e Israel. Os Estados Unidos não lidam diretamente com o Hamas. E os países com os laços mais próximos ao grupo, Qatar e Turquia, têm relações tensas com o Egito, cujo plano de cessar-fogo forneceu a estrutura geral para os esforços de Kerry.
Desafios
Robert Danin, pesquisador do Conselho de Relações Exteriores e ex-funcionário do Departamento de Estado, disse que, embora fosse prematuro descartar os esforços de Kerry para conseguir um cessar-fogo, os desafios são enormes. "Não há nada que sugira que cada lado está particularmente desesperado por um cessar-fogo", disse ele. "Nenhum dos lados acredita que um cessar-fogo será o fim do conflito; eles estão buscando uma trégua como forma de se posicionarem para a próxima rodada de combates".
Em 21 de julho, Obama declarou que havia uma janela para um cessar-fogo porque a "infraestrutura terrorista em Gaza" tinha sofrido "danos significativos". Mas essa avaliação não era totalmente compartilhada pelas forças armadas israelenses.
Após cinco dias de maratona diplomática no Egito e em Israel, Kerry apresentou a Netanyahu um projeto confidencial chamado "Estrutura para um cessar-fogo humanitário em Gaza".
Uma versão do documento, apresentada na sexta-feira, afirma que haveria um cessar-fogo de sete dias a partir de domingo. Dois dias depois, as negociações começariam no Cairo entre Israel e os palestinos visando uma "solução duradoura" para a crise em Gaza, uma frase que o Hamas poderia ler como a suspensão do embargo econômico e que Netanyahu poderia interpretar como a neutralização da ameaça militar do grupo contra Israel.
Kerry e sua equipe consideraram que o documento continha uma linguagem basicamente aceitável para Israel porque as partes sobre os postos de fronteira e segurança eram similares às do cessar-fogo de novembro de 2012 e a proposta egípcia deste mês.
Mas, em vez de tratarem a proposta como um projeto a ser comentado, os israelenses parecem tê-lo considerado tendencioso em prol do Hamas, que não fazia o suficiente para lidar com a ameaça à segurança de Israel, segundo as autoridades norte-americanas. Os principais elementos do plano vazaram para a imprensa israelense e desde então houve uma série de críticas a Kerry por políticos israelenses, tanto da esquerda quanto da direita.
Embora as autoridades americanas tenham insistido em dizer que coordenaram suas iniciativas diplomáticas com Israel, Barak Ravid, correspondente do jornal "Haaretz", escreveu que o projeto de Kerry "chocou" os ministros israelenses porque "colocou Israel e o Hamas no mesmo nível".
Em entrevista coletiva na sexta-feira à noite no Cairo, Kerry, frustrado, insistiu que o documento nunca foi pensado como uma "proposta formal" e descreveu o vazamento como "malicioso".
Paris
Sem a pausa de sete dias na mão, Israel e Hamas concordaram com uma trégua de 12 horas, e Kerry correu para Paris. Lá, ele se reuniu com os ministros de relações exteriores europeus para obter apoio para um cessar-fogo e realizou uma reunião com seus colegas do Qatar e da Turquia, que estavam operando como negociadores para o Hamas. As fotos do encontro de Kerry com os ministros de relações exteriores do Qatar e da Turquia não ajudou a aliviar as preocupações de Israel, mas as autoridades norte-americanas dizem que as discussões eram necessárias para tentar trazer o Hamas a bordo.
No sábado, novamente Kerry pressionou pela extensão do cessar-fogo de 12 horas. Ele calculou que poderia haver uma forma de os israelenses e palestinos começarem a negociar uma solução de longo prazo após períodos temporários de suficiente de calma.
O lado israelense anunciou inicialmente um cessar-fogo de quatro horas para que a trégua anterior de 12 horas não terminasse antes que o governo israelense pudesse deliberar sobre a possibilidade de estendê-la por mais um dia, como acabou fazendo.
Algumas autoridades norte-americanas acreditam que o Hamas considerou a notícia do cessar-fogo de quatro horas como um sinal de má-fé, pois não era a trégua de um dia que estava sendo discutida. Isso, e talvez diferenças entre os combatentes em Gaza e Khaled Meshaal, líder político do Hamas que mora no Qatar, levou o Hamas a abrir fogo, o que levou Israel a responder na mesma moeda. Por meio do Qatar, Kerry finalmente conseguiu que o Hamas anunciasse no domingo seu cessar-fogo de 24 horas. Mas a desconfiança entre o Hamas e Israel pareceu mais profunda do que nunca.
Enquanto os críticos se queixavam de que Kerry estava em uma missão esdrúxula - tentando salvar até mesmo uma trégua em Gaza depois de falhar em um esforço prolongado para chegar a um acordo de paz mais profunda que estabeleceria um Estado palestino - o secretário e sua equipe mantiveram-se firmes em seu plano. "Agora, há um caminho para estancar o sangramento", disse uma alta autoridade do Departamento de Estado.

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