sábado, 5 de julho de 2014

Murrieta: a cidade onde os imigrantes enfrentam uma parede humana
Jennifer Medina - NYT
Hayne Palmour/Xinhua
Manifestantes contra imigrantes da América Central pegou alguns moradores da cidade de Murrieta, na Califórnia, de surpresa. Os hispânicos são a maior parte da população do Estado Manifestantes contra imigrantes da América Central pegou alguns moradores da cidade de Murrieta, na Califórnia, de surpresa. Os hispânicos são a maior parte da população do Estado
Quando os três ônibus cheios de mães e filhos de imigrantes chegaram à cidade em um posto da Patrulha de Fronteira nesta semana, eles foram recebidos por manifestantes carregando bandeiras e cartazes proclamando "devolva ao remetente", enquanto gritavam "voltem para casa", e gritavam "Estados Unidos!". Temendo pela segurança dos imigrantes e agentes federais, o pessoal da imigração decidiu redirecionar os ônibus para San Diego, uma hora ao sul.
Um dia depois de comemorarem sua vitória temporária, mais de mil moradores lotaram um auditório da escola secundária na noite de quarta-feira (2) para uma reunião que durou mais de quatro horas, expressando temores com o afluxo de imigrantes.
"O que acontece quando chegarem aqui com doenças e invadirem nossas escolas? Quanto isso está nos custando?", perguntou ao prefeito a moradora Jodie Howard.
"Como vocês sabem que eles são realmente famílias e não algum tipo de gangue ou cartel de drogas?", outra pessoa perguntou aos agentes federais.
Depois de um agente da Patrulha de Fronteira explicar que mais ônibus provavelmente chegariam a Murrieta nas próximas semanas como parte de uma tentativa de aliviar os centros de processamento perto da fronteira com o Texas, um homem pegou o microfone e exigiu saber: "Por que têm que colocá-los em um ônibus para Murrieta? Por que não podemos apenas transportá-los para Tijuana?". A multidão respondeu com aplausos.
As autoridades federais começaram a distribuir pelas cidades do condado os 240 mil imigrantes e 52 mil menores não acompanhados que cruzaram ilegalmente a fronteira no Vale do Rio Grande nos últimos meses. Até agora, Murrieta foi o único lugar que conseguiu evitá-los.
As reações aos imigrantes têm sido mistas: as autoridades em Dallas disseram que vão acolher milhares de crianças migrantes e até ajudaram a coordenar as doações de moradores, mas os moradores da cidade de Artesia, no Estado do Novo México, expressaram frustração em uma reunião esta semana com os centros de detenção temporários na cidade. No entanto, eles não impediram a chegada dos ônibus.
Em nenhum lugar os imigrantes da América Central foram recebidos com tanta revolta quanto aqui, nesta comunidade de classe média conservadora a cerca de 150 km ao sudeste de Los Angeles.
"Nós não pedimos esse problema. (O problema) simplesmente foi despejado em nossa porta", disse o prefeito Alan Long, que morou na cidade quase a vida toda e que disse aos moradores que pretendia enviar "a conta" para o presidente Barack Obama. "Este é um problema em todo o país, e a pequena Murrieta assumiu a liderança", disse.
Uma geração atrás, Murrieta não era muito mais do que um posto rural, mas, na última década, a população explodiu para mais de 100.000 habitantes, com subúrbios sendo construídos em grandes trechos de mato. Na maior parte, os moradores foram atraídos pela promessa de uma vida mais calma e moradia mais barata do que nas cidades litorâneas, onde viviam.
As recentes tensões expuseram uma profunda divisão na cidade. Embora os latinos representem mais de 25% da população e terem aberto várias pequenas empresas com o crescimento da região, Murrieta não foi tão transformada pela imigração quanto tantas outras comunidades no sul da Califórnia.
O lema da cidade é: Murrieta "o futuro do sul da Califórnia". Sua música oficial, criada para o 21º aniversário da cidade, é chamada de "Gem of the Valley" (gema do vale), e se gaba de "ser um lugar seguro, onde podemos viver, rir, aprender e brincar". Muitos moradores dizem que vieram para cá para escapar dos problemas urbanos e da violência que agora temem que os imigrantes possam trazer.
Durante a reunião de quarta-feira (2), dezenas de moradores se queixaram do governo Obama pelo que viam como uma falha em proteger as fronteiras. E prometeram continuar a lutar, aparecendo nos postos de fronteira locais toda vez que um ônibus de imigrantes for chegar.
Dezenas de moradores pró-imigrantes vestindo camisas de futebol mexicanas também apareceram na reunião de quarta-feira (2), mas na maior parte permaneceram sentados em silêncio. Muitos outros esperaram do lado de fora, depois de terem chegado tarde demais para entrar no auditório, que lotou rapidamente. Eles seguravam cartazes proclamando: "Nós não somos ilegais, somos seres humanos", enquanto enfrentavam cartazes que diziam "Botem-nos em um ônibus para a Casa Branca."
Na Califórnia, onde os latinos são agora o maior grupo étnico e onde grande parte do sentimento contra os imigrantes da década de 1990 desapareceu, muitos moradores ficaram chocados com a reação dos vizinhos.
"Viemos aqui porque eles estão atacando o nosso povo, pessoas como nós", disse Ana Larios, 42, imigrante mexicana que se mudou de Los Angeles para Murrieta com os filhos há quase uma década. "Eu nunca soube que as pessoas se sentiam assim até agora. É chocante e vergonhoso", disse.
Na quarta-feira (2) à noite, a multidão vaiou as autoridades federais que participaram da longa reunião sem oferecer detalhes concretos sobre o que a cidade poderia esperar.
Paul A. Beeson, chefe de polícia de San Diego para Alfândega e Proteção de Fronteiras, disse que a agência ainda está esperando um avião do Texas a cada 72 horas, mas não sabe para onde os passageiros serão enviados para o processamento.
Depois, os imigrantes são entregues ao Departamento de Imigração e Alfândega e, provavelmente, liberados para encontrar parentes que já moram nos Estados Unidos e mais tarde devem se apresentar a um juizado de imigração.
"Eles serão liberados se tiverem uma mãe não criminosa. A maneira mais humana de lidar com isso é descobrir aonde estão indo e deixá-los lá", disse David Jennings, diretor do setor do Sul da Califórnia da agência de imigração.
Jeff Stone, presidente do Conselho de Supervisores do Condado de Riverside, disse ao público que estava preocupado com as doenças transmissíveis que os migrantes poderiam trazer, como coqueluche, gripe suína e tuberculose. Beeson disse que quatro crianças tinham sido enviadas para hospitais locais esta semana, duas com febre e duas com sarna.
"Obama precisa fiscalizar a fronteira e impedir esta exploração de mulheres e crianças traumatizadas para seu próprio ganho político", disse Stone à multidão. "Precisamos enviar uma mensagem à Guatemala para que as pessoas não venham para cá, porque se fizerem isso, serão enviadas de volta mais rapidamente do que vieram".
Long se ressente das acusações de racismo e disse à multidão que tanto sua mãe quanto sua esposa eram hispânicas. Ele pediu ao sogro de 86 anos que ficasse de pé e o elogiou por imigrar legalmente.
O prefeito prometeu notificar as pessoas quando soubesse da chegada de outro ônibus, talvez no dia 4 de julho. Alguns moradores pareciam certos de que seus planos para o Dia da Independência incluiriam um protesto no posto da Patrulha de Fronteira.
Tradutor: Deborah Weinberg

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