sábado, 5 de julho de 2014

China se afasta da Coreia do Norte e estreita laços com a do Sul
Macarena Vidal Liy - El País
O presidente chinês, Xi Jinping, e a chefe de Estado sul-coreana, Park Geun-hye, reiteraram nesta quinta-feira (3) sua oposição à presença de armas nucleares na península coreana, em uma mensagem calculada para Pyongyang, e expressaram sua intenção de concluir até o fim do ano as negociações de um acordo de livre comércio bilateral.
Os acordos salientam a boa sintonia atual entre Pequim e Seul, que contrasta com as tensões entre as duas capitais e Tóquio e com o distanciamento entre a China e a Coreia do Norte.
"Os dois líderes compartilhamos a opinião de que devemos conseguir a desnuclearização da Coreia do Norte sem possibilidade de fracasso, e nos opomos decididamente a qualquer teste nuclear", declarou Park em um comunicado conjunto, citado pela agência sul-coreana Yonhap. Por sua parte, Xi afirmou que os países envolvidos devem resolver a questão do programa nuclear norte-coreano mediante "o diálogo e a coordenação".
A visita de Estado de dois dias de Xi a Seul representa uma ofensa significativa para Pyongyang, aliado tradicional de Pequim na península coreana. Com esta viagem, Xi rompe o costume chinês de visitar a Coreia do Norte antes de ir ao vizinho do Sul. Kim Jong-un também ainda não recebeu convite para ir a Pequim desde sua ascensão ao poder, em 2011.
Entre outras coisas, a China viu com alarme o tratamento que Kim deu a seu tio, Jang Song-taek, executado um ano depois de ter visitado a China como enviado de Kim.
A Coreia do Norte deixou claro seu desacordo com essa visita. Durante esta semana, efetuou três lançamentos de mísseis de curto alcance e ameaça continuar.
Por outro lado, as relações entre Pequim e Seul atravessam um de seus melhores momentos. A China é o principal parceiro comercial sul-coreano e os intercâmbios entre os dois países superam 200 bilhões de euros anuais. É um número que aumentará com o tratado de livre comércio, cujas negociações começaram há dois anos.
Em seu encontro desta quinta-feira, os dois presidentes também assinaram um acordo para a criação de um mercado direto de câmbio das respectivas moedas, o renminbi chinês e o won coreano, em Seul.
Xi viaja acompanhado de uma ampla comitiva de empresários, entre os quais o presidente da empresa de comércio eletrônico Alibaba, Jack Ma, e o conselheiro delegado da telefônica Huawei, Ren Zhengfei.
O estreitamento de laços entre a China e a Coreia do Sul não se limita à área comercial. Xi e Park, que já se reuniram em cinco ocasiões, mantêm uma excelente relação pessoal, que inclui o envio de cartões de felicitações nos aniversários.
A visita do chefe de Estado chinês a Seul retribui a que a presidente sul-coreana fez a Pequim no ano passado. Park ganhou então numerosos elogios quando pronunciou em mandarim um terço de seu discurso em uma universidade local.
Os dois países também são unidos por suas aspirações diante do Japão, que esta semana modificou a interpretação de sua Constituição para permitir um papel mais ativo de suas forças armadas na região, iniciativa que causou tremendo mal-estar em Pequim e Seul.
É um mal-estar que Xi quer aproveitar para tentar uma maior aproximação política da Casa Azul, a sede do governo sul-coreano, e conseguir posicionamentos comuns diante de Tóquio, com quem Pequim mantém uma disputa cada vez mais acirrada sobre a soberania das ilhas Diaoyu (em japonês Senkaku) no mar da China Oriental.
Em um editorial no jornal sul-coreano "Chosun Ilbo", Xi Jinping referiu-se à reinterpretação da Constituição japonesa para afirmar que "qualquer tipo de ação que prejudique a situação geral de estabilidade regional encontrará nossa oposição". "Nenhuma nação sozinha se verá livre de dano em caso de instabilidade", acrescentou.
É difícil, porém, que a conservadora Park vá transformar o cortejo de Pequim em algo mais que um flerte. Por melhores que estejam suas relações com o gigante asiático, seu principal laço estratégico continua sendo com os EUA, que mantêm 26 mil soldados em território sul-coreano. E os EUA, que olham com atenção o desenvolvimento das relações entre Coreia do Sul e China, reprovará qualquer mudança que possa prejudicar Tóquio, seu grande aliado na região.
Segundo Scott A. Snyder, no blog Asia Unbound, do Conselho de Relações Exteriores dos EUA, "continua faltando um sentimento estratégico de propósito comum e de interesses compartilhados [entre China e Coreia do Sul]. Como resultado, embora uma relação China-Coreia do Sul mais intensa possa beneficiar os interesses mútuos em alguns casos, continua havendo limites claros ao desenvolvimento da relação política e estratégica entre os dois países".
Paradoxalmente, enquanto Pequim e Seul vivem um momento bom em suas relações, o Japão experimenta uma aproximação com Pyongyang. Na última quinta-feira (3), anunciou que levantará algumas das sanções que mantinha contra o país, em troca de que este investigue os casos de cidadãos nipônicos que foram sequestrados e transferidos para o "reino ermitão" nos anos 1970 e 80.

Japão atenua sanções a Pyongyang

O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, anunciou a suspensão de parte das sanções que impunha até agora ao regime norte-coreano, diante da disposição demonstrada por este de investigar os casos de cidadãos japoneses sequestrados e transferidos à força para a Coreia do Norte nos anos 1970 e 80, para ensinar o idioma e os costumes de seu país.
Em declarações à imprensa, Abe indicou que depois das conversas mantidas em Pequim entre os dois governos a Coreia do Norte demonstrou vontade suficiente de resolver esses sequestros, ao criar um órgão encarregado disso, que dependerá das autoridades mais graduadas do país. Portanto, "de acordo com o princípio de ação por ação, suspenderemos em parte as medidas impostas pelo Japão", declarou Abe.
Essas sanções, que não têm relação com as impostas pela comunidade internacional a Pyongyang por causa de seu programa nuclear, incluem o veto de viajar à Coreia do Norte e restrições ao dinheiro que era permitido enviar sem necessidade de informar ao governo japonês. Também será permitido que navios norte-coreanos atraquem em portos japoneses por motivos humanitários.
A Coreia do Norte reconheceu em 2002 o sequestro de 13 cidadãos japoneses, cinco dos quais retornaram ao Japão. Seis anos depois, comprometeu-se a reabrir as investigações sobre os demais casos e outros denunciados por Tóquio, embora nunca tenha chegado a fazê-lo.
Seul reagiu com indignação ao que considera um enfraquecimento do regime de sanções contra Pyongyang. Segundo seu Ministério das Relações Exteriores, "qualquer medida que o governo japonês adote sobre esse assunto, deve se enquadrar em limites que não ponham em perigo o quadro de cooperação internacional no que se refere ao programa nuclear e de mísseis norte-coreano".
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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