quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Análise: Dilma entendeu mesmo a mensagem? 
Depois dos protestos de junho de 2013, a líder do PT prometeu reformas
Luis Prados - El País
Pedro Ladeira/Folhapress
26.out.2014 - A presidente reeleita Dilma Rousseff comemora a reeleição com o ex-presidente Lula em Brasília 26.out.2014 - A presidente reeleita Dilma Rousseff comemora a reeleição com o ex-presidente Lula em Brasília
"Entendi a mensagem", afirmou Felipe González na noite de sua última vitória eleitoral em 1993. Os socialistas espanhóis haviam ganhado por pouco depois de uma campanha sobrecarregada por vários casos de corrupção e cujo principal argumento foi agitar o medo do retorno da direita. Mas o propósito de emenda não pôde evitar uma tendência negativa de desgaste e, três anos depois, o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol) perdia o governo em eleições antecipadas.
A vitória agônica e a reeleição de Dilma Rousseff no Brasil, guardadas as distâncias, apresenta semelhanças com aquela experiência. A líder do PT (Partido dos Trabalhadores) prometeu na noite de domingo ser "uma presidente melhor do que até agora". Isso depois de uma agressiva campanha baseada na divisão social e étnica – pobres contra ricos, negros contra brancos, centros urbanos contra zonas rurais, sul contra norte, esquerda contra direita –, salpicada de acusações de corrupção. Ganhou, com a imprescindível ajuda do carisma de Lula, por apenas 3 milhões de votos em um país com 146 milhões de cidadãos com direito a voto, dos quais 50 milhões votaram em seu adversário, o liberal Aécio Neves, do PSDB (Partido da Social-Democracia Brasileira).
Arte/UOL
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As eleições configuraram um Brasil dividido em dois, mas devemos destacar que a votação demonstrou a solidez da democracia brasileira e que, embora a presidente tenha de se esforçar para reconciliar os brasileiros, a polarização política atual é muito menor do que em outros países da região. A tradição de confronto também não existe na história do país nem no ânimo de seus cidadãos.Dilma terá que se pôr a trabalhar desde o dia de sua posse, em 1º de janeiro, em três frentes. Na política deverá enfrentar de uma vez por todas uma reforma consensual, da qual se fala há mais de 15 anos, que reduza o número de partidos parasitas no Congresso com suas corruptelas locais e disfunções de governo.
No exterior, terá que definir o papel do Brasil, restaurando a relação com os EUA, muito deteriorada depois das revelações de Snowden, e encontrando seu lugar na América Latina, entre um Mercosul estagnado e uma Aliança do Pacífico em plena decolagem, com mais pragmatismo que preconceitos ideológicos como até agora.
Mais dura ainda será a tarefa na economia. O Brasil está em recessão técnica e seu desafio é crescer sem gerar inflação, que hoje ultrapassa a meta oficial de 6%. Para tanto, segundo o consenso dos analistas, será preciso reduzir o intervencionismo do Estado em todas as áreas, que representa uma burocracia asfixiante e encarece custos.
Entre as medidas estão uma reforma trabalhista e das aposentadorias que elimine os excessos atuais; uma reforma fiscal que realmente justifique a pressão que suportam os brasileiros – perto de 36% da OCDE –, oferecendo serviços públicos de qualidade. Também é necessária uma revolução educacional, assim como atrair investimentos estrangeiros para desenvolver infraestrutura cuja ausência se transformou em um autêntico imposto ao desenvolvimento do país.
Essa agenda estava nas demandas das multidões que se manifestaram em junho de 2013. Então, Dilma disse ter entendido a mensagem e prometeu reformas, mas o que o público viu foi como se levantaram caríssimos estádios enquanto tudo continuava igual ou se construía o porto de Mariel em Cuba enquanto o grão apodrecida no de Santos.
Os eleitores deram a Dilma uma segunda oportunidade. Será a presidente capaz de encarnar a mudança da mudança? Terá entendido agora a mensagem? 
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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