Os dois têm razão
Nada mais definidora da homogeneidade moral
(lembrando Marcito Moreira Alves) dos antigos companheiros do governo
PT/PMDB do que a dança desavergonhada no plenário da Câmara do deputado
peemedebista Carlos Marun, festejando a superação da segunda denúncia
contra seu correligionário Michel Temer.
Equiparou-se o deputado
à desfaçatez de uma ex-colega sua, a então deputada petista Angela
Guadagnin, que em 2006 fez uns passos de samba no mesmo plenário, para
comemorar despudoradamente a absolvição do seu colega de partido João
Magno, que escapou de um processo de cassação por ter recebido dinheiro
de Marcos Valério no mensalão.
O nome das duas dancinhas é o
mesmo, “a dança da pizza”, como foi batizada a exibição vergonhosa de
Guadagnin que, em raro caso de punição popular pelo voto, não foi
reeleita. Espera-se que o seu companheiro de hipocrisia tenha o mesmo
destino em 2018.
Não foi apenas na dança no plenário, porém, que
os dois partidos se equipararam, a votação de quarta-feira foi pródiga
em revelar as contradições tanto de petistas e aliados quanto dos
peemedebistas e seus aliados. É fácil para os militantes petistas agora
atribuir ao PMDB os males de todos os pecados, como se antes o partido
de Temer tivesse tido outro comportamento político.
Fingem
esquecer os que hoje estão na oposição que Michel Temer só está na
presidência da República pela escolha formal do PT, que queria o apoio
do PMDB para garantir a governabilidade no Congresso. Na política
brasileira havia (ainda será assim depois de tanta lambança?) uma máxima
que dizia que o PMDB não tinha condições de chegar ao governo pelo
voto, mas nenhum governo poderia abrir mão de seu apoio no Congresso.
Até
o governo Dilma, o PMDB era um partido que compunha a maioria
legislativa de todos os governos, mas não tinha poder real, apenas poder
regional limitado. Tanto Fernando Henrique quanto Lula tiveram o bom
senso de acomodar as principais lideranças peemedebistas em seus
governos sem lhes dar poder real.
O PSDB escolheu o PFL, hoje
DEM, para dar o vice, o grande político pernambucano Marco Maciel. Lula
escolheu o mineiro José de Alencar, ambos leais aos presidentes e
afinados com seus programas de governo. Só com a escolha de Dilma
Rousseff para sucedê-lo Lula decidiu ampliar o poder do PMDB, com receio
de que a fraqueza política de seu poste impedisse o PT de governar.
Montou
uma coalizão parlamentar tão ampla quanto possível para tentar garantir
a governabilidade, e assim ampliou também o esquema de corrupção que
mantinha unida sua base parlamentar. Assim como os petistas se
arrependeram de terem escolhido Temer como vice de Dilma apenas depois
que o PMDB deixou de se contentar com o mero fisiologismo e passou a
querer o poder real, também os que apoiaram Temer na substituição de
Dilma o fizeram não por considerar que o PMDB fosse o partido ideal para
governar o país, mas simplesmente por ser isso o que a Constituição
brasileira determinava.
Não desse Dilma as razões concretas para
sofrer o impeachment, ele não aconteceria, já que a impopularidade não
derruba nenhum presidente. O então presidente Sarney é exemplo disso.
Mesmo impopular, conseguiu negociar seu mandato para cinco anos, abrindo
mão de um, e não foi ameaçado pelo impeachment, embora propostas nesse
sentido sempre surgissem, mas sem nenhuma possibilidade de efetivação.
A
partir daquela fatídica conversa entre o presidente e Joesley Batista,
porém, tudo mudou de figura. Os que ficaram ao lado do governo o fizeram
por conta de seus interesses pessoais, políticos ou fisiológicos, pois
já não tinham mais razão para manter o apoio a um governo legítimo, mas
claramente comprometido em sua integridade moral.
Na votação de
quarta-feira, petistas e aliados de esquerda acusavam o governo Temer
de corrupção baseados na denúncia do ex-Procurador-Geral da República
Rodrigo Janot, além de atribuir a seu governo as mazelas que recaem
sobre a Petrobras e outras estatais, como se nada tivessem a ver com
elas. Já os governistas de hoje acusavam o PT de ser o responsável pela
maior crise econômica que já se abateu sobre o país, com uma recessão
que já dura três anos, causando desemprego recorde.
Este é o caso clássico de os dois lados terem razão na maior parte das acusações.
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