sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Ucrânia restringe entrada e saída de moradores das áreas rebeldes
Rick Lyman e Andrew E. Kramer - NYT
Para Larisa Horlova, que é caixa de loja, fazer a viagem a partir do território controlado pelos rebeldes para a Ucrânia propriamente dita tornara-se uma rotina, apesar dos tiros que, por vezes, caíam nos campos perto da estrada enquanto dirigia. Ela fazia isso uma vez por semana para tirar dinheiro de sua conta bancária ucraniana, uma vez que os caixas eletrônicos não estão mais funcionando em Donetsk.
No entanto, na quarta-feira (28), quando ela se dirigiu ao posto na fronteira ucraniana pela neve derretida, ela não encontrou a segurança, e sim uma ordem para dar meia volta e voltar.
"Eles disseram que eu deveria morar no lado ucraniano, e que não posso ficar atravessando de um lado para o outro", disse Horlova, em pé no acostamento da estrada, em meio a uma multidão de outros moradores perplexos.
Na verdade, diante de uma nova ofensiva, as autoridades ucranianas agora estão fazendo o possível para interromper o movimento pela fronteira, empregando toda a força de uma burocracia bizantina sobre mais de 3 milhões de pessoas que vivem em áreas controladas pelos rebeldes.
Com a implementação de novas restrições na fronteira nos últimos dias por parte do governo da Ucrânia, que exige que as pessoas obtenham um passe especial que pode ser difícil, se não impossível, de obter, a política de isolar e frustrar as regiões controladas pelos rebeldes assumiu proporções maiores e enlouquecedoras.
O que se alega é que as medidas são necessárias para reduzir o contrabando e para impedir os "terroristas" e contrabandistas de entrarem na Ucrânia a partir da zona de conflito.
Mas é amplamente reconhecido que a política da Ucrânia de isolar zonas controladas pelos rebeldes visa transferir para a Rússia, que patrocina os separatistas, mas está atolada em seus próprios problemas econômicos, o fardo de subsidiar o leste, e assim desmascarar a alegação russa de propriedade deste cinturão industrial e acelerar um acordo.
O governo já havia cortado as pensões de todos os que vivem dentro da zona controlada pelos rebeldes, parando de pagar os salários dos funcionários públicos e aumentado drasticamente a inspeção de carregamentos que entram e saem da área, a tal ponto que os grupos humanitários têm se queixado de que isso está afetando remessas de socorro cruciais.
Como não há sistema bancário nas regiões rebeldes, é uma economia movimentada toda em dinheiro vivo. Mas sem caixas automáticos, não há nenhuma fonte de dinheiro, mesmo para aqueles que têm dinheiro em bancos ucranianos. Até a semana passada, as pessoas com acesso a transporte podiam se aventurar em áreas sob controle da Ucrânia, onde os bancos ainda estão operando. Algumas podiam até pedir suas pensões fora da zona controlada pelos rebeldes e recolher suas aposentadorias mensalmente.
Mas, com a implementação desses novos regulamentos da Ucrânia, isso ficou muito mais difícil. Agora, os moradores Donetsk precisam cruzar a área perigosa entre os postos dos rebeldes e dos ucranianos e entregar a papelada em um contêiner no posto de controle da Ucrânia --e depois esperar dez dias por uma resposta das autoridades do outro lado da fronteira.
Os moradores do lado ucraniano que desejarem entrar nas áreas rebeldes devem fazer um pedido em uma das delegacias remotas e depois esperar dez dias.
Até que se alcance uma decisão, os candidatos não têm permissão para atravessar os postos de controle ucranianos, disse Roman Turgovets, chefe do centro de imprensa para as operações anti-terroristas da Ucrânia. Se os candidatos tentarem contornar os postos de controle oficiais usando estradas secundárias, eles serão tratados como alvos potencialmente hostis, disse ele.
Enquanto isso, as pessoas que vêm tentando sair --ou entrar-- da zona de guerra sem autorização estão sendo forçadas a voltar.
Os soldados ucranianos deixam passar apenas alguns veículos. Filas de caminhões, ônibus de passageiros e carros se estendem ao longo da estrada, desde o posto de controle de Kurakhovo, por centenas de metros no acostamento, ao lado do restolho de inverno dos campos de girassol.
Ao longo da estrada, há fuzileiros inquietos em um posto ucraniano, onde um carro explodiu na segunda-feira, matando o motorista e pelo menos um soldado, no que uma rede de televisão ucraniana, Hromadske TV, disse ter sido um raro, talvez único exemplo de um ataque suicida no conflito.
Aqueles que vinham entregar seus documentos tinham que passar por uma cratera, peças de carros incendiados e sapatos e roupas com sangue espalhados pela estrada.
Na delegacia de polícia em Velikaya Novoselka, uma pequena aldeia no lado ucraniano da fronteira, centenas de pessoas faziam fila em um frio amargo na semana passada para solicitar um passe. Aqueles que atravessavam o pátio lotado e subiam as escadas até a delegacia conseguiam entregar os papéis necessários. Mas isso só lhes permitia fazer outra fila em um prédio próximo, onde eram chamados, um a um, para concluir o processo de aplicação.
Em uma pequena sala no segundo andar da delegacia, um grupo de policiais e funcionários trabalha cercado por pilhas altas de inscrições feitas à mão, pedidos desesperados de ajuda.
Um homem, Anton, de 28 anos de idade, proprietário de uma pequena empresa de frete cujos pais vivem em Donetsk e que não quis dar seu sobrenome por medo de prejudicar seu pedido, disse que, mesmo depois de navegar por esse labirinto burocrático, ele recebeu uma negativa por não ter razão suficiente para receber um passe.
Ele contou que a mulher que recebe as solicitações havia dito: "Você acha que é o único aqui nessa situação? Todos os dias, muitas pessoas vêm aqui, choram e imploram, dizendo que precisam do passe. Mas eu nego todos!"

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