quinta-feira, 30 de abril de 2015

Laboratórios atômicos dos EUA estão em corrida para conter o Irã
David E. Sanger e William J. Broad - NYT
Ebrahim Noroozi/AP
Iranianos celebram nas ruas o acordo do país com as potências sobre a energia nuclear Iranianos celebram nas ruas o acordo do país com as potências sobre a energia nuclear
Quando os diplomatas que participam das negociações com o Irã na Suíça atordoaram os cientistas do Departamento de Energia com perguntas técnicas difíceis – sobre como manter as usinas nucleares do Irã abertas mas garantindo que o país permaneça a um ano de construir uma bomba, por exemplo – os cientistas em alguns momentos recorreram a uma réplica secreta das instalações nucleares do Irã construída no meio da floresta no Tennessee.
Lá, dentro de uma fábrica reluzente na reserva nuclear de Oak Ridge, estão centrífugas gigantes – algumas entregues há mais de uma década pela Líbia, outras construídas desde então – que ajudaram os cientistas a elaborar as estimativas "mais razoáveis" sobre a capacidade real de o Irã construir uma arma em diferentes situações, segundo eles disseram ao presidente Barack Obama.
"Sabemos muito mais sobre centrífugas iranianas do que saberíamos de outra forma", disse um especialista nuclear sênior que conhece o local na floresta e suas operações sigilosas.
A réplica secreta é apenas uma parte de um extenso programa emergencial que envolve os nove laboratórios atômicos do país – entre eles, Oak Ridge, Los Alamos e Livermore – para impedir o progresso nuclear iraniano. Enquanto a próxima rodada de negociações começa quarta-feira (29) em Viena, a iniciativa secreta continua sendo uma obsessão tecnológica para milhares de funcionários dos laboratórios nucleares que vivem uma espécie de Projeto Manhattan às avessas. Em vez de construir uma bomba, como fizeram seus predecessores na corrida para terminar a Segunda Guerra Mundial, eles estão tentando impedir a construção de uma.
Ernest J. Moniz, cientista nuclear e secretário de energia que supervisiona os laboratórios atômicas, disse em uma entrevista que à medida que o governo Obama busca soluções técnicas nas negociações, os diplomatas estariam tropeçando no escuro "se não tivéssemos fomentado essa capacidade durante muitas décadas."
Embora Moniz não discuta a usina secreta em Oak Ridge, que tem equipamentos que datam da época do programa norte-americano e israelense para lançar ataques cibernéticos contra a usina iraniana de enriquecimento de Natanz, ele disse de forma mais genérica que os laboratórios atômicos oferecem aos Estados Unidos "a capacidade de seguir adiante" em uma nas iniciativas mais complexas de controle de armas da história.
Ele também mudou os laboratórios. Na época da fabricação de bombas, a maioria dos cientistas ficava em seus postos, dentro das instalações bem vigiadas. Mas qualquer um que tenha ido às negociações do Irã no último ano e meio em Vienna e Lausanne, Suíça, viu os especialistas do Departamento de Energia trabalhando duro durante as conversas e indo jantar depois de dias longos de negociação.
Foi durante um desses jantares em Viena, no verão passado, que vários especialistas começaram a se perguntar como poderiam encontrar uma forma de o Irã transformar a usina de enriquecimento subterrânea de Fordo, um local secreto exposto pelos Estados Unidos cinco anos atrás, em um centro de pesquisa, mantendo as aparências. Isso permitiria que o Irã dissesse que o local continua funcionando e os Estados Unidos poderiam declarar que ele não é mais uma ameaça.
"A questão era que tipo de experimentos é possível fazer nas profundezas do subsolo", lembrou um dos participantes no jantar. Na hora em que o café chegou, o núcleo de uma ideia já tinha se desenvolvido, e logo depois ela se tornou uma parte central do acordo com o Irã que o secretário de Estado John Kerry e Moniz anunciaram este mês. Segundo o acordo preliminar, Fordo se tornará um centro de pesquisa, exceto para elementos que possam ser usados em armas nucleares.
Um alto funcionário da Administração Nacional de Segurança Nuclear, Kevin Veal, acompanhou todas as sessões de negociação, enviaria as dúvidas de volta aos laboratórios, esperando separar as ideias boas das ruins.
"Isso é o que o nosso pessoal adora fazer", disse Thom Mason, diretor do Laboratório Nacional de Oak Ridge. "E pode ser muito gratificante."
Dados os riscos das delicadas negociações, os laboratórios avaliam e reavaliam uns aos outros, para garantir que as respostas sejam consistentes. A rivalidade natural entre os laboratórios chegou a funcionar a favor dos negociadores: o Laboratório Nacional de Los Alamos, o berço da bomba localizado nas montanhas do Novo México, ficou feliz em encontrar erros nos cálculos feitos em outros lugares, e vice-versa.
"Muito do que fizemos foi nos bastidores", disse Charles F. McMillan, diretor de Los Alamos.
Uma das principais metas da iniciativa foi redesenhar o reator nuclear iraniano em Arak, ainda em construção, um complexo cercado por armas antiaéreas. A questão era impedir que o reator produzisse plutônio para armas, um dos principais combustíveis das bombas atômicas. O Irã insistia que o reator estava sendo construído para produzir isótopos médicos para o tratamento de doenças.
No ano passado, quando os iranianos propuseram uma maneira de redesenhar Arak, a tarefa de avaliar os planos coube ao Laboratório Nacional de Argonne, nos arredores de Chicago, um dos mais experientes desenvolvedores de reatores nucleares do mundo.
O laboratório refinou a ideia iraniana, certificando-se de que o novo núcleo de combustível de Arak não produziria nenhum plutônio puro para bomba. Eventualmente, os iranianos assinaram embaixo. É um dos poucos elementos do acordo nuclear provisório entre o Irã, os Estados Unidos e cinco outras potências mundiais que parece ser uma correção definitiva, porque para produzir combustível para armas todo o reator teria obrigatoriamente de passar por uma reforma.
Ao elogiar o acordo anunciado no início deste mês, Moniz colocou o redesenho de Arak no topo da lista de realizações, dizendo que ele "fecha o caminho para o plutônio."
Fordo, a mais preocupante das muitas instalações nucleares iranianas, foi outro grande desafio. O complexo de enriquecimento de lá está tão abaixo do solo, numa montanha, que Israel teme não conseguir destruir o local e suas quase três mil centrífugas com ataques aéreos. Os Estados Unidos têm apenas uma arma de destruir bunkers capaz de realizar o trabalho.
Durante o jantar no verão passado em Viena, cientistas e negociadores norte-americanos discutiram como transformar a fortaleza da montanha em um pacífico centro de pesquisa.
A resposta está na própria localização subterrânea da instalação, o que a torna excelente para um observatório que acompanha os raios invisíveis das explosões cósmicas, abrindo uma nova janela para observar o universo. (Os estratos rochosos do local filtrariam sinais insignificantes.) Outra ideia foi usar as centrífugas instaladas para purificar formas raras de elementos utilizados na medicina, em vez de urânio.
Na entrevista, Moniz disse que ele falou com os diretores dos laboratórios na semana passada e pediu-lhes que pensassem bastante sobre outros usos para o complexo de Fordo, uma questão que estará em pauta quanto as negociações forem retomadas esta semana.
O mundo da ciência, disse Moniz, tem muitos projetos pacíficos que ajudariam a tirar o forte montanhoso do rumo para a bomba atômica.
"Nós vamos pensar em outros caminhos", disse ele. A questão é saber se, nas últimas semanas de negociações, os iranianos vão querer acompanhar.

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