Quando o crime compensa
O Estado de S.Paulo
Na semana passada, o coordenador da força-tarefa da Operação
Lava Jato, procurador da República Deltan Dallagnol, e mais oito
procuradores federais propuseram à Justiça Federal do Paraná 5 ações de
improbidade administrativa contra 6 grupos econômicos e 28 executivos
por danos à Petrobrás, no âmbito do chamado petrolão. Argumentam os
procuradores que "empresas corrompem porque os benefícios são maiores do
que os custos". Envolvem-se em esquemas de corrupção, portanto, com
base em uma "decisão racional". Em outras palavras: o crime compensa.
Essa
iniciativa dos procuradores federais paranaenses, cujo objetivo
imediato é endurecer as punições às empreiteiras de obras públicas
envolvidas no escândalo da Petrobrás, visa um alvo mais amplo que é o de
criar condições para "reverter essa equação" do custo-benefício. E
dessa perspectiva coloca em foco a questão essencial do tratamento que
deve ser dispensado, do ponto de vista administrativo e civil, às
pessoas jurídicas condenadas por práticas contra a administração
pública.
Essa matéria é objeto da Lei 12.846, de agosto de
2013, conhecida como Lei Anticorrupção, que estabelece, em seu artigo
2.º, que "as pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente,
nos âmbitos administrativo e civil, pelos atos lesivos previstos nesta
lei praticados em seu interesse ou benefício", responsabilização que,
nos termos do artigo 3.º, "não exclui a responsabilidade individual de
seus dirigentes ou administradores".
O debate dessa questão
é importante e oportuno porque, por razões de variada natureza -
inclusive o indefectível apelo ao "interesse social" frequentemente
usado como pretexto para tudo nos governos populistas -, transparece
claramente, em setores oficiais afinados com os interesses das defesas
das empreiteiras investigadas pela Lava Jato, uma tentativa de consagrar
a tese de que é preciso punir dirigentes culpados, mas preservar as
empresas a qualquer custo.
Dilma Rousseff, com a
responsabilidade de sua investidura, proclamou em mais de uma
oportunidade, inclusive na abertura da primeira reunião ministerial de
seu segundo mandato: "Nós devemos punir as pessoas e não destruir as
empresas. As empresas, elas são essenciais para o Brasil".
A
afirmação da presidente da República pode ser interpretada como uma
defesa da Petrobrás, que já no discurso de posse ela apontara como "alvo
de um cerco especulativo de interesses contrariados", entre eles os
daqueles que ambicionam "privatizar" a empresa.
Cada vez
mais, porém, fica claro que - seja por acreditar na hipótese discutível,
mas benevolente, de que sem as grandes empreiteiras para construir
grandes obras o País para e milhões de trabalhadores ficarão sem
emprego, seja porque interessa, politicamente, uma composição que iniba a
potencialmente perigosa hostilidade dos grandes empreiteiros - o
Palácio do Planalto e o lulopetismo não têm nenhum interesse em levar às
últimas consequências a reiteradamente proclamada intenção de Dilma de
"extirpar a corrupção, doa a quem doer".
Reforçam essa
evidência as trapalhadas do ministro da Justiça na tentativa de explicar
seus contatos com advogados das empreiteiras, a peregrinação de
representantes dessas empresas ao Instituto Lula e, de modo inequívoco, o
acordo de leniência com aquelas corporações que está sendo defendido,
em nome do governo, tanto pela Controladoria-Geral da União (CGU) como
pela Advocacia-Geral da União (AGU). O ministro Luís Inácio Adams - quem
diria - entende que esses acordos não interferem na área penal e por
isso não prejudicam o julgamento dos eventuais réus.
Entidades
representativas de auditores e procuradores, no entanto, contestaram
Adams por meio de nota oficial distribuída à imprensa no fim de semana:
"O acordo tem, sim, considerável repercussão penal, com a extinção da
punibilidade do crime de cartel por ato administrativo, o que impede o
Ministério Público de oferecer denúncia na esfera penal".
A
Lei Anticorrupção está aí para ser aplicada. Pois, como argumentam os
procuradores federais do Paraná, só a punição rigorosa das pessoas
jurídicas, doa realmente a quem doer, é capaz de "reverter a equação"
que tem levado as empreiteiras a concluir que o crime compensa.
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