sexta-feira, 3 de abril de 2015

Metade dos policiais baleados no Rio foi atacada em favelas ‘pacificadas’
Nos três primeiros meses de 2015, 43 PMs foram feridos e outros quatro morreram. Somente nos Complexos da Penha e do Alemão, onde a delegacia foi fuzilada na madrugada de ontem, houve 21 casos
Leslie Leitão -VEJADurante evento de Páscoa no Morro do Cerro-Corá (classificado como nível verde), policiais da UPP distribuem ovos de Páscoa. Ao fundo, meninos fazem a sigla do Comando Vermelho com as mãos, numa alusão à facção que domina a favelaDurante evento de Páscoa no Morro do Cerro-Corá (classificado como nível verde), policiais da UPP distribuem ovos de Páscoa. Ao fundo, meninos fazem a sigla do Comando Vermelho com as mãos, numa alusão à facção que domina a favela (VEJA.com/VEJA)
Apesar de as autoridades responsáveis pela Segurança Pública manterem o discurso de que o programa das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) passa por um momento turbulento e que precisa apenas de alguns ajustes, o cenário real, bem longe da fantasia, é cruel. As estatísticas comprovam que são os próprios homens que deveriam levar a paz a essas favelas os principais alvos dessa guerra sem fim. Em 2015, a cada dois dias um policial militar foi atingido por um disparo de arma de fogo. Em apenas três meses, quatro morreram em algum desses ataques dos criminosos e outros 43 ficaram feridos. Isso representa a metade dos 92 policiais baleados em todo o estado neste mesmo período.
O mês de março ficou marcado como o mais sangrento desde o início do projeto, em dezembro de 2008. Somente nesses 31 dias, 22 policiais ficaram feridos e um morreu em todas as favelas ditas pacificadas. Os números indicam, também, o descontrole total dos complexos da Penha e do Alemão, onde 21 casos foram registrados em 2015. No dia 1º de abril, mais um agente foi ferido à bala, mas os confrontos foram intensos e produziram uma tragédia com cinco vítimas. A dona de casa Elisabeth Alves de Moura Francisco, de 41 anos, morreu, atingida por uma bala perdida, e sua filha Maynara, de 14 anos, foi ferida no braço. Dois suspeitos morreram e um menor de 15 anos, suspeito de ligações com o tráfico, ficou ferido. À noite, a 45ª DP, que funciona dentro da favela, foi atacada por dezenas de tiros. Ontem, no segundo dia do mês, houve mais confrontos. Pela manhã, bandidos atearam fogo a um contêiner da UPP. À tarde, um menino de 10 anos foi morto, também atingido por uma bala perdida.UPPsDocumento sigiloso mostra classificação do risco nas UPPs(VEJA.com/Reprodução)
Atualmente, no Rio de Janeiro, 38 localidades foram contempladas com UPPs. De 2008 pra cá, 188 policiais foram baleados nesses territórios que o governo insiste em chamar de pacificado. Desses, 20 morreram. A região da Penha e do Alemão é recordista histórica de ataques a policiais, com 90 atingidos (sete deles acabaram morrendo). Foi a partir desses episódios cada vez mais corriqueiros que a Polícia Militar decidiu fazer uma classificação chamada de 'Níveis de Risco Operacional das UPPs'. O documento sigiloso foi classificado em três cores: vermelho, amarelo e verde. No primeiro item, que classifica as áreas de maior risco, o texto admite - pelo menos internamente - que 13 favelas estão sem controle. E indica que o programa de proximidade com os moradores da favela seja esquecido temporariamente: "...desaconselhadas as ações preventivas de proximidade até que os níveis de risco operacional sejam restabelecidos a patamares confiáveis de segurança".
Nessas favelas que ganharam a cor vermelha, somente no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, e no Fallet, em Santa Teresa, PMs não foram baleados este ano. Além do Alemão, os problemas foram mais constantes na Rocinha (cinco policiais feridos) e no Complexo do Lins (seis atingidos). A classificação de outras favelas, no entanto, vem sendo contestada nos corredores da própria PM. O exemplo mais claro é o do Morro da Mangueira, que desde setembro é palco de uma disputa de facções pelo controle das bocas de fumo, e mesmo assim ganhou a cor amarela (nível moderado de risco). Na semana passada, um sargento foi atingido num tiroteio com criminosos e, em outro confronto, o Batalhão de Choque matou quatro criminosos que haviam invadido a favela durante a madrugada e apreendeu um verdadeiro arsenal de guerra. A UPP Arará/Mandela também está entre as nove regiões que ganharam a bandeira amarela, sendo que dois policiais já ficaram feridos ali este ano: um no dia 22 de janeiro, outro no dia 4 de março. A região também foi palco de um dos mais audaciosos ataques de criminosos, que em março do ano passado atearam fogo a cinco bases da UPP.
Entre as 15 UPPs que receberam a classificação verde (níveis mínimos de risco), três delas também registraram episódios em que policiais acabaram feridos em 2015: o Salgueiro, na Tijuca, a Chatuba, na Penha, e a Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana. Na quarta-feira, dia 1º de abril, o relações públicas da PM, coronel Frederico Caldas, esbravejou: "Se a UPP der errado, vai todo mundo pro buraco. Vai a polícia, vai a sociedade, vamos todos juntos", esbravejou. Pelo tom desesperado adotado pelo homem da comunicação da PM, é preciso que José Mariano Beltrame, secretário de Segurança Pública há oito anos, realmente tenha outras alternativas para proteger o cidadão do Rio de Janeiro.

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