segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Protestos contra exploração de gás na Romênia têm suspeita de influência russa
Andrew Higgins - NYT  
Daniel Mihailescu/ AFP
7.jul.2014 - Ativistas do Greenpeace bloqueiam a entrada do poço de exploração de gás de xisto da empresa americana Chevron, na vila de Pungesti, na Romênia 7.jul.2014 - Ativistas do Greenpeace bloqueiam a entrada do poço de exploração de gás de xisto da empresa americana Chevron, na vila de Pungesti, na Romênia
Vlasa Mircia, prefeito de Pungesti, vilarejo pobre no leste da Romênia, achou que tinha ficado rico quando a gigante de energia norte-americana Chevron apareceu na cidade no ano passado e arrendou um terreno que ele tinha para uma perfuração exploratória de gás de xisto.
Mas o encontro entre os peixes grandes do mundo empresarial e a Romênia rural logo se transformou em pesadelo. O vilarejo se tornou um ímã para ativistas de todo o país, contrários ao fraturamento hidráulico. Confrontos violentos irromperam entre a polícia e os manifestantes. O prefeito, um dos poucos moradores locais que se colocou abertamente do lado da Chevron, fugiu da cidade, foi criticado de corrupto e traidor no que os ativistas apresentaram como uma luta de Davi contra Golias entre os agricultores pobres e as corporações norte-americanas.
"Fiquei mesmo chocado", lembra-se o prefeito, que agora está de volta ao gabinete na rua principal, na verdade a única, de Pungesti. "Nunca tivemos manifestantes aqui, e de repente eles estavam por toda parte."
Apontando para uma campanha de protestos misteriosamente bem financiada e bem organizada, funcionários romenos, incluindo o primeiro-ministro, disseram que o conflito por conta do fraturamento na Europa tem sim um Golias, mas este é a companhia russa Gazprom, e não a americana Chevron.
A Gazprom, uma gigante da energia controlada pelo estado, tem um interesse claro em impedir que os países dependentes do gás natural da Rússia desenvolvam suas próprias fontes de energia, diz ele, preservando um mercado lucrativo para si - e uma potente ferramenta de política externa para o Kremlin.
"Tudo que deu errado veio da Gazprom", diz Mircia.
Esta crença de que a Rússia está alimentando os protestos, compartilhada por funcionários na Lituânia, onde a Chevron também se deparou com uma onda de protestos intensos e então decidiu se retirar, ainda não foi sustentada por nenhuma prova clara. E a Gazprom negou as acusações de que tenha financiado protestos contra o fraturamento. Mas provas circunstanciais, além de um bom tanto de suspeitas estilo Guerra Fria, contribuíram para que crescesse o alerta contra uma interferência encoberta da Rússia para impedir as ameaças a seu domínio energético na Europa.
Antes de deixar a secretaria-geral da Otan em setembro, Anders Fogh Rasmussen expressou em Londres este alerta, com observações que apontavam o dedo para a Rússia e enfureceram os ambientalistas.
"A Rússia, como parte de suas operações sofisticadas de informação e desinformação, envolveu-se ativamente com as chamadas organizações não-governamentais - organizações ambientais trabalhando contra o gás de xisto - para manter a dependência do gás importado russo", disse Rasmussen. Ele não apresentou provas e disse que o julgamento era baseado no que os aliados da Otan haviam relatado.
As ações da Rússia na Ucrânia alimentaram o que os grupos ambientalistas denunciam como um frenesi de paranoia. O presidente russo, ex-funcionário da KGB Vladimir Putin, enviou um poderoso arsenal para o país que dominou em segredo e por subterfúgio, primeiro anexando a Crimeia em março e, mais recentemente, fomentando uma rebelião separatista armada no leste.
"É crucial para a Rússia manter esta dependência energética. Ela está fazendo um jogo sujo", disse Iulian Iancu, presidente do comitê industrial do parlamento romeno e que acredita firmemente que a Rússia tem participação nas manifestações contrárias à exploração de gás de xisto por toda o leste europeu. Ele reconheceu que não tinha provas diretas para sustentar esta afirmação, nem para uma declaração qeu deu recentemente no parlamento dizendo que a Gazprom havia gasto 82 milhões de euros, ou cerca de US$ 100 milhões, para financiar as atividades antifraturamento por toda a Europa.
"Você precisa entender como os serviços secretos deles são inteligentes", ele acrescentou. "Eles nunca vão agir sob os holofotes."
O que se tornou uma onda de protestos contra o fraturamento no leste europeu, onde os países são mais dependentes da energia russa, começou há três anos na Bulgária, membro da União Europeia, porém mais simpática aos interesses russos do que qualquer outro membro do bloco de 28 nações. Diante de um aumento repentino dos protestos de rua por parte de ativistas, o governo búlgaro baniu o fraturamento em 2012 e cancelou uma licença de exploração de gás de xisto concedida previamente à Chevron.
George Epurescu, presidente da Romania Sem Eles, uma organização romena que desempenhou um papel importante em mobilizar a oposição à Chevron em Pungesti, disse que seu grupo, estabelecido em 2011 para protestar contra a corrupção, mudou de foco para lugar contra o fraturamento depois que "descobriu sobre o problema do gás de xisto" com ativistas búlgaros.
Ele negou alegações sobre o papel da Rússia como uma manobra grosseira para colocar em dúvida o movimento antifraturamento.
"É muito simples: se você puder colocar a Rússia na equação, você vence a discussão", diz ele, acrescentando que a Romênia, diferentemente da Bulgária, tem uma longa história de hostilidade com a Rússia, que deixa a população desconfiada de qualquer causa apoiada por Moscou.
Epurescu, que trabalha em um instituto científico de Bucareste, disse que seu grupo não recebe nenhum financiamento da Rússia ou externo além de pequenas doações de ativistas. A maior parte do dinheiro, diz ele, vem de seu próprio salário.
"Como você pode ver, não temos muito dinheiro", disse ele, sentado na sede do grupo, que conta com uma sala em péssimo estado de conservação, equipada apenas com alguns computadores velhos.
A Romênia depende bem menos da energia russa do que a Bulgária e outros países da região, mas uma expansão na produção doméstica permitira que ela exportasse energia para a vizinha Moldova e prejudicasse um importante objetivo da política externa russa. Assim como a Ucrânia, Moldova se afastou de Moscou em direção à União Europeia e passou a receber forte pressão, principalmente através dos preços do gás, para permanecer dentro da órbita econômica e política da Rússia.
"A energia é a arma mais efetiva da Federação Russa hoje - muito mais efetiva do que aeronaves e tanques", disse Victor Ponta, primeiro-ministro romeno, em uma entrevista.
A Rússia em geral tem mostrado pouca preocupação com a proteção ambiental e têm um longo histórico de assediar e até prender ambientalistas que fazem protestos. No caso do fraturamento, contudo, as autoridades russas aderiram ao verde com entusiasmo, e Putin declarou no ano passado que o fraturamento "representam um enorme problema ambiental". Lugares que o permitiram, segundo ele, "não têm mais água nas torneiras, mas um lodo escuro."
Alexander Medvedev, chefe do braço de exportações da Gazprom, alertou os europeus que eles nunca serão capazes de replicar o sucesso dos EUA na extração de grandes quantidades de gás de xisto através do fraturamento por causa da geologia diferente da Europa e da densidade populacional.
A visão da Rússia até gora se mostrou pelo menos em parte correta, à medida que as previsões iniciais de reservas enormes em lugares como a Polônia ruíram diante de resultados frustrantes em poços-teste. A Lituânia, outro país que oferecia promessas no início, também se mostrou sem valor por causa dos protestos e mudanças legislativas que levaram a Chevron a abandonar o projeto de gás de xisto no final do ano passado.
A Ucrânia, que acredita-se ter as maiores reservas de gás de xisto, particularmente no leste devastado pela guerra, também fracassou. Separatistas pró Rússia no leste, que antes não mostravam nenhum interesse nas questões ambientais, denunciaram o fraturamento como um perigo mortal.
A Romênia, também, poderá se tornar um fracasso no gás de xisto. A Chevron concluiu perfurações exploratórias em Pungesti mas não divulgou nenhum resultado do que encontrou.
Nada disso impediu a Gazprom de procurar gás de xisto e óleo por conta própria. Em sua subsidiária sérvia, Nis, ela está explorando perspectivas no oeste de Romênia, perto da fronteira com a Sérvia. Diferentemente do projeto da Chevron no outro extremo do país, contudo, a iniciativa da Gazprom não gerou nenhum protesto em massa.
Os líderes dos protestos dizem que a diferença reflete meramente o fato de que a Chevron realizou perfurações exploratórias, enquanto a subsidiária da Gazprom até agora fez apenas trabalho de pesquisa geológica.
Anca-Maria Cernea, líder de um grupo político conservador em Bucarest que expôs a possibilidade de uma conexão com a Rússia, disse que embora nenhum documento tenha sido revelado comprovando pagamentos ou qualquer apoio direto da Rússia, as provas circunstanciais mostram que "os russos estão por trás dos protestos contra a Chevron".
Os manifestantes, ela observou, incluem grupos que normalmente não têm nada a ver uns com os outros, como socialistas radicais, alguns com ligações com o aparato de segurança altamente influenciado pela Rússia na vizinha Moldova, e padres ortodoxos profundamente conservadores. A mídia russa, ela acrescentou, esteve curiosamente ativa cobrindo e alimentando a oposição ao fraturamento em Pungensti. O canal estatal de notícias russo RT, voltando ao público estrangeiro, forneceu uma cobertura ampla dos protestos e alertou que os moradores, junto com suas plantações e animais de criação, pereceriam com a água envenenada.
George Maior, chefe da agência de inteligência doméstica da Romênia, disse que não é possível provar o papel russo no movimento antifraturamento.
"Pode haver um elemento russo aqui", disse ele, "mas acho que isso não está provado."
 O local de exploração da Chevron em Pungesti, protegido por uma cerca com arame farpado no topo, está vazio, a não ser pro seguranças e por equipes ocasionais de funcionários enviados para desmontar equipamentos e retirar o concreto usado para a perfuração exploratória agora concluída. A companhia recusou-se a dizer se desistiu da Romênia e estava se retirando por completo.
O prefeito, Mircia, disse ter certeza de que a Chevron decidiu ir embora. "Eles estão indo para casa", disse. 
Tradutor: Eloise de Vylder

Um comentário:

Leslie**** disse...

SEM O GÁS E O PETROLEO A RÚSSIA É TÃO PODEROSA QUANTO A NOVA GUNIÉ