Autocrítica zero
Eliane Cantanhêde - OESP
Depois de sumir durante todo o dificílimo mês
de janeiro, a presidente Dilma Rousseff reapareceu ontem como se nada
tivesse acontecido, nem aumento de tarifas e impostos, crise de energia e
água, flexibilização trabalhista... E o mais chocante na fala de Dilma
foi o de sempre: a falta de autocrítica.
Quem ouviu a presidente falando em "era do conhecimento", "pátria
educadora", "estratégia de crescimento", "estabilidade e credibilidade" e
"pacto contra a corrupção" deve ter se perguntado: será que está tudo
tão bacana assim e eu é que estou errado (ou errada)?
Não, não está tão bacana e quem está assustado tem razão. O Brasil não
cresceu, estagnou. A inflação nunca ficou na meta, sempre ficou no teto
da meta. Os juros galoparam, apesar de toda a propaganda. A
responsabilidade fiscal deixou de ser importante. As contas externas
desandaram. O setor elétrico virou uma bagunça. A Petrobrás se debate em
águas profundíssimas.
Depois de demitir o ministro da Fazenda em plena campanha e de dar uma
guinada e tanto na economia do primeiro para o segundo mandato, o mínimo
que se poderia esperar da presidente reeleita da República é que
batesse no peito e assumisse: mea culpa, minha máxima culpa.
Mas Dilma Rousseff é Dilma Rousseff e não é de admitir culpas, nem de
aceitar responsabilidades, nem de ouvir ministros, assessores, aliados
e, muito menos, críticos. Nem de ter humildade.
Então, ficamos assim. Deu tudo errado mesmo na economia e - já que o
culpado número um, o mordomo Guido Mantega, já foi devidamente
defenestrado - Dilma apresentou oficialmente à Nação os maiores inimigos
da eficiência e dos resultados: "os eventos internos e externos".
Quais sejam: externamente, os problemas de crescimento dos Estados
Unidos, da Europa, do Japão, da China e da Índia, mais a queda no preço
internacional das commodities; internamente, o pior regime de chuvas da
história, com impacto nos preços dos alimentos e da energia.
Há verdades aí? Inegavelmente, há. Mas são só meias verdades, como se o
Brasil não tivesse um presidencialismo forte, o Estado não fosse tão
determinante em tudo no Brasil, Dilma não tivesse a cabeça que tem. E...
como se não sobrasse "incompetência, ideologia e corrupção", conforme o
diagnóstico de nove entre dez cabeças pensantes que Armínio Fraga
verbalizou no Estado domingo.
Além de não fazer autocrítica, Dilma requentou pela enésima vez o tal
"Pacto contra a Corrupção", elencando as mesmas medidas moralizadoras
que, na verdade, dependem mais do Legislativo do que do Executivo e são
mais adequadas a palanques do que a reuniões de trabalho.
Para resolver todos os problemas (Pibinho, inflaçãozona, juros
estratosféricos, aumento de impostos e corte de direitos trabalhistas),
Dilma apresentou pelo menos uma proposta concreta aos seus chefiados:
que confrontem a mídia e a imprensa! Segundo ela, é preciso "reagir aos
boatos", combater "as falsas versões", reagir ao "desconhecimento e à
desinformação".
Pensando bem, era assim que se fazia na Petrobrás. Enquanto PTs, PMDBs,
Cerverós, Paulos Robertos e doleiros faziam a festa, toda a energia
estava concentrada em desmentir a mídia e reagir aos "boatos" e à
"desinformação". O resultado está aí.
Tivesse o governo ouvido os alarmes de especialistas e da mídia, a
Petrobrás não teria chegado a um fundo do poço tão fundo. Tivesse Dilma
ouvido os alarmes de especialistas e da mídia, a economia não estaria
tão medíocre quanto está.
Boa sorte aos 39 ministros!
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