Depois de decisão de tribunal sobre lei imigratória, latinos fogem do Alabama
NYT
Campbell Robertson /Albertville (Alabama)
Crianças jogam futebol em Albertville, Alabama, que tem o que o governador chamou de ¿a lei de imigração mais forte do país
O desaparecimento começou na noite de quarta-feira (28 de setembro), as famílias mais amedrontadas carregaram seus carros logo que ouviram as notícias.
Elas deixaram para trás seus trailers, vendidos mobiliados por mil dólares ou até menos. Ou apenas os fecharam e, num gesto de otimismo, deixaram as chaves com um vizinho. Os cachorros foram alimentados por uma última vez e, se não encontrassem nenhum lar para eles, eram simplesmente soltos.
Dois, cinco, dez anos vivendo aqui, e saíram numa questão de dias, para o Tennessee, Illinois, Oregon, Flórida, Arkansas, México – quem sabe? Qualquer lugar menos o Alabama.
O êxodo dos imigrantes latinos começou poucas horas depois que uma juíza federal de Birmingham confirmou a maior parte das condições da ampla lei de imigração do estado.
A juíza, Sharon Lovelace Blackburn, confirmou as partes da lei que permitia o estado e a polícia local pedirem os documentos dos imigrantes durante blitz rotineiras de trânsito, transformar a maior parte dos contratos com imigrantes ilegais inválidos e exigir às escolas que se certifiquem da situação dos alunos durante a matrícula.
Quando Blackburn terminou, o Alabama ficou com o que o governador chamou de “a lei de imigração mais forte do país”. Ela entrou em vigor imediatamente, embora a decisão ainda deva ser apelada pelo Departamento de Justiça e por uma coalizão de grupos pelos direitos civis.
Nos dias desde então, superintendentes escolares asseguraram aos pais – e um até fez isso na televisão em espanhol – de que nada havia mudado para os filhos que estavam matriculados. Departamentos de polícia de todo o estado disseram que, no momento, estavam esperando instruções sobre como colocar a lei em prática.
Para muitos imigrantes, entretanto, esperar simplesmente parecia muito perigoso. Na manhã de segunda-feira, 123 alunos haviam saído das escolas nessa pequena cidade nas colinas do norte, deixando para trás colegas confusos e aos prantos. Muitos outros faltaram. No estado inteiro, 1.988 alunos latinos faltaram na sexta-feira, cerca de 5% de toda a população étnica hispânica do sistema escolar. John Weathers, empresário de Albertville que aluga e vende casas para muitos moradores latinos, disse que sua taxa de ocupação caiu rapidamente um quarto e pode cair ainda mais, dependendo do que acontecer na semana que vem. Duas pessoas que pagaram suas hipotecas telefonaram para ele perguntando se ele podia comprar suas casas de volta, disse Weathers.
Mercearias e restaurantes estão notavelmente mais vazios, o que em alguns casos pode ser porque alguns funcionários deixaram de aparecer. Em alguns bairros, as ruas estão estranhamente calmas.
Atraídos pelo trabalho numa das inúmeras granjas, os imigrantes latinos vinham chegando a Abertville há anos, há tanto tempo que alguns dos mais velhos ganharam anistia pela lei de imigração de 1986. Mas o influxo aumentou durante a última década, e as placas na Main Street agora são na maioria bilíngues, quando não escritas apenas em espanhol.
O que a nova lei de imigração significa em grande escala ficará mais claro num lugar como Albertville, ela pode transferir os empregos para os cidadãos e proteger os contribuintes como prometido, ou espalhar o desastre econômico como temem seus oponentes.
Os críticos da lei, principalmente agricultores, empresas terceirizadas e construtores, dizem que as medidas já foram devastadoras, deixando safras apodrecendo nos campos e uma escassez crítica de mão de obra. Eles disseram que até mesmo trabalhadores latinos com toda a documentação estão indo embora, uma constatação que pareceu se repetir nas entrevistas aqui. O status legal dos familiares costuma ser misto – os filhos costumam ser cidadãos nascidos nos EUA – mas a decisão de sair ou ficar sempre fica a cargo do elo mais fraco.
Apoiadores da lei reconhecem que ela pode causar problemas a curto prazo, mas dizem que se mostrará efetiva com o tempo.
“Levará algum tempo para que a mão de obra local se desenvolva novamente”, disse o senador Arthur Orr, republicano de Decatur, “mas os trabalhadores de fora não devem entrar e cobrar menos e colocar os daqui fora dos negócios.”
Orr disse que já há sinais de que a lei está funcionando, e apontou que o centro de trabalho de presidiários em Decatur, a cerca de 80 quilômetros a noroeste, há não muito tempo atrás não conseguia encontrar trabalho para presos nas granjas ou fábricas pequenas. Uma vez que a lei foi lançada em junho, o centro tem colocado cada vez mais presos nessas funções, agora mais de 150 por dia, disse ele.
Numa manhã de segunda-feira, uma das granjas de Albertville realizou uma feira de empregos, atraindo uma multidão enorme, uma mistura de latinos, negros e brancos, numa fila do lado de fora da granja que se estendia pela rua.
“Isso deveria ter sido feito há anos”, disse Shannon Lolling, 36, que ficou desempregado por mais de um ano, referindo-se à lei.
O problema de Lolling parecia ser com o sistema que trouxe os imigrantes ilegais para cá, e não com os trabalhadores propriamente ditos.
“Foi por isso que nossos empregos foram para o sul, par ao México”, disse ele. “Eles pagam salários menores e guardam o resto do dinheiro, e nos impedem de arrumar trabalho.”
Não longe da granja, nos bairros latinos, é difícil diferenciar o silêncio do dia de trabalho do silêncio do abandono ou do silêncio do medo paralisante.
Muitos latinos escolheram ficar por enquanto, dizendo, sem muita convicção aparente, que a lei certamente será bloqueada pelo presidente, pelo juiz, “pelo governo”. Até lá, eles não saem de casa a menos que seja absolutamente necessário. Eles enviam outras pessoas para fazer suas compras e dizem aos filhos para sair do time de futebol e voltar para casa logo depois da aula. Rumores de patrulhas e bloqueios nas ruas são cada vez mais comuns, e embora a nova lei não tenha nada a dizer sobre essas coisas, a desconfiança é alimentada pelas histórias, como uma contada por um pastor latino local que disse que foi parado fora de Birmingham na quarta-feira, poucas horas depois da decisão. Seu amigo que estava dirigindo – e que está nos Estados Unidos ilegalmente – agora está na prisão por causa de uma acusação de delito não relacionada, disse o pastor, acrescentando que embora o policial tenha deixado ele ir, disse que ele não era mais bem recebido no Alabama.
Uma funcionária de uma granja, de 54 anos, chamada Candelaria, disse: “tenho medo de dirigir até a igreja. A mulher que me dá carona para o trabalho disse que vai embora. Ela disse que se sente como uma prisioneira.”
Durante todo o verão, Allen Stoner, advogado de Decatur, vem ajudando seus clientes latinos a preencher formulários nomeando amigos ou parentes como guardiões de seus filhos, que em muitos casos são cidadãos norte-americanos. Desta forma, as crianças não serão transferidas para o serviço social caso os pais sejam presos e deportados.
Boa parte desse trabalho foi feita logo que a decisão da juíza saiu, embora na semana passada alguns clientes de Stoner tenham começado a contatá-lo imediatamente para perguntar o que deveriam fazer. A segunda-feira foi silenciosa.
“Recebemos muitos telefonemas na quinta e na sexta-feira”, disse Stoner, “mas agora o número caiu”.
Ele não sabe ao certo, mas acha que seus clientes foram embora.
Tradução: Eloise De Vylder
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