segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Cariocas também têm de zelar pela cidade
Pichações em prédios históricos da Praça Quinze e invasões de torcedores durante partida entre Flamengo e Cruzeiro no Maracanã demonstram desprezo pelo Rio
O Globo
Pelo menos dois episódios recentes serviram para colocar em xeque a decantada boa vontade do carioca com sua cidade. Há duas semanas, uma festa na Praça Quinze autorizada pela prefeitura terminou com montes de lixo espalhados pelas ruas e pichações em monumentos históricos como o Paço Imperial, construção do século XVIII tombada pelo Iphan, e o Palácio Tiradentes, sede da Assembleia Legislativa.
O sítio histórico foi palco do Baile do Ademar, evento organizado pelo skatista Ademar Luquinhas que atraiu milhares de pessoas ao local. Depois dos atos de vandalismo, o Iphan se queixou de que não fora consultado sobre a realização da festa. Já a prefeitura alegou que o encontro ocorreu em área pública, e não dentro de um bem tombado, não necessitando de autorização do instituto. Mas, independentemente de quem tenha razão, o estrago estava feito. As pichações, que se estenderam a árvores e bancas de jornais, atingiram a cantaria do Paço, tornando mais complexo e oneroso o trabalho de restauração.
É bem verdade que, após a repercussão do caso, Ademar pediu desculpas aos cariocas e liderou, no domingo seguinte, um abraço simbólico ao Paço. O casarão — palco de fatos históricos como o Dia do Fico, a Abolição da Escravidão e a Proclamação da Independência — funciona hoje com um centro multicultural.
Outro fato que deixou a cidade mal na fita aconteceu no feriado de 7 de setembro, durante a primeira partida entre Flamengo e Cruzeiro pela final da Copa do Brasil, no Maracanã. Torcedores promoveram invasões coordenadas em praticamente todos os setores do estádio, deixando atônitos os mais de mil homens encarregados da segurança da partida — 455 PMs e 622 stewards. Para tentar controlar o tumulto, a polícia usou bombas de gás lacrimogêneo, gás de pimenta e balas de borracha.
Não se pode dizer que foram episódios isolados. Basta lembrar que, no mesmo dia em que o Cais do Valongo foi declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco, em julho, reportagem do GLOBO mostrou que o sítio exibia sacolas plásticas e garrafas PET em meio às pedras históricas, redescobertas durante as obras do Porto graças a um minucioso trabalho de arqueologia. Acrescente-se a isso o fato de áreas restritas do monumento serem invadidas para selfies e manobras de skate.
Levantamento da prefeitura mostrou que, de janeiro a dezembro de 2015, 102 monumentos públicos da cidade foram alvo de vândalos, demandando gastos de R$ 4 milhões em conservação.
O Rio vive hoje a mais aguda crise financeira de sua história. Espera-se que a recente homologação do acordo de recuperação fiscal com a União possa trazer dias melhores para a população fluminense. Mas a sociedade precisará fazer a sua parte nessa retomada. E isso inclui zelar pelo patrimônio público. Afinal, viver numa cidade melhor deve ser um objetivo comum.

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