Oscar e Estela
Presidente e ministro se conheceram há 44 anos, na clandestinidade, e retomaram amizade com a eleição de Lula
Natuza Nery - FSP
Oscar conheceu Estela em 1967, meses antes de entrarem, juntos, na clandestinidade. Estela já tinha mais de 20 anos; Oscar, 17.
O regime militar colocou os dois mineiros na mesma casa, numa das intermináveis reuniões de um "aparelho revolucionário". Era lá que militantes de esquerda se escondiam para planejar ações contra a repressão: Oscar como chefe de célula; Estela, dirigente estudantil.
O secundarista costumava se reportar à universitária do curso de economia. Dela, ganhava livros, dicas de filmes e orientação intelectual.
Um ano depois, integravam a organização Colina (Comando de Libertação Nacional), e com ela pretendiam transformar o país em comunista. Por muito tempo, Estela foi o contato da célula de Oscar na organização.
Eles se encontravam no apartamento da dirigente e seu marido, o jornalista Cláudio Galeno, em Belo Horizonte. As reuniões ocorriam lá, regadas a cerveja e Marx. Vez por outra, preferiam a casa dos pais de Estela.
Dona Dilma, a mãe, oferecia suco, e os jovens militantes se serviam da vasta literatura internacional colecionada pelo pai, Pedro Rousseff. Ao som de MPB, planejavam ações armadas.
Estela era como chefe de Oscar. Dava-lhe broncas -o que não mudou muito quase 45 anos depois. "Ela sempre me tratou como irmã mais velha", costuma dizer, quando descreve a relação.
À medida que o regime militar endurecia, a esquerda ia entrando na clandestinidade. Uma operação policial fez cair todo o comando da Colina. A organização entrou em crise, e Estela tentou, sem êxito, manter Oscar em seu grupo. Não se viram mais.
Em 1970, ele soube da captura da amiga pelos jornais. Pouco depois, era sua vez de ser preso e torturado pela ditadura. O Ato Institucional número 5 afastava Oscar e Estela pela primeira vez.
REENCONTRO
A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 cuidou de juntar os dois companheiros.
Três décadas depois, retomavam a amizade interrompida pelo regime: Estela voltara a ser Dilma Rousseff, nomeada por Lula para o Ministério de Minas e Energia. Fernando Pimentel tornou-se prefeito de Belo Horizonte.
A partir da posse de Lula, recuperaram não só a relação pessoal, mas o hábito de trocar livros e falar de economia, formação de ambos.
Nos oito anos seguintes, tempo mais longo em que desfrutaram de uma convivência regular, Dilma embarcava em uma meteórica carreira na Esplanada.
O petista deixou o comando de Belo Horizonte e decidiu abrir uma consultoria, a P-21. Firmou aliança com o PSDB mineiro para selar sua sucessão e desagradou correligionários incomodados com o "namoro" suprapartidário.
Agora, suas atividades na P-21 ameaçam afastá-lo de Dilma novamente.
"QUERO VOCÊ PERTO"
Em 2010, voltaram à condição de chefe e subordinado: ela como candidata, ele, coordenador da campanha. Pimentel ganhava importância e disputava com Antonio Palocci o posto de interlocutor mais influente.
Até que, em meio à corrida eleitoral, Pimentel foi acusado pela oposição de montar uma central para investigar adversários do PSDB. Ficou na geladeira até ser escolhido ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
No convite, uma frase chamou a atenção de quem presenciou a conversa: "Quero você por perto". Era a senha que marcava o retorno do amigo das antigas ao atual círculo íntimo de Dilma.
SECUNDARISTA
Desde o domingo passado, quando uma reportagem do jornal "O Globo" lançou suspeitas de que Pimentel usara sua consultoria para fazer tráfico de influência, Dilma evitou subir o tom. Neste primeiro ano de mandato, viu cair sete de seus ministros, e teme perder aquele que, entre todos, lhe é mais caro.
As acusações se avolumaram e tornaram imprevisível o futuro de Pimentel no Executivo. Na quinta, diante dos recados de que ele não resistiria às pressões para preservar sua biografia, a presidente deixou o sermão de lado e posou de "irmã mais velha": "Você vai superar isso".
No governo, diz-se que Dilma costuma ser mais dura com os "de casa". Até agora, porém, vem fazendo esforço para segurá-lo no cargo.
Certa vez, em tom de brincadeira, Pimentel revelou um detalhe importante de sua amizade: "Às vezes, acho que ela ainda me trata como um estudante secundarista".
Nenhum comentário:
Postar um comentário