Casamento, adoção, filiação: a impaciência dos homossexuais franceses
Gaëlle Dupont - Le Monde
O governo se recusa a acelerar o cronograma das reformas e mantém a promessa de uma lei em 2013
Esperança, impaciência, ansiedade, até um pouco de preocupação. Esses sentimentos dominam entre os gays e as lésbicas, às vésperas da Marcha do Orgulho LGBT de Paris, para a qual são esperadas cerca de 500 mil pessoas, no sábado (30). “É uma marcha especial, pois o contexto é inédito”, observa Nicolas Gougain, porta-voz do Inter-LGBT (lésbicas, gays, bi e transexuais), que organiza a marcha parisiense. “Nunca estivemos tão próximos de conseguir novos direitos. Mas ainda não chegamos lá.”
A entrevista dada pela ministra da Família, Dominique Bertinotti, ao “Parisien”, na sexta-feira (29), não responde às perguntas deles. Embora ela lembre mais uma vez a vontade do governo de cumprir as promessas de campanha da esquerda, abrindo o casamento e a adoção aos homossexuais, ela permanece vaga quanto ao conteúdo da reforma e seu caráter mais ou menos restritivo. A ministra também rejeita a ideia de uma aceleração do cronograma pedida por certas associações. “Precisamos de tempo para ouvir as pessoas e discutir (...),” ela declara. “Mesmo que demore um pouco, a lei é um compromisso nosso e acredito que ela será votada em 2013”.
“Já esperamos o suficiente!”, acredita Stéphane Corbin, porta-voz da Coordenação Interpride France, organizadora das Marchas do Orgulho LGBT regionais, que já reuniram cerca de 80 mil pessoas. Para ele, a votação da lei deveria acontecer “dentro dos 100 [primeiros] dias [de mandato]”. “As reformas sociais andarão rápido e podem ser conduzidas juntamente com outras”, diz Corbin. “Não podem condenar o governo por privilegiar temas simbólicos”.
Os trabalhos sobre os detalhes do texto não começaram, nem por parte de Bertinotti, nem por parte da ministra da Justiça, Christiane Taubira. Algumas modificações do direito da família já parecem estar certas. O casamento seria aberto aos homossexuais junto com todos os direitos que ele comporta para o casal (direito de herança do cônjuge, de receber sua aposentadoria após a morte...). A adoção conjunta se tornaria possível para os casais de mesmo sexo. Mas na prática ela deverá permanecer rara, visto o pequeno número de crianças em condições de adoção.
Quanto ao resto, é uma incógnita. Em uma resposta à Associação dos Pais e Futuros Pais Gays e Lésbicas, o candidato Hollande se comprometeu, no dia 6 de março, a permitir a adoção de uma criança pelo companheiro estável, pelo parceiro de união civil ou pelo cônjuge de seu pai biológico, “sem discriminação”. Essa adoção pelo pai “social” atenderia, por exemplo, às expectativas dos casais de lésbicas que conceberam uma criança por inseminação, nos quais a segunda “mãe” não tem nenhuma ligação legal com a criança.
Mas as associações querem ir além. “O casamento e a adoção não resolvem tudo”, afirma Nathalie Mestre, presidente do ‘Enfants d’arc-en-ciel’ [Filhos do Arco-íris], uma associação de pais. “Uma adoção é uma iniciativa complexa, que pode levar até dois anos. Queríamos que a filiação fosse estabelecida para nós da mesma maneira que é para os heterossexuais”.
Ou seja, em primeiro lugar, que a presunção de paternidade inscrita no casamento seja substituída por uma “presunção de parentalidade”. A esposa da mãe biológica de um bebê concebido por inseminação seria assim automaticamente considerada como seu segundo pai legal. Para os casais que não querem se casar, as associações reivindicam que o pai “social” possa estabelecer a filiação com o filho de seu parceiro reconhecendo-o em cartório. Uma possibilidade que eles gostariam de ver sendo estendida aos casos de coparentalidade, quando os filhos vêm de mais de duas pessoas (um casal de mulheres e um homem, ou um casal de mulheres e um casal de homens).
A equipe de Hollande havia descartado, durante a campanha, a inscrição de mais de dois pais no estado civil de uma criança. Em compensação, considerava-se uma extensão das possibilidades de compartilhamento da autoridade parental, inclusive nas novas famílias que se formam em caráter heterossexual, o que corresponde ao “estatuto de terceiros” mencionado por Bertinotti. Quanto à “presunção de parentalidade”, ela não figura na proposta de lei socialista de 2011 sobre o casamento homossexual, cujo segundo signatário era François Hollande.
Mesmo que uma maioria de franceses se diga a favor do casamento gay, as reformas deverão passar por muitos debates. “Nosso direito é fundamentado na existência de dois laços de filiação, um paterno e outro materno”, observa Françoise Dekeuwer-Défossez, professora de direito da família. “Dizer que não há mais um pai e uma mãe, e sim pais, é uma grande revolução.” O fato de Bertinotti ter sido vaiada durante a assembleia geral da União Nacional das Associações Familiares (Unaf), na sexta-feira (22), quando ela falou em “igualdade entre famílias”, mostra o caráter ainda delicado do debate.
Portanto, as associações homossexuais ficarão bem atentas. A lembrança do atrito do PaCS [pacto civil de solidariedade, uma forma de união civil], quando o Partido Socialista não havia mobilizado um número suficiente de deputados para evitar a rejeição do texto, em 1998, continua viva nas memórias.
Tradutor: Lana Lim
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