Paraguai soberano
FSP - Editorial
Apesar de cercear direito de defesa, impeachment do presidente foi constitucional; é abuso dos países vizinhos pretender impor sanções
A Corte Suprema de Justiça do Paraguai recusou ontem a alegação do ex-presidente Fernando Lugo de que foi inconstitucional o fulminante processo de impeachment pelo qual o Congresso o depôs, entre quinta e sexta-feira passada.
Com a decisão, caem por terra as pretensões de invalidar a posse do vice Federico Franco como sucessor constitucional. Também ontem a Justiça Eleitoral do país vizinho refutou a possibilidade de antecipar as eleições presidenciais, previstas para abril de 2013.
Não resta dúvida de que o impedimento de Lugo se deu sob evidente cerceamento do direito de defesa, cujo exercício ficou confinado a apenas duas horas de argumentação perante os parlamentares. Infelizmente, porém, a Constituição paraguaia não disciplina esse importante aspecto.
Exige apenas que o processo seja aprovado por dois terços da Câmara e que o afastamento ocorra se assim decidirem dois terços do Senado -limites amplamente superados nas votações que consumaram o impeachment.
Como motivo, basta a alegação genérica de "mau desempenho de suas funções".
Eleito numa plataforma esquerdizante, o ex-bispo católico Fernando Lugo conduzia um governo populista e errático, prejudicado pela conduta pessoal do mandatário, compelido a reconhecer filhos em escandalosos processos de paternidade.
Mas o motivo principal da derrocada foram os efeitos desastrosos da crise econômica no Paraguai, cujo produto nacional deverá encolher 1,5% neste ano. A popularidade presidencial se desfez depressa, tornando possível a formação da esmagadora maioria congressual que o afastou do cargo.
Por afinidade ideológica -maior no caso da Argentina, menor no de Brasil e Uruguai-, os demais governos do Mercosul decidiram suspender a presença do vizinho na reunião do organismo, que deve culminar na sexta-feira próxima, quando examinarão possíveis sanções contra o novo governo em Assunção.
Esse comportamento é injustificável. As cláusulas democráticas previstas pelo Mercosul e pela Organização dos Estados Americanos (OEA) aplicam-se a flagrantes violações da ordem constitucional. Ainda que o impedimento de Lugo seja criticável, as instituições paraguaias têm funcionado de acordo com as leis daquele país.
Com um triste histórico de ingerência na política interna do Paraguai, país que mantém laços de dependência econômica em relação ao Brasil, o melhor que o Itamaraty tem a fazer é calar-se e respeitar a soberania do vizinho.
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