Apesar de toda a verborréia acadêmica, a arte contemporânea tem como substância o cocô. Ele não é um desvio: é a sua quintessência.
Esta artigo terá que começar do final: mais do que herética ou desrespeitosa, a exposição Queermuseum,
patrocinada pelo Santander em Porto Alegre é ruim. MUITO ruim. Com isto
explicitado, vamos voltar e entender por que ela é assim tão ruim.
O Modernismo surgiu em um tempo de
transformações como jamais ocorreram em toda História mundial anterior.
Embora incompreendida desde o seu primeiro minuto de vida, o fato é que o
surgimento de manifestações artísticas não figurativas e niilistas não
fez da Arte Moderna menos artística. Tampouco menos bela.
Menos ainda refratária à presença de
artistas medíocres ou picaretas. É importante ressaltar que a má arte
sempre existiu. Tendemos a crer que “antigamente” todas as telas,
esculturas, músicas e projetos arquitetônicos eram belíssimos e
perfeitos. O fato, entretanto, é que o tempo filtra as criações menores e
os relega ao esquecimento, preservando o que realmente interessa. É uma
espécie de “darwinismo artístico”: o mais belo e mais elevado vira
cânone.
Não hesito em apontar o primeiro e mais
célebre exemplo de picaretagem da Arte Moderna: o famigerado urinol de
Marcel Duchamp. Não vou discorrer sobre ele, posto que outros já o
fizeram com muito mais propriedade que eu. Mas como diria uma certa
pensadora brasileira de origem búlgara, “por trás de toda arte
contemporânea existe uma figura oculta, que é o urinol de Duchamp”. Mas
colocá-lo no mesmo patamar das criações de Chagall; Picasso; Matisse;
Gaugain; Mondrian; Paul Klee; Max Ernst etc. é um erro crasso.
Talvez o grande pecado da Arte Moderna
tenha sido o de ainda não ter sido capaz de se filtrar e de se livrar
dos urinóis. Mas há outra questão fundamental na Arte Moderna: a de que
ela acabou por se tornar um híbrido infértil. O rompimento com o passado
foi tão profundo que tudo o que a montanha pôde parir foram ratos. Daí
surgiu o Pós-Modernismo, ou Arte Contemporânea, onde tudo parece ter
sido arrancado de uma reforma no banheiro da rodoviária. Mas ainda há o
que dizer antes de chegarmos a ela:
Entretanto, o que o Reichskunstkammer (presidente
da Câmara de Artes do Reich) Adolf Ziegler (ele próprio um pintor),
assim como seus superiores hierárquicos Joseph Goebbels e Hitler, não
contavam, era que a exposição de “arte degenerada” fosse fazer muito
mais sucesso do que a de “arte sadia”. Pudera! Basta comparar os
catálogos de ambas (ainda existentes e facilmente encontráveis na
internet) para entender: o conteúdo da exposição nazista era
medonhamente kitsch. A releitura pretensamente classicista de
artistas que jamais teriam saído das sombras da mediocridade se não
fosse o profundo mau gosto do “Curador-Mor da Nação” (o próprio Hitler)
era não apenas ruim, mas ridícula mesmo. Uma overdose de corpos
musculosos nus – evidenciando o pendor homoerótico da elite nazista – e
de cenários bucólicos e chinfrins, num espelho hiperbólico daquilo que
os nazistas julgavam ser a Alemanha. Tanto a do passado quanto a do
futuro prometido.
Tudo isso é para explicar o que se pode
resumir em uma frase: Só existem duas formas de arte: a boa e a ruim.
Sendo assim, então o que explica que hoje haja tanta arte ruim sendo
exposta e adorada por todos os museus e galerias do mundo? Para
responder isso, precisamos dar mais uma passadinha na Alemanha Nazista: A
mostra Entartete Kunst percorreu outras cidades alemãs até
1939, repetindo o fenômeno de Munique. E pouco antes de rebentar a
Segunda Guerra Mundial, elas foram secretamente leiloadas na Suíça. Para
os nazistas, o Modernismo podia ser degenerado, mas que mal haveria em
fazer um dinheirinho com ele, não? Foi a sorte daquelas peças, que hoje
valem bilhões de euros no mercado.
Mas se o nazismo involuntariamente salvou
aquelas peças – e a Arte Moderna como um todo por tabela –, ele também
plasmou uma falsa dicotomia: a de que toda Arte Moderna é boa, enquanto que toda
arte tradicional e figurativa é ruim e “fascista”. É bem verdade também
que alguns dos defensores do tradicionalismo não ajudam. O filósofo e
esteta britânico Roger Scruton, em seu famoso documentário Why Beauty Matters? inverte os polos e determina: a função da arte é ser bela e ponto final. Seria apenas isso mesmo?
Podemos até mesmo aceitar que a Arte tem a
Beleza como finalidade, mas como ignorar a Arte como um espelho ou
termômetro do seu tempo? Se o Modernismo rompeu com o passado e derreteu
o Realismo, foi porque o século 20 foi mesmo uma era de niilismo
patológico. Mas olhar para o passado com lentes idealizadoras para
repeti-lo é mergulhar de cabeça no pastiche. Foi o que o nazismo
pretendeu. E é o que Scruton parece propor com sua tese. O que não
absolve o Modernismo do seu grande erro já citado: por ser tão
desenraizado e pessimista, ele se esgotou e morreu sem deixar herdeiros.
A não ser que consideremos o
Pós-Modernismo como tal, embora seu papel esteja mais próximo daquele
desempenhado pelos vermes que roem as carnes de um defunto. Sejamos
diretos: a Arte Contemporânea simplesmente não existe, a não ser como narrativa.
À pretexto de representar o mundo onde supostamente se insere, a Arte
Contemporânea não preenche nada: não é estética, não é antropológica,
não é utilitária, não é nada além de discurso e de pose. Pour épater la bourgeoisie.
Todas as exposições de Arte Contemporânea
às quais tive o desprazer de comparecer me remetem a uma traquinagem da
minha infância: um dia, não lembro por que razão, minha mãe me pôs de
castigo no quarto dos livros. Havia nele uma estante de madeira
recentemente envernizada, e eu resolvi que ela seria o palco da minha
vingança. Entendam: eu estava muito revoltado com o castigo materno, e
precisava protestar contra tamanha injustiça! Apanhei um alfinete e
expressei a minha indignação com um palavrão na porta da estante. É
claro que diante de tanta raiva eu não poderia usar um palavrão
qualquer, e arranhei o pior de todos que eu conhecia na ocasião:
COCÔ
A
pichação me valeu um prolongamento na detenção. Mas para meu gáudio,
mesmo depois de aplicada mais uma camada de verniz, quem a olhasse assim
de contraluz ainda podia ver aquele cocozão gravado na madeira. Uma
vingança maligna de um menino mal saído da Fase Anal, tão chocante
quanto qualquer dessas exposições cheias de escatologia. Com a diferença
que os ditos artistas que as cometem não têm quatro anos de idade.
O que nos leva novamente ao urinol de Duchamp. Se aquilo é arte, logo tudo é arte. Portanto nada mais é arte. E esse é também um dos postulados de Sir Scruton em seu documentário. No qual, dessa vez, ele acerta na mosca.
O que se viu na exposição que o banco
Santander patrocinou em Porto Alegre foi apenas a repetição de um padrão
que já se tornou exaustivo: um discurso da moda qualquer (no caso em
questão foi o da ideologia de gênero) traduzido através de provocações
pueris como a de escrever palavrões em hóstias (lembram do cocô escrito
na estante?) ou em pintar frases como “criança viada” sobre um painel de
madeira.
Ofender-me? Obrigue-me! Não nasci no país de Gregório de Matos; Costinha; Dercy Gonçalves; Arí Toledo; Agildo Ribeiro; Casseta e Planeta e Hermes & Renato pra
ter medo de “palavra feia”. Gênios da comédia e verdadeiros
revolucionários que orbitam em esferas celestiais anos-luz acima de
qualquer um desses artistas-autistas. A Arte Contemporânea é soporífera,
estéril e tão frágil que até um pirralho com um alfinete nas mãos é
capaz de derrubá-la. A exposição de Porto Alegre é apenas ruim. MUITO
ruim, como disse no primeiro parágrafo. E é como tal que ela deve ser
tratada. Sem discursos nem narrativas.
Agora parem de me ler e vão ao MASP! Mas
não caiam na asneira de descerem até as salas do subsolo, onde ocorrem
as exposições de Arte Contemporânea. E se forem ao banheiro, lembrem-se
que a Arte jamais estará num urinol ou numa estante de madeira. Mesmo
que alguém tenha escrito R. Mutt 1917 ou COCÔ neles.
Nenhum comentário:
Postar um comentário