Antonio Jiménez Barca - El Pais
Como tantas coisas hoje em dia, isto também começou no Facebook. Há mais de três anos, Pedro Ribeiro de Castro, deputado do Partido Social-Democrata (grupo conservador que atualmente governa Portugal, então na oposição), recebeu uma mensagem na qual lhe pediam que se interessasse pela sorte dos sefarditas (ou sefardins) de origem portuguesa, expulsos há mais de cinco séculos do solo lusitano.
Como tantas coisas hoje em dia, isto também começou no Facebook. Há mais de três anos, Pedro Ribeiro de Castro, deputado do Partido Social-Democrata (grupo conservador que atualmente governa Portugal, então na oposição), recebeu uma mensagem na qual lhe pediam que se interessasse pela sorte dos sefarditas (ou sefardins) de origem portuguesa, expulsos há mais de cinco séculos do solo lusitano.
Ribeiro de Castro começou a mexer no assunto e apresentou uma lei que foi aprovada por unanimidade e que concederá a nacionalidade a todos os descendentes dos judeus que deixaram o país no final do século 15. Muitos deles já haviam sido expulsos da Espanha em 1492 e haviam buscado, sem sucesso, refúgio do outro lado da fronteira.
Em Portugal, na verdade, não houve ordem de expulsão, mas foram batizados em massa e à força, obrigados a esquecer a prática de sua religião e perseguidos por um sistema inquisitorial tão cruel quanto o espanhol. Assim, milhares de sefarditas portugueses (calcula-se que da Espanha passaram para Portugal cerca de 120 mil, que se somaram aos 50 mil existentes) decidiram se exilar: ao longo dos anos, algumas famílias passaram pelo que hoje são Holanda, Itália, Turquia, Síria, Líbano, Brasil e EUA.
Sem abandonar suas raízes, nem a persistente nostalgia de uma terra cada vez mais remota, nem sua velha língua sefardita, o ladino. Há alguns dias, no Colorado (EUA), Carlos Zazur, 42, falou com este jornal por telefone nessa língua quase mágica, uma espécie de espanhol do século 15 com enxertos portugueses, árabes, balcânicos ou franceses, perfeitamente compreensível para um falante de espanhol atual. "Sou descendente de judeus sefarditas pelos quatro lados. Portugueses e espanhóis. Minha mãe me ensinou a língua, que foi a primeira que falei quando criança", explica Zazur, que é um antropólogo especializado em cultura sefardita. Nascido no Brasil, Zazur afirma que a lei portuguesa é boa e que ele aguarda os detalhes da regulamentação, atualmente em processo de redação, para decidir-se a pedir a nacionalidade.
Outros o farão. "É possível que exista um pequeno êxodo", acrescenta o especialista, que calcula que no mundo haja 2 milhões de descendentes de judeus sefarditas. Zazur lembra que os judeus de origem portuguesa que se transferiram para Amsterdã participaram da eclosão do comércio holandês, trabalhando nos mercados de café, chocolate, tabaco ou escravos. E que havia judeus portugueses na origem de Nova York, quando ainda se chamava Nova Amsterdã. "Essas famílias de judeus expulsos, devido a sua capacidade, sua força e sua cultura, sempre foram um motor econômico e social da história", explica.
Na Flórida, Luciano Lopes, proprietário de uma pequena empresa que comercializa iogurtes e descendente de uma família judia originária e expulsa das proximidades do Porto, também pretende pedir a nacionalidade portuguesa. Confessa que sempre gostou do país e que o sul da Europa o atrai porque, apesar da crise onipresente e do descalabro econômico, "sempre será um bom lugar para viver".
"Para se beneficiar da lei servirão os sobrenomes, o idioma, a ascendência... tudo isso está sendo estudado agora para evitar fraudes", explica o deputado Ribeiro de Castro. Mas, além desses formalismos, trata-se de "acabar com uma vergonha histórica e dar as boas-vindas aos que nunca deveriam ter partido", acrescentou.
Quando os antepassados do ramo espanhol da família de Carlos Zazur abandonaram Zamora, em 1492, levaram a chave que abria uma sinagoga dessa cidade. Dentro de alguns meses, Zazur irá pronunciar conferências em Zamora. Não existe mais a sinagoga, nem o edifício que a abrigava. Mas ele levará consigo a chave, que passou de geração em geração, de país em país, continente em continente, como a metáfora da memória, mais forte que os muros de pedra ou de tijolo. "Não há mais porta que essa chave abra", reconhece. "Meu avô dizia que Sefarad deixou de ser um lugar na terra e passou a ser um lugar no coração."
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Em Portugal, na verdade, não houve ordem de expulsão, mas foram batizados em massa e à força, obrigados a esquecer a prática de sua religião e perseguidos por um sistema inquisitorial tão cruel quanto o espanhol. Assim, milhares de sefarditas portugueses (calcula-se que da Espanha passaram para Portugal cerca de 120 mil, que se somaram aos 50 mil existentes) decidiram se exilar: ao longo dos anos, algumas famílias passaram pelo que hoje são Holanda, Itália, Turquia, Síria, Líbano, Brasil e EUA.
Sem abandonar suas raízes, nem a persistente nostalgia de uma terra cada vez mais remota, nem sua velha língua sefardita, o ladino. Há alguns dias, no Colorado (EUA), Carlos Zazur, 42, falou com este jornal por telefone nessa língua quase mágica, uma espécie de espanhol do século 15 com enxertos portugueses, árabes, balcânicos ou franceses, perfeitamente compreensível para um falante de espanhol atual. "Sou descendente de judeus sefarditas pelos quatro lados. Portugueses e espanhóis. Minha mãe me ensinou a língua, que foi a primeira que falei quando criança", explica Zazur, que é um antropólogo especializado em cultura sefardita. Nascido no Brasil, Zazur afirma que a lei portuguesa é boa e que ele aguarda os detalhes da regulamentação, atualmente em processo de redação, para decidir-se a pedir a nacionalidade.
Outros o farão. "É possível que exista um pequeno êxodo", acrescenta o especialista, que calcula que no mundo haja 2 milhões de descendentes de judeus sefarditas. Zazur lembra que os judeus de origem portuguesa que se transferiram para Amsterdã participaram da eclosão do comércio holandês, trabalhando nos mercados de café, chocolate, tabaco ou escravos. E que havia judeus portugueses na origem de Nova York, quando ainda se chamava Nova Amsterdã. "Essas famílias de judeus expulsos, devido a sua capacidade, sua força e sua cultura, sempre foram um motor econômico e social da história", explica.
Na Flórida, Luciano Lopes, proprietário de uma pequena empresa que comercializa iogurtes e descendente de uma família judia originária e expulsa das proximidades do Porto, também pretende pedir a nacionalidade portuguesa. Confessa que sempre gostou do país e que o sul da Europa o atrai porque, apesar da crise onipresente e do descalabro econômico, "sempre será um bom lugar para viver".
"Para se beneficiar da lei servirão os sobrenomes, o idioma, a ascendência... tudo isso está sendo estudado agora para evitar fraudes", explica o deputado Ribeiro de Castro. Mas, além desses formalismos, trata-se de "acabar com uma vergonha histórica e dar as boas-vindas aos que nunca deveriam ter partido", acrescentou.
Quando os antepassados do ramo espanhol da família de Carlos Zazur abandonaram Zamora, em 1492, levaram a chave que abria uma sinagoga dessa cidade. Dentro de alguns meses, Zazur irá pronunciar conferências em Zamora. Não existe mais a sinagoga, nem o edifício que a abrigava. Mas ele levará consigo a chave, que passou de geração em geração, de país em país, continente em continente, como a metáfora da memória, mais forte que os muros de pedra ou de tijolo. "Não há mais porta que essa chave abra", reconhece. "Meu avô dizia que Sefarad deixou de ser um lugar na terra e passou a ser um lugar no coração."
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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