Aids: cresce comportamento de risco de jovens homossexuais
Com tratamento, sexo parece ter virado uma roleta russa entre alguns grupos de gays da nova geração
O Globo
SÃO PAULO - Hoje desempregado, X. tinha 28 anos no fim dos anos 1990 quando espasmos na perna esquerda o fizeram procurar um médico. Após uma série de exames, foi confirmado o que ele mesmo já suspeitava: estava infectado com o vírus HIV. O resultado "reagente" veio tarde, já que sempre martelaram na sua cabeça as primeiras relações sexuais desprotegidas com um antigo namorado, que morrera anos depois. O diagnóstico tardio o levou a uma série de complicações: passou de 80 para 30 quilos, sofreu três tuberculoses, uma pneumonia grave e quase ficou cego.
Foram dois anos de sucessivas internações, até que buscou refúgio numa casa de apoio a portadores de Aids. Sozinho em São Paulo, a família toda morando no Paraná, diz que nunca mais conseguiu ter uma relacionamento duradouro. Sexo, casualmente, mesmo diante da surpreendente reação das pessoas na cama.
- Muitas vezes, se eu resolver transar sem camisinha, vai assim mesmo. Eu é que evito. Acabou a preocupação com sexo seguro por causa da fantasia de que o soropositivo não sofre mais. Ninguém sabe o sofrimento que é viver com Aids - diz ele, morador de São Miguel Paulista, periferia de São Paulo.
Aos 42 anos, Y. diz também ouvir de amigos que acabou a preocupação em transar sem preservativo, principalmente entre os mais jovens.
- Essa molecada não viu a cara da Aids. Hoje, há tratamento em que as pessoas não ficam esquálidas, mas são muitos os efeitos que parecem ser ignorados por quem está procurando sexo quase desesperadamente - reforça ele.
Z. é um rapaz que pode ser incluído no grupo da "molecada" portadora do vírus que ignora solenemente os efeitos da doença. Aos 21 anos de idade, infectado aos 18 num sexo grupal, o estudante de administração de empresas diz que não se preocupa na hora de ir para a cama. Frequentador de boates e bares badalados em São Paulo, onde vive, ele diz que cada um deve cuidar de si.
- Eu não estou nem um pouco preocupado com os outros. Se quiser transar sem camisinha, eu transo. Provavelmente é alguém também contaminado, então estamos no empate - diz Z., num discurso pontuado por um rancor indisfarçável:
- Eu pergunto: alguém se preocupou comigo?
Com uma turma de amigos de 20 e poucos anos de idade, o estudante revela que, assim como ele, outros jovens deixaram a segurança de lado mesmo sabendo que não estavam contaminados com o vírus HIV. O sexo parece ter virado uma roleta russa entre alguns grupos de gays da nova geração:
- As pessoas estão procurando prazer, e, aí, tem que ter sorte. Só que muitas vezes não é o que acontece.
Flávio Freire
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