Pizza na Assembleia Legislativa
O Estado de S.Paulo
O noticiário a respeito da venda de emendas parlamentares ao Orçamento do Estado, provocado pelas denúncias feitas há mais de dois meses pelo deputado estadual Roque Barbiere (PTB), tem incomodado os parlamentares paulistas, inevitavelmente igualados na imagem negativa que a opinião pública tem da Assembleia Legislativa. Para reverter essa situação, a atitude recomendada pelo necessário rigor ético e a indispensável transparência no trato da coisa pública seria colocar tudo em pratos limpos, por meio de um inquérito parlamentar, já que, no plano externo, o Ministério Público (MP) está atuando. Mas os integrantes do Conselho de Ética, obedecendo à orientação da liderança da maioria governamental na Casa, preferiram, por 5 votos contra 2, que tudo terminasse em pizza: decretaram a interrupção das investigações e da tomada de depoimentos no âmbito do Legislativo.
Essa é a contribuição que a Assembleia Legislativa do Estado mais desenvolvido da Federação oferece para ilustrar o quadro de profunda deterioração ética e moral das instituições políticas brasileiras. É mais uma demonstração de que o desprezo pelo discernimento dos cidadãos já contamina todos os níveis de governo, todos os poderes, todos os partidos políticos. Os tucanos de São Paulo se comportam exatamente como os petistas&associados de Brasília, quando se trata de escamotear bandalheiras que beneficiam interesses pessoais ou partidários.
É tão cínica a atitude dos membros do Conselho de Ética da Assembleia que, para que não se alegue que a decisão foi, como foi de fato, a de varrer as denúncias para debaixo do tapete, estabeleceram um prazo de 15 dias para que o resultado das investigações até aqui feitas sobre o assunto seja reunido num relatório final a ser encaminhado ao Ministério Público. Ocorre que todo o material de que se dispõe para enviar ao MP é pouco mais do que as cartas enviadas ao Conselho pelo deputado Barbiere e pelo deputado licenciado e secretário do Meio Ambiente, Bruno Covas (PSDB), documentos que já são de conhecimento público e nos quais não existe nenhuma referência concreta à denunciada venda de emendas parlamentares. Para se ter uma ideia da disposição com que Conselho de Ética tratou do assunto, basta dizer que dos 17 requerimentos de convocação de depoimentos e pedidos de informação apresentados - a maior parte, é claro, por parlamentares da oposição -, apenas 3 foram aprovados. Questionado sobre a relevância dos documentos a serem encaminhados ao Ministério Público, o deputado Campos Machado (PTB), autor do requerimento que propôs o fim das investigações, saiu pela tangente: "Será encaminhado o que existe! O que tem nos autos. Se não tem nada, é outro problema".
Para não deixar o Legislativo sozinho na lambança, o Executivo também fez o que estava a seu alcance para esvaziar o assunto. Primeiro, o governador Geraldo Alckmin, no dia 12 de outubro, garantiu "transparência absoluta" no trato da questão e prometeu a divulgação da lista completa das emendas parlamentares a partir de 2007. Aí o assunto passou para o secretário-chefe da Casa Civil, Sidney Beraldo, que no dia 18 de outubro garantiu que em uma semana o governo divulgaria a relação de todas as emendas em seu site na internet. Desde então, Beraldo vem protelando a divulgação prometida. Até o momento só foram divulgados os restos a pagar de 2010 e as emendas pagas em 2011. No total, apenas 11% do valor que o governo reservou nos dois anos somados para o pagamento das emendas parlamentares.
Em plena crise, os deputados aprovaram, em nome da "transparência", a criação de um sistema de acompanhamento da tramitação das emendas e a obrigatoriedade de o governo do Estado enviar semestralmente à Assembleia um relatório sobre a execução orçamentária que detalhe a autoria, o valor e os beneficiários das emendas. Uma ferramenta que será certamente muito útil para que eles - os deputados - possam cobrar com mais eficiência o andamento das propostas de seu interesse.
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