quinta-feira, 17 de novembro de 2011

HOLANDA E A UNIÃO EUROPEIA

Holandeses preferiam que UE tivesse permanecido em formato reduzido

Isabel Ferrer - El País

HOLANDA E UNIÃO EUROPEIA
- O tratado de integração europeia, mais conhecido como Tratado de Maastricht, foi assinado nessa cidade holandesa em 1992.
- Apesar disso, a Holanda rejeitou a Constituição europeia em um referendo realizado em 2005.
- Mais da metade da população holandesa (58%) acredita que a UE deveria ser uma organização eminentemente econômica.
- Três quartos da população (78%) consideram que a voz da cidadania nas instituições comunitárias é escassa. Há seis anos 86% dos holandeses eram dessa opinião.
- 69% acreditam que a união deveria ser um clube para o norte e o oeste europeus.

Os ditados holandeses costumam propor hábeis formas de se proteger contra o mar, perigoso mas também produtivo elemento nacional por excelência. Assim que Adriaan Schout, chefe do Programa Europeu do Instituto de Relações Internacionais Clingendael, recorre a um deles para dissipar o erros de percepção sobre seu país diante da crise do euro. "Quando a maré sobe, é melhor estar em um barco grande. Ou, para dizer em termos mais atuais, esta crise econômica deve ser resolvida em grande escala. Chame-se UE ou G20", afirma.
A Holanda, fundadora do projeto comunitário, contribuinte líquida e país no qual se encontra Maastricht, a cidade do tratado de integração europeia de 1992, hoje está irritada. Também observa com temor e pessimismo a situação dos sócios devedores. "Contudo, damos a impressão de ser anti-UE, e não é verdade. Apesar da rejeição à Constituição europeia no referendo de 2005, nossa posição não mudou: apoiamos o mercado interno e somos céticos diante da cooperação política."
A comparação entre as pesquisas efetuadas em 2005 e 2011 lhe dá razão. Com alguns matizes acrescentados pela situação da Grécia. Efetuadas por Maurice de Hond, o pesquisador mais ativo do país, mostram como 56% da população pensava há seis anos que a UE deveria ser uma organização eminentemente econômica. Em 2011 58% pensavam assim. Em 2005, 37% diziam que a UE havia contribuído para o crescimento econômico nacional. Apesar da crise, hoje 51% dizem isso. Mas cuidado: então (86%) e hoje (78%), os holandeses consideram escassa a voz da cidadania no seio comunitário. Perguntado se a UE devia ter-se mantido como um clube para o norte e o leste europeus, a resposta é afirmativa: 52% acreditavam nisso cinco anos atrás; 69% o apoiam hoje.
O pragmatismo demonstrado pelos números e apontado por Schout se explica com um olhar para a situação geográfica holandesa. Vizinha da poderosa Alemanha e da hoje atribulada Bélgica (com a França sempre tão perto), "levamos nos genes que somos uma economia pequena que precisa da Europa para funcionar". "Ser pragmático é vital para nós. Qualquer divisão na UE pode causar enormes danos para nossa balança de pagamentos, baseada na exportação. E já se sabe que uma economia sã é o melhor reclame político", acrescenta, para explicar depois as vozes dissidentes que começam a ser ouvidas no Parlamento holandês.
Por enquanto a mais sonora é a de Geert Wilders, o líder antimuçulmano, que pediu uma investigação sobre uma possível volta ao florim, a moeda anterior ao euro. "É interessante, mas Wilders só parece antieuropeu. A realidade é que ele apoia um governo pró-europeu junto ao qual volta quando é necessário", salienta o especialista.
A outra chamada de atenção é ainda mais recente. Saída das fileiras liberais, o partido majoritário no poder, propõe criar uma moeda especial, chamada neuro. Destinada às economias mais saudáveis da UE, circularia em uma Europa dividida entre devedores e credores.
O terceiro aviso vem assinado por Bernard Wientjes, presidente da patronal. Pediu um ministro holandês do Comércio Exterior porque "a UE está ocupada demais com assuntos internos. Precisamos de um bom empresário que olhe por nossos interesses lá fora".
Apesar desse coro de vozes, e de os holandeses crerem que a Grécia não devolverá as ajudas recebidas, falta um autêntico debate político sobre a situação atual. Embora paradoxalmente em 2005 o Parlamento se mostrasse mais europeísta que a cidadania, e hoje seja o contrário. Do Parlamento em Haia saem nestes dias as maiores críticas à UE. "O grande erro de Maastricht foi não dar poder à comissão. Ela devia vigiar o curso das economias comunitárias e impor sanções se necessário. Agora é a Holanda que propôs a figura de um novo comissário que controle o futuro do euro e das economias dos sócios", lembra Schout. A proposta parece contar com o apoio da Alemanha e da França, os dois grandes. E também a dupla que em 2003 quebrou o pacto de estabilidade deficitária, autêntico suporte do Tratado de Maastricht. Um passo que facilitou de certo modo o descalabro atual. Se eles infringiam as normas, os demais relaxaram as suas.
Se é paradoxal que a Holanda, europeísta por necessidade e convicção, rejeitasse a Constituição europeia, mais ainda é hoje que o futuro da UE tenha passado ao segundo plano. Ocupados com a crítica, descarada e às vezes rude, das "péssimas e enganosas contas gregas e italianas", os holandeses já não falam na ampliação comunitária. Os países dos Bálcãs entrarão em algum momento mas ninguém os cita. A chamada da Turquia àsportas de Bruxelas - besta negra da extrema-direita e em boa medida causadora do não em 2005 - continua sendo ouvida com surdina. Quanto à Islândia, que também poderia aderir ao clube, nem sequer aparece no estrondo do euro.
"O mais provável é que depois dessas entradas a UE pague durante longo tempo. As pessoas estão aborrecidas, e não só na Holanda. É verdade. Também o é que ninguém quer sair. A chave está no controle, e para isso precisamos de uma comissão com autoridade legal", declara o estudioso. Uma UE mais supranacional e menos política, capaz de conter também Berlim e Paris. Na aparência, a receita perfeita. Mas deverá ser cozida no convulso forno comunitário.


Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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