Chantagem dos caminhoneiros
O Estado de S.Paulo - Editorial
Prima pela irresponsabilidade e deve ser tratado pelas autoridades com o maior rigor o movimento de uma parte dos caminhoneiros que atuam na Grande São Paulo - os autônomos, que trabalham com veículo próprio e integram o Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado de São Paulo (Sindicam) - contra as restrições à movimentação de caminhões pesados na Marginal do Tietê e em outras 25 vias da capital. Inconformados com os horários determinados pela Prefeitura para a sua atividade - não podem circular por aquelas vias das 5 às 9 horas e das 17 às 22 horas, de segunda a sexta, e das 10 às 14 horas, aos sábados -, eles decidiram comprometer o abastecimento de combustíveis da cidade.
Na segunda-feira, eles interromperam a distribuição do produto aos postos da Grande São Paulo, com a promessa de manter o fornecimento para serviços essenciais, como bombeiros e polícia. Ao fim desse dia, alguns dos postos já estavam sem gasolina, álcool e diesel para vender e estima-se que os estoques de grande parte dos demais só durem 24 horas. Como se isso não bastasse, os caminhoneiros do Sindicam tentaram imobilizar a cidade, obstruindo com seus veículos algumas das suas principais vias. Essa ação durou pouco, a Polícia Militar interveio e conseguiu convencê-los a desistir da manifestação.
Os caminhoneiros se dizem dispostos a negociar com a Prefeitura as restrições de circulação impostas a 25 vias. Mas não admitem qualquer restrição à circulação na Marginal do Tietê, por causa da sua importância na ligação com grandes centros de distribuição. O prefeito Gilberto Kassab, por seu lado, afirma que poderá "aperfeiçoar"as restrições na Marginal, mas não se sabe o que isso quer dizer, porque logo acrescentou não acreditar que haverá mudança nos horários de proibição de circulação.
O que a população da região espera de Kassab é que em hipótese alguma ceda à chantagem do Sindicam. É inaceitável que o abastecimento de combustível à maior cidade do País e seu principal centro econômico possa ser ameaçado - com as graves consequências facilmente imagináveis, se a escassez de combustível for generalizada - por um grupo de caminhoneiros, que se julga no direito de mudar, "no grito", decisões do governo municipal que correspondem aos interesses da população. O estabelecimento de horários restritos para o serviço de carga e descarga feito por caminhões é medida que vigora há muito - e com sucesso - nas grandes cidades dos países desenvolvidos, adotada como forma de disciplinar e melhorar o trânsito. Em São Paulo, onde ele é muito ruim, beirando o caos, essa providência se impõe ainda com maior razão.
Mas desde que, em meados de 2007, começaram a se tornar mais rígidas as limitações à circulação dos veículos pesados, culminando agora com a inclusão da Marginal do Tietê entre as vias afetadas, as entidades que representam os transportadores de carga nunca cessaram de a elas se opor, usando dois argumentos principais: perturbações no abastecimento e encarecimento dos produtos, porque seriam repassados a seus preços o aumento dos custos decorrentes da medida. As medidas adotadas até agora não produziram nenhuma dessas duas consequências.
No atual episódio, a maior entidade do setor, o Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas do Estado de São Paulo, adotou uma atitude mais sensata, não participando da chantagem do combustível. Isso torna em princípio mais fácil para a Prefeitura fazer os caminhoneiros autônomos recuar de sua posição irresponsável.
Lamentável é a atitude da Fiesp, que afirma em nota que "a solução para os problemas do trânsito na cidade de São Paulo não se dará por meio dessa medida (a restrição aos caminhões), mas por investimento maciço em infraestrutura." Esqueceu-se a Fiesp que investimentos, ainda que maciços, não produzem efeito imediato, sendo necessário, portanto, cuidar do curto prazo. E não cuidou que esse tipo de declaração acaba por dar respaldo à leviandade do Sindicam.
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