Ana não gosta da internet, mas seus companheiros gostam
Tatiana de Mello Dias - OESP
Governo avisou que a ministra continua
Ana de Hollanda não se interessa pela internet, mas virou Trending Topic no Twitter. Ela foi o assunto mais falado do País ao soltar, durante uma audiência pública na Câmara dos Deputados, que “a pirataria feita através da internet” vai “matar a produção cultural brasileira se não tomarmos cuidado”.
Ana de Hollanda provavelmente não sabe que a maior causa de pirataria em países emergentes como o Brasil não é a internet, mas os preços altos praticados pela indústria cujo discurso ela replica.
Ela também provavelmente não sabe o que é crowdfunding, que viabiliza projetos culturais através de doações na internet, nem plataformas como o Soundcloud, em que artistas ganham público sem depender de gravadoras. E também não deve conhecer o sucesso do Spotify lá fora, além de outros negócios milionários e acessíveis, que não operam no Brasil porque aqui vinga um modelo baseado no que a indústria quer e não no que os usuários podem pagar.
Como dizem, Ana é analógica e anacrônica. Não parece preocupada em entender a internet. Muito menos em pensar políticas culturais que conversem com o ambiente digital. Prefere investir, por exemplo, em restaurações. É seu projeto de governo – e endossado por Dilma Rousseff. A porta-voz da presidência disse que ela fica no cargo.
A reforma da lei de direitos autorais, prioridade do MinC até 2010, hoje é segundo plano. O ministério freou o processo de aprovação da lei para incluir no texto tópicos desejados pela indústria cultural (como a instituição do mecanismo de notificação e retirada de conteúdo infrator sem ordem judicial). A lei agora está no executivo – e sabe-se lá quando o texto irá para o Congresso.
Nada como um tempo após um contratempo, Ana. A ministra não está interessada na reforma, mas outros setores estão. O deputado Nazareno Fonteles (PT-PI) percebeu que, dentro do Congresso, predominava uma visão mais progressista em relação aos direitos autorais. Depois do recuo de Ana, ele pegou o texto anterior do MinC, mais flexível, e apresentou uma nova versão na Câmara. Há chance dessa lei ser aprovada antes da versão oficial do MinC? Ele me disse que não. Mas está otimista: sua ideia é reunir os dois projetos para que os parlamentares consigam aprovar uma legislação que, enfim, adeque a lei brasileira de 1998 à internet. Ele diz que a onda anti-Ecad “fortalece o projeto”.
O dia em que Ana foi o assunto mais falado do Twitter foi um marco. Só que a hashtag #AnadeBelém (em referência ao perfil oficial do MinC que twittava uma viagem dela pela capital paranaense) não derruba ninguém – muito menos aprova uma política cultural mais condizente com a internet. Ana não gosta da internet, mas seus companheiros gostam. O deputado aposta na mobilização online do “pessoal da cultura” para chegar a um texto progressista e flexível. Resta saber se a pressão da internet será tão forte quanto a da indústria. No MinC, quem manda é o modelo antigo.
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