segunda-feira, 26 de março de 2012

O MODELO ALEMÃO

Alemanha apresenta um modelo de equilíbrio
Frédéric Lemaître - Le Monde
Aposentadorias, contas públicas, balança comercial, política industrial, evolução dos salários... sobre vários assuntos, o presidente Nicolas Sarkozy fez da Alemanha um modelo a ser seguido. Paradoxalmente, um domínio que lhe diz respeito diretamente – a política – foge da comparação. Isso é ainda mais surpreendente pelo fato de que um detalhe teve de ser levado em consideração por Nicolas Sarkozy: embora esteja no poder desde 2005, de uns meses para cá a chanceler Angela Merkel voltou a ser a personalidade política preferida dos alemães. Se fossem organizadas eleições no próximo fim de semana, seu partido democrata-cristão, a CDU, obteria cerca de 37% dos votos, quase dez pontos a mais que o Partido Social-Democrata (SPD).
Claro, os dois países têm tradições políticas muito diferentes e o federalismo alemão não tem só vantagens, longe disso. No entanto, a atualidade política alemã oferece material para reflexão a dirigentes políticos franceses que se preocupam com o abismo que os separa dos cidadãos.
Para começar, há a moral pública. O presidente da República, Christian Wulff, teve de renunciar, no dia 17 de fevereiro, após revelações sobre suas ligações privilegiadas com empresários quando ele presidia o Estado-região da Baixa Saxônia. Embora a imprensa tenha revelado diversos contatos, a Justiça se interessou sobretudo por um caso que, na França, pareceria trivial. Três noites de hotel (258 euros por noite), passadas em 2007 pelo ministro-presidente da Baixa Saxônia e sua esposa, foram custeadas por um produtor de cinema, que Wulff diz ter reembolsado em dinheiro. A investigação dirá se houve corrupção ou favoritismo, mas, sem esperar, Wulff teve de renunciar a seu cargo, ainda que apoiado por Merkel.
Depois, há a relação com o poder. No dia 5 de março, o jornal “Bild” publicou uma foto tirada por um leitor que mostrava Angela Merkel fazendo compras de supermercado em Berlim no dia 2 de março no final da tarde, algumas horas depois de voltar de uma cúpula europeia.
Evidentemente houve um pouco de encenação na simplicidade demonstrada pela chanceler. Mas somente um pouco. A maioria das fotos tiradas em circunstâncias semelhantes – não é raro vê-la fazendo compras em Berlim – a mostra séria e distante. Apesar de ter uma segurança discreta, são raros os que ousam abordá-la. Mesmo que essa simplicidade fosse só marketing, ninguém duvida que a situação seria diferente.
Acima de tudo, há o próprio exercício do poder. No dia 1º de março, o programa “Complément d’enquête”, transmitido pela France 2, comparou a verba colocada à disposição da chancelaria e do Palácio do Eliseu. 500 funcionários, 27 carros e um orçamento de 44 milhões de euros em Berlim. 900 funcionários, 105 carros e 113 milhões de euros em Paris.
Para além dos montantes alocados e da personalidade dos dirigentes, a maneira como Merkel exerce o poder é o oposto da de Sarkozy. Na edição de 23 de janeiro do “Der Spiegel”, Alain Minc, o conselheiro extra-oficial de Sarkozy, conta que no início o presidente, ao falar de Merkel, dizia “ela não quer”. Agora, ele diz “ela não pode”. Seu poder não é efetivamente o de presidente da República. Aos olhos do chefe do Executivo, é um ponto fraco. Na verdade, é provavelmente um ponto forte.
Se é que existe um modelo alemão, ele está nessa distribuição de poderes, bem mais equilibrada que na França, tanto entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, quanto entre os dirigentes políticos e os parceiros sociais. Embora o presidente da Confederação sindical DGB, Michael Sommer, seja muito próximo da oposição social-democrata, isso não impede que a chanceler o receba pessoalmente, além de dar uma coletiva de imprensa durante a qual os dois dirigentes se expressam em pé de igualdade.
Além disso, antes de cada cúpula europeia, a chanceler passa metade de um dia no Bundestag [Parlamento da Alemanha], explicando sua posição e escutando a dos partidos políticos. Quando há alguma votação, ela sempre dá garantias suficientes para a oposição, de forma que esta acabe aprovando sua política europeia. O fato de que uma decisão tão importante quanto a criação do Fundo Europeu de estabilidade financeira seja aprovada pelo Parlamento em uma sessão noturna, como aconteceu na França, onde menos da metade dos deputados se pronunciaram sobre o texto em setembro de 2011, provocaria um escândalo na Alemanha, onde nem existe sessão noturna.
Essa busca por um consenso não impede que a chanceler tome rapidamente decisões importantes. Um dia após a catástrofe de Fukushima (Japão), em março de 2011, foi ela, e só ela, que decidiu abandonar o uso de energia nuclear. Mas essa mudança só foi possível porque a chanceler sabia que ela teria o apoio da oposição, majoritária no Bundesrat, a Câmara Alta do Parlamento. Ao contrário do Senado, que nunca teve a última palavra diante da Assembleia Nacional, o consentimento do Bundesrat é obrigatório em um certo número de assuntos a respeito dos Estados-regiões, sobretudo a política fiscal.
Na democracia, o consenso não é uma virtude cardeal. Mas, em matéria de moral pública, de transparência e de respeito da oposição, a Alemanha parece ter atualmente uma vantagem que provavelmente está relacionada com seus desempenhos econômicos.
Tradutor: Lana Lim

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