quinta-feira, 26 de abril de 2012

A TRISTE DECADÊNCIA DE PORTUGAL

Com a crise Portugal parece retroceder economicamente e socialmente mais de 40 anos
Anxo Lugilde - La Vanguardia
Depois da década perdida, chega a década do retrocesso, da volta ao passado. O século 21 está sendo muito negativo para Portugal, que em sua primeira década ficou estagnado e desde 2010 caminha para trás, cada vez mais depressa. O regresso da migração em massa ao estrangeiro, a volta da pobreza mais ou menos dissimulada, o ressurgimento do desespero diante do futuro e a nova tutela do Fundo Monetário Internacional levaram os portugueses a reencontrar fantasmas esquecidos de 30 ou 40 anos atrás.
Pela primeira vez Portugal comemorou na última quarta-feira (25) a Revolução dos Cravos sob o signo da divisão entre o poder político e os militares que em 1974 terminaram com 48 anos de ditadura. A Associação 25 de Abril denunciou que "as medidas e os sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassam os limites do suportável" e anunciou sua negativa a participar das comemorações oficiais, das quais também se ausentaria o ex-primeiro-ministro socialista Mário Soares. Esse gesto representa um corte, uma ruptura no consenso básico de Portugal posterior à Revolução dos Cravos, que depois de um convulso período socializante desembocou na atual democracia.
Não se trata de um regresso ao tempo da ditadura, porque apesar de suas deficiências a democracia sobrevive, há sinais dessa viagem no tempo. A volta ao passado se tornava evidente neste fim de semana nas bancas de revistas. "Visão", a revista semanal de maior tiragem, presenteava charges políticas de 1974 sob a legenda de "Uma coleção de 40 cromos para a troica", o triunvirato do Banco Central Europeu, Fundo Monetário Internacional e União Europeia que há um ano tutela Portugal. No sábado (21), a concorrente de "Visão" ia além. Toda a revista estava confeccionada como se tivesse sido feita nos anos 1970, com a tipografia antiquada da época.
No "Jornal de Negócios", o jornalista Fernando Sobral escrevia: "Como nas fotografias dos anos 60. Fomenta-se a imigração. Voltam as marmitas. Esconde-se a pobreza. Regressa a caridade. Incita-se a voltar à agricultura. Hoje vivemos em cores, mas tudo parece novamente em preto e branco". Uma dessas histórias em sépia que irrompem na atualidade é a da Obra Católica Portuguesa das Migrações. Os padres das capelanias portuguesas da Suíça, França, Luxemburgo, Reino Unido, Holanda e Alemanha se reuniram na semana passada em Lisboa para analisar os problemas imprevistos gerados pela nova onda de migração ao estrangeiro, à qual no ano passado, segundo estimativas do governo, somaram-se 150 mil pessoas.
Em Zurique houve uma família de recém-chegados com dois filhos que viveu 15 dias em um carro. "As missões católicas estão saturadas pelos pedidos de ajuda", resumiu o padre Aluísio Araújo. O motor do novo êxodo é o incessante crescimento do desemprego.
No desemprego não há volta ao passado, porque a atual taxa de 14% supera todos os registros históricos e, segundo todas as projeções, continuará subindo, fruto da duríssima política de austeridade imposta em troca do resgate internacional de 78 bilhões de euros, que mergulhou Portugal novamente na recessão. "Chegou o momento de dizer não, de dizer basta", afirmou o coronel Sousa e Castro, em nome da Associação 25 de Abril.
Os militares dos cravos não assistiriam ao ato institucional do Parlamento, mas participariam da manifestação. "O 25 de Abril celebra a liberdade, e é isso que estamos precisamente tentando resgatar, recuperar nossa completa liberdade diante do exterior", afirmou o primeiro-ministro português, o conservador Pedro Passos Coelho. O governo enfrenta meses decisivos para evitar pedir uma segunda ajuda externa, como a Grécia. O objetivo de Passos é que Portugal se financie por si mesmo a partir de setembro de 2013.
Há sinais contraditórios, mas continua sendo uma meta muito difícil de alcançar, embora talvez não seja uma missão tão impossível quanto parecia há alguns meses. "Nosso verdadeiro estatuto hoje é o de um protetorado", denunciam os militares do 25 de Abril. E realmente o futuro imediato de Portugal depende mais do que acontecerá na Espanha, França e Alemanha do que em Lisboa.

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