Atenas mostra compromisso com austeridade
Georgios Christidis e David Böcking - Der Spiegel
Quando Antonis Samaras viajou a Berlim na sexta-feira (24), seu papel foi claro: o primeiro-ministro conservador da Grécia chegou como um suplicante que é obrigado a pedir mais assistência financeira na Alemanha para seu país duramente atingido pela crise.
Ainda assim, pedidos de mais tempo para implementar medidas de austeridade na Grécia já encontraram resistência em grande parte do governo alemão. “A Europa e o euro não podem fracassar porque as pessoas se recusam a implementar reformas”, disse o ministro da Economia Philipp Rösler à Spiegel Online no último domingo (19). E a acusação que foi ouvida antes da reunião importante entre Samaras e a chanceler alemã Angela Merkel é de que os gregos são exatamente o tipo de pessoas que recusam as reformas.
Entretanto, a realidade é bem diferente. De acordo com medições do PIB, os gregos estão claramente fazendo cortes bem mais profundos do que todos os outros países atingidos pela crise na zona do euro. Isso foi confirmado recentemente por um estudo do banco central da Irlanda, que por si só já tem uma reputação como um cortador de gastos modelo. O relatório revelou que, desde 2010, a Grécia respondeu à pressão da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional cortando gastos e aumentando impostos no equivalente a 20% do PIB – que representa o programa mais brutal de contenção de gastos da história da UE. Esta conquista é particularmente notável dado o fato de que aconteceu em meio a uma recessão severa.
Dadas essas circunstâncias, por que continua havendo dúvidas a respeito da seriedade dos esforços gregos? Por um lado, isso resulta do fato de que, apesar de todos os cortes, o fardo da dívida grega continuará a crescer se a economia não crescer também. Por outro lado, relatórios da mídia sobre aposentados fantasma ou caos burocrático continuam criando a impressão de que o desperdício contínuo em outras áreas negará todos os esforços de contenção de gastos bem sucedidos.
Acabando com uma tradição de mentiras
O primeiro-ministro Samaras agora deixou claro, mesmo que apenas simbolicamente, que também quer quebrar com a tradição infeliz de clientelismo político da Grécia. Ele fez isso cancelando uma reunião marcada para daqui a duas semanas depois de sua viagem a Berlim: a abertura da feira de comércio internacional em Thessaloniki.
A feira de comércio está mais repleta de simbolismo do que praticamente qualquer outra ocasião política na Grécia. Até agora, o governo fez uma peregrinação anual para o norte, de Atenas a Thessaloniki para a abertura do evento. Os pontos altos do ritual sempre foram o discurso do primeiro-ministro diante dos altos líderes empresariais do país e uma coletiva de imprensa no dia seguinte que durava horas. Sempre foi um evento relacionado ao início da temporada política da Grécia – e um que também dava à grande equipe do primeiro-ministro a chance de se divertir na famosa vida noturna de Thessaloniki.
Mas isso agora faz parte do passado. Samaras cancelou tanto seu discurso quanto a coletiva de imprensa, e se limitará a fazer apenas uma visita breve.
Oficialmente, pelo menos, Samaras está fazendo tudo isso porque ele quer enfatizar os planos espartanos de austeridade de seu governo, que não vislumbra nem mesmo um único centavo para a diversão. Mas os motivos reais por trás do cancelamento de Samaras são diferentes. Desde o fim da ditadura miliar tem 1974, a feira de comércio vinha sendo o local onde os primeiros-ministros tradicionalmente faziam promessas caras para seus apoiadores enquanto atraiam a atenção para si anunciando projetos ambiciosos.
Por exemplo, foi em Thessaloniki em 1984 que o primeiro-ministro socialista Andreas Papandreou profetizou “dias ainda melhores” para os gregos, embora eles estivessem sendo financiados pela dívida pública. Em 1997, o primeiro-ministro Kostas Simitis ficou sabendo que a Grécia receberia os Jogos Olímpicos de 2004 apenas cinco minutos antes de fazer seu discurso em Thessaloniki. O que desencadeou inúmeras celebrações acabou causando uma consternação ainda maior quando os cidadãos gregos receberam uma conta de 10 bilhões de euros pelo espetáculo.
Em 2003, Simitis fez uma última tentativa de se agarrar ao poder em Thessaloniki: ele prometeu publicamente um programa de gastos do governo no valor de 1,2 bilhão de euros. Um ano depois, o primeiro-ministro recém-eleito da Grécia, Kostas Karamanlis, disse a seus conterrâneos que a Grécia só precisava de um “leve ajuste econômico” para colocar sua dívida sob controle – embora fosse apenas o prelúdio de outra fase de excessivos empréstimos públicos no caminho da Grécia rumo à falência. Tudo isso culminou em 2009, apenas seis meses antes de a Grécia bater no iceberg, quando o primeiro-ministro Georgios Papandreou, falando em Thessaloniki, fez a declaração hoje notória: “há dinheiro suficiente aqui”.
Gestos simbólicos
Então Antonis Samaras tem bons motivos para cancelar sua aparição e para reduzir ao máximo as viagens de membros de seu governo para o norte. E este não foi o único gesto com o qual ele demonstrou sua disposição de se submeter às medidas de austeridade. Durante a primeira reunião de seu gabinete, Samaras anunciou uma redução de 30% nos salários para seus ministros. Ele também decretou que o uso de carros do governo deveria ser reduzido ao máximo e também renunciou ao sedã Mercedes que normalmente fica disponível ao primeiro-ministro. Foi até dito que Samaras checa pessoalmente as despesas de viagem dos ministros de seu gabinete.
É verdade, com gestos simbólicos como este, Samaras certamente não eliminou o caos administrativo da Grécia ou quebrou a sensação de ter direitos em relação ao governo que quase todo grupo de interesse do país tem, desde motoristas de táxi até donos de barcos. Ele também precisa provar que não é mais um vira-casaca nas questões que costumava ser durante seu tempo na oposição política. Entretanto, o primeiro-ministro deixou claro que reconheceu o problema. E isso já é muito mais do que se pode dizer sobre a maioria de seus antecessores.
Além disso, medidas concretas foram acordadas sob o governo de Samaras – primeiro e, antes de tudo, mais um pacote de austeridade no valor de 11,5 bilhões de euros que o primeiro-ministro incentivou apesar da resistência da oposição.
“A Grécia está sangrando”, disse o tablóide alemão Bild numa manchete antes da visita de Samaras à Alemanha. Durante os últimos três anos, a qualidade de vida caiu em 30% e os aposentados perderam um quinto de seus benefícios mensais.
Não se pode dizer que a Grécia de Samaras não vem economizando o bastante. Mas será que os esforços também estão sendo bem sucedidos? Será que Samaras conseguirá modernizar o estado Grego e, especialmente, a cultura política doente do país? Ainda é muito cedo para responder essas perguntas. Afinal, o homem só está no governo há dois meses.
Tradutor: Eloise De Vylder
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