quinta-feira, 23 de agosto de 2012

ESTÃO CAÇANDO OS GÓTICOS NO UZBEQUISTÃO

Góticos reclamam de perseguição no Uzbequistão
Tribo presente nas ruas da capital, Tashkent, desde a década de 90, diz que situação se agravou após profanação de túmulo em cemitério
BBC-Brasil
TASHKENT, UZBEQUISTÃO - Um grupo de jovens que chama atenção com seus rostos pálidos, maquiagem pesada, cabelos tingidos de negro, cruzes e caveiras - os góticos - afirma estar sendo vítima de perseguição no Uzbequistão, e alguns dizem que estão sendo forçados a deixar o país.
Desde a profanação de um túmulo no cemitério da cidade de Tashkent, a situação teria se agravado.
De forma menos direta, a imprensa oficial do Uzbequistão também vem apertando o cerco, classificando a cultura ocidental de "imoral". Estilos musicais como rap, rock e heavy metal foram classificados de "música estranha" e alguns chegaram a ser proibidos.
Dois góticos foram presos, embora o grupo negue veementemente qualquer envolvimento no caso.
As autoridades uzbeques foram contactadas pela BBC, mas não responderam às perguntas sob a alegação de que a empresa não está autorizada a trabalhar no país.
A tribo está presente nas ruas da capital uzbeque desde a década de 90, e chama atenção não só pelo visual, mas pelos adereços de influência cristã, como cruzes e pingentes - pouco comuns no país asiático de maioria muçulmana.
Respeito aos túmulos
Os góticos também admitem ter uma predileção pelo cemitério cristão de Tashkent, fundado em 1872. Para eles, a mescla de tranquilidade, clima romântico e, de certa forma, morbidez que encontram em Botkin é irresistível.
"Gosto de passear com meus amigos pelos caminhos do cemitério cheios de folhas e sombras, admirando as esculturas antigas e discutindo arte gótica", afirma Leticia, uma das poucas góticas que continua na capital. "Nós temos respeito pelos túmulos, até romantizamos a morte", diz ela.
Mesmo assim - ou talvez por isso -, a polícia logo deteve dois jovens góticos pouco depois de descobrir a profanação de sepulturas no local.
Os góticos acreditam ser cerca de 200 em todo o país, que tem uma população de 30 milhões. Eles se conhecem nas páginas virtuais do Facebook, onde a maioria adota o sobrenome do maior ídolo gótico atual no Uzbequistão, o cantor americano Marylin Manson.
A BBC conversou com Leticia, seu amigo Gotya e outros góticos em um bar nos arredores da capital, o atual ponto de encontro dos góticos. No entanto, temendo problemas com as autoridades, a gerência pediu que o nome do local não aparecesse na reportagem.
Eventos góticos que antes reuniam até 300 pessoas agora dificilmente ultrapassam 20.
Entrada proibida
Os góticos também costumavam se reunir na única igreja católica de Tashkent, mas agora estão proibidos de entrar lá. Eles contam que sentem uma pressão crescente, não só das autoridades, mas da sociedade, que estaria sendo influenciada por uma "campanha" também na imprensa.
A banda local predileta dos góticos, Festa Martyria, teve todos os shows cancelados desde o ano passado. Agora, os jovens temem que o governo use o episódio da profanação de túmulos como pretexto para proibir oficialmente o movimento gótico no país.
A pressão é ainda maior em jovens de famílias muçulmanas que adotam o visual repleto de cruzes e caveiras. Dilshod, de família islâmica e ex-integrante da banda de heavy metal The Rebels, por exemplo, afirma que a pressão sobre a cultura alternativa acabou levando ao fim do grupo. Alguns dos amigos dele chegaram a sair do país. Ele também planeja estudar no exterior.
'Imoralidade'
A imprensa uzbeque já afirmou que a cultura ocidental incentiva a "imoralidade" e estaria "causando danos às tradições e valores nacionais".
A televisão oficial russa, popular no Uzbequistão, chegou a levar ao ar um programa em que associava góticos e canibalismo. O clima nem sempre foi tão repressivo. Os mais velhos dizem que na época da União Soviética, várias "tribos" pipocaram no país.
A mãe do gótico Gotya costumava lhe contar como Tashkent era cosmopolitana, um caldeirão de culturas em que russo, armênios e judeus coexistiam pacificamente. Com o nacionalismo crescente após a queda da União Soviética, muitos deixaram a cidade. "No passado, havia vários góticos, punks, satanistas e roqueiros por aqui", disse Gotya.
Por isso, enquanto as "tribos" alternativas encontram dificuldades no Uzbequistão, Gotya, Leticia e outros jovens pensam em buscar abrigo em países vizinhos como a Rússia ou a Polônia.

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